Conseguir uma dobradinha numa corrida de F1 sempre é um momento especial para uma equipe, ainda mais quando você o consegue por seus méritos e quando ninguém esperava, olhando o início do ano. Porém, a ascendente McLaren conseguiu criar um problema no seu melhor dia de 2024, até o momento. Com um ritmo fortíssimo, o time comandado por Zak Brown dominou o escaldante Grande Prêmio da Hungria e se conseguiu a primeira fila no sábado, repetiu as mesmas posições no domingo, conquistando a primeira dobradinha em quase três anos, sendo que em Monza/21, foi numa situação bem pontual. No entanto, a falta de coordenação estratégica quase estragou por completo um final de semana perfeito para a McLaren, com Lando Norris sendo beneficiado pelos táticos da McLaren frente ao seu companheiro de equipe, mas o inglês teve que ceder a liderança totalmente à contragosto para Oscar Piastri, que venceu pela primeira vez na F1 e se tornou o sétimo piloto diferente a vencer em 2024.
Se a corrida ocorresse vinte anos atrás, não teria metade da animação que tivemos hoje e o motivo é muito simples. Pelos idos de 2004, não tínhamos acesso aos rádios entre as equipes e os pilotos durante a corrida. Sendo assim, não teríamos escutado as discursões infantis entre Max Verstappen e seus estrategistas, além das tensas conversas entre Lando Norris e seu engenheiro nas últimas voltas. Seguindo a tradição magiar, não tivemos uma corrida lotada de ultrapassagens e a luta pela liderança foi decidida na largada. Para se tornar um piloto completo, Lando Norris precisa aprender que ele não pode deixar nenhuma brecha para os adversários e largar bem é conseguir um bom posicionamento que pode ser decisivo para o resto da corrida. Largando da pole, novamente Norris foi superado pelo companheiro de primeira fila, que hoje também era ser colega de box, Oscar Piastri. Lando ainda tentou espremer o australiano, abrindo a porta lindamente para Max Verstappen ficar por fora na primeira curva. Na freada para a primeira curva, havia um 'three wide', com Piastri por dentro, tendo a vantagem. Isso fez com que Norris alargasse a primeira curva e não sobrasse muito espaço para Verstappen, que acelerou na área de escape e tomou a segunda posição de Norris, que ainda foi ultrapassado por Hamilton, mas o piloto da Mercedes se animou demais num ataque em cima de Verstappen e acabou tomando o troco do compatriota logo em seguida. Piastri emergia na frente, com Max tirando vantagem e Lando, reclamando da manobra de Max, num longínquo terceiro lugar. Foi o início das até mesmo cômicas intervenções radiofônicas entre Max e seu staff nos boxes. Era bem claro que Verstappen precisava devolver a posição para Norris, mas Max teimou com a equipe, só o fazendo quando estava mais de 3s na frente de Lando, ou seja, Piastri tinha bons 4s de vantagem na ponta.
Como esperado, fez um calor quixadaense em Budapeste e o desgaste de pneus seria um fator para toda a corrida. Largando fora de posição (ou não, no caso de Checo), George Russell e Sérgio Pérez largaram com pneus duros, enquanto a grande maioria escolheu a borracha média. Piastri liderava com boa vantagem, enquanto Norris abria do trio Verstappen, Hamilton e Leclerc, que largara muito bem, enquanto Sainz teve que ultrapassar Alonso e ficar num isolado sexto lugar. Quando começaram as paradas para os líderes, a McLaren se viu numa situação onde o principal era proteger a posição de Lando Norris e continuar a dobradinha, fazendo o inglês parar antes de Piastri, conseguindo nesse primeiro momento o seu objetivo, que era o 1-2 da McLaren. O problema é que com pneus novos por algumas voltas, Norris tirou boa parte da vantagem de Piastri, que ainda cometeu um ligeiro erro e viu Norris ficar no limiar de usar o DRS. Enquanto isso, Verstappen trocava patadas com seu engenheiro, Giampiero Lambiase, pelo rádio, principalmente quando Max esticou seu primeiro stint e como consequência, perdeu a posição para Hamilton. Max foi para cima, atacou o inglês como pôde, permitindo a aproximação de Leclerc para a briga pelo último lugar no pódio. A cena se repetiu na segunda rodada de paradas, com Hamilton e Leclerc parando juntos, enquanto Max ficou mais tempo na pista e quando colocou seu jogo de pneus médios novinho em folha, estava 8s atrás de...Leclerc! Max Verstappen parecia que rasgaria as vestes de revolta, soltando cobras e lagartos para os táticos que lhe garantiram tantas vitórias. Max remou, ultrapassou Leclerc, mas talvez frustrado pela tática escolhida, tentou numa manobra 'banzai' em cima de Hamilton e os dois se tocaram. Verstappen alçou voo, dando até a sensação que abandonaria, mas provando que os carros atuais além de grandes são fortes como tanques, Max continuou na corrida, porém, separando a dupla da Ferrari, num obscuro quinto lugar.
Com tudo isso, a vida da McLaren estava ganha, certo? De forma inacreditável, a McLaren novamente chamou Norris para o segundo pit na frente do líder Piastri. Em outros tempos, o piloto que lidera sempre tem a preferência de fazer o pit-stop antes, mas no caso da McLaren isso resultou num erro de cálculo e um imenso constrangimento. Piastri parou duas voltas depois de Norris e sem maiores surpresas, Lando emergiu na frente de Oscar e foi abrindo vantagem. Percebendo o erro, a McLaren avisou à Norris que deveria ceder sua posição ao companheiro de equipe, que cobrava a manobra. Obviamente Lando questionou a situação, chegando a abrir 6s para Oscar. O engenheiro de Norris usou até mesmo a frase 'preciso protege-lo' (do que?) e que 'para ser campeão do mundo, precisamos da equipe e de Oscar' para tentar persuadir Norris a cumprir uma embaraçosa troca de posições já nas voltas finais para garantir a primeira vitória de Oscar Piastri na F1. Com certeza, merecida, mas Piastri não precisava passar por esse constrangimento. A falta de coordenação da McLaren faz com que a equipe, que faz um trabalho brilhante de engenharia na concepção do carro e seu desenvolvimento, tropece em situações de estratégia. Apesar de cumprimentar Piastri, Lando Norris não escondeu seu descontentamento por perder mais uma vitória e lembrando que ainda faltando praticamente metade do campeonato, esses sete pontos podem fazer falta no final do ano.
Se não brigou pela vitória, o terceiro lugar de Lewis Hamilton confirmou o crescimento da Mercedes, mesmo que a Red Bull estivesse numa situação melhor no final de semana húngaro. Verstappen chegou em quinto, mas mostrou vulnerabilidades psicológicas, em discussões bestas via rádio e uma tentativa de ultrapassagem em cima de Hamilton que mais pareceu em birra do que algo estratégico de um multi-campeão de F1. E se ontem, após mais um erro de Sergio Pérez, Christian Horner falou que a Red Bull corria com uma perna só, hoje esteve correndo com meia perna. Até porque, largando do fundo do pelotão, Pérez fez uma corrida decente, a primeira em muitas semanas, e chegou apenas duas posições atrás de Verstappen, em sétimo. O momento é da McLaren, com Mercedes e até mesmo Ferrari se metendo entre os 'laranjas' e Max Verstappen e a turbulenta Red Bull. O campeonato ainda está muito nas mãos de Verstappen, mas o neerlandês precisa acordar e trazer consigo a equipe, mesmo com todos os problemas e a clara divisão interna. Leclerc chegou a estar na briga pelo pódio, mas só garantiu o quarto lugar por causa da presepada de Verstappen, com Sainz garantindo um obscuro sexto lugar. Russell seguiu Pérez e foi oitavo, garantindo que as quatro equipes top da F1/2024 ficassem com as oito primeiras posições da corrida de hoje.
O melhor do resto foi Tsunoda, que foi o único a fazer uma parada nos boxes e garantiu a 'pole' do pelotão intermediário, deixando a Red Bull com mais pulgas atrás da orelha, na hora de escolher alguém para substituir Pérez, seja na volta das férias da F1 ou em 2025. Ricciardo simplesmente não convence ninguém. E Tsunoda é um piloto Honda, que debandará para a Aston Martin em 2026. Quem fechou a zona de pontos foi Lance Stroll, que no final da corrida superou Alonso, mostrando que a Aston Martin luta, no máximo, para ser a quinta força da F1 atual. E nem sempre ganha, para tristeza de Alonso e até mesmo de Adrian Newey, alvo principal de Lawrence Stroll. Numa corrida onde apenas Gasly abandonou, houve equilíbrio no pelotão de trás, mas a Alpine, depois de uma fase boa, pontuando com regularidade, voltou aos seus piores dias num circuito de alto downforce.
Numa corrida onde muito se falou via rádio, a McLaren quase estraga seu dia, mas ainda podemos ter mais consequências de toda a confusão que o próprio time laranja causou. Lando deve estar cobrando a equipe pela troca de posição, enquanto Piastri também tem todo o direito de reclamar da estratégia da equipe. Enquanto isso, Max Verstappen viu que todo o domínio que a Red Bull tinha no começo do campeonato foi embora e de agora em diante, após sua terceira corrida consecutiva sem vitória, o neerlandês tentará administrar um campeonato que parecia ser seu ainda nas primeiras voltas da temporada 2024, mas que faltando pouco menos da metade do certame terminar, muita água ainda irá rolar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário