domingo, 12 de dezembro de 2021

Wereldkampioen, Max!

 


Senhoras e senhores, que campeonato, que corrida, que final! O que vimos nessa manhã de domingo sintetizou toda essa inesquecível temporada 2021 de Fórmula 1. Vimos dois pilotos formidáveis e famintos em derrotar o rival, tendo atrás de si duas equipes igualmente formidáveis e famintas. Em ABu Dhabi vimos grandes exibições individuais de Max Verstappen e Lewis Hamilton, reviravoltas, polêmicas, confusões e disputas. Tudo isso condensado em 58 voltas no insosso circuito de Marina Bay, que paga muito bem para receber o encerramento da F1 e dessa vez os árabes não tem do que reclamar do investimento, pois a final de 2021 entrou para a história do esporte e essa final será para sempre lembrada como uma das mais tensas e emocionantes que a F1 já viu.


Nas últimas décadas houveram disputas apertadas na última corrida na F1, ou seja, não deixa de ser algo inédito a situação desse final de semana, porém, desde 1997 não havia tanta beligerância entre pilotos e equipes como aconteceu nessa temporada. Max Verstappen e Lewis Hamilton elevaram cada um seu nível para derrotar seu adversário que muitas vezes cruzaram a linha tênue entre o duro e o desleal. Semana passada em Jedá Max foi punido inúmeras vezes e não se pode dizer que o neerlandês não foi um santinho ou que a FIA estava simplesmente pegando no pé dele. Verstappen estava na vibe 'full attack' há muito tempo, com várias manobras agressivas, principalmente quando um toque lhe seria mais favorável. Com exceção de Silverstone, Lewis Hamilton foi mais pragmático em todas as disputas com Max, lhe dando importante vantagem de pontos. Por fim, Chrsitian Horner e Toto Wolff assumiram um papel longe de apaziguadores. Centralizadores, personalistas e competitivos, Wolff e Horner usaram todo o seu arsenal de verborragia para colocar fogo no campeonato com cutucadas e declarações fortes, acusando o rival pela mínima questão. No meio disso tudo estava a FIA, personificada em Michael Masi. O australiano entrou no lugar do falecido Charlie Whitting meio de tampão, já que o veterano diretor de corridas morreu nas vésperas do Grande Prêmio da Austrália. Masi parece ter um tesão em aparecer e muitas vezes impôs investigações e punições que desagradaram gregos mercedianos e troianos energéticos. Nesse final de ano, quando se pediu uma mínima consistência, Masi ficou com um mico na mão, pois ele poderia definir um campeonato histórico. Enquanto isso, Masi tinha em sua orelha esquerda berrando Horner e na esquerda tinha Wolff. Sinceramente, não queria estar na pele de Michael Masi nas últimas semanas.

Toda essa pressão psicológica imposta por Horner (em conjunto com Helmut Marko) e Wolff colocou ainda mais pilha em Verstappen e Hamilton, que tiveram um primeiro round impressionante no sábado e tudo seria decidido nesse domingo. Lewis tinha a seu favor a experiência e talvez isso explique sua melhor largada mesmo tendo pneus médios. O inglês da Mercedes meteu um décimo em cima de Max apenas no tempo de reação do apagar das luzes vermelhas. Uma eternidade falando de uma largada de F1. Hamilton assumiu a ponta, mas com os pneus que tinha em seu carro, era preponderante para Max estar na frente e o neerlandês não esperou meia volta para atacar. E iniciar a primeira polêmica do dia.


Como dito anteriormente, Verstappen tinha a vantagem de, num hipotético acidente com Hamilton, ele sairia campeão e por isso o piloto da Red Bull se jogou por dentro na reta oposta, deixando para Lewis a decisão de bater ou não. Hamilton, pragmático, preferiu evitar o toque, mas sem espaço na chicane, foi por fora e ganhou uma clara vantagem. E tome barulho no ouvido de Masi. "Ele ganhou vantagem por fora da pista", "Ele me forçou para fora da pista". Enquanto isso, Wolff e Horner tagarelavam. Na torre de controle, Masi deveria estar com o c... na mão. Ser coerente e botar a colher na disputa por um título histórico ou jogar tudo o que havia feito para o alto e 'deixarem os meninos correrem'? Masi escolheu a segunda opção e Hamilton começava a luta pelo título em vantagem e para piorar as coisas para Max, com um carro nitidamente mais rápido. Hamilton matou Verstappen em ritmo de corrida, a realidade foi essa. Porém, os deuses da velocidade agiram numa famosa frase do deus Juan Manuel Fangio: Carreras son carreras.


Quando Lewis e Max dispararam na frente, parecia que os demais dezessete pilotos (Mazepin não largou por ter contraído Covid) se tornariam meros coadjuvantes. Porém, Sergio Pérez entrou em cena. Na primeira metade do ano o mexicano foi cobrado publicamente pela Red Bull por não apoiar Max Verstappen em sua luta muitas vezes solitária contra a Mercedes. Checo acordou para a vida, começou a conseguir bons resultados e em Abu Dhabi colocou uma pimenta na disputa quando ficou na pista com pneus desgastados, enquanto Lewis Hamilton vinha impávido com pneus novinhos em folha. O que parecia uma ultrapassagem protocolar se tornou uma disputa encardida, com Pérez incorporando Verstappen para se tornar o funcionário do mês da Red Bull. Apenas na volta 20 o mexicano garantiu 5s para Max Verstappen, que chegou a ficar menos de 2s atrás de Hamilton, na menor distância entre eles. "Checo é uma lenda", falou Max, vendo tudo aquilo à sua frente com um sorriso no canto da boca. "Ele é um animal", falou o engenheiro da Red Bull pronto para presentear Pérez com qualquer coisa valioso que ele pudesse ter em mãos. A forma como Pérez ajudou a Red Bull transformou seu abandono no final da corrida num dos pecados da prova. Checo merecia o terceiro lugar! As outras despedidas de 2021 também eram inglórias. Russell abandonou com a Williams, o mesmo acontecendo com a dupla da Alfa Romeo, com destaque para Kimi Raikkonen, se aposentando da F1 após vinte anos de sua estreia e deixando muitos fãs com saudades dos seus momentos 'Seu Lunga nórdico'.


Outra despedida que seria melancólica seria a da Honda, que estava prestes a perder um título que parecia em suas mãos no México. O VSC para tirar o carro de Antonio Giovinazzi fez com que a Red Bull trocasse os pneus de Max, mas por um motivo que ninguém entendeu muito bem e por tudo o que aconteceu depois se mostraria irrelevante, a Red Bull colocou os mesmos pneus duros que já estavam no carro do neerlandês. Hamilton perguntou se poderia parar e ter a certeza que teria pneus nas mesmas condições do rival. A Mercedes preferiu ficar quieta. Essa imobilidade dos alemães se mostraria decisiva mais tarde. Mesmo com pneus mais desgastados, Hamilton mantinha um ritmo forte o suficiente para manter Max sob controle para as voltas finais. Provavelmente nos boxes da Mercedes já se procuravam a camiseta 'Lewis Hamilton 8-Time World Champion', enquanto a torcida holandesa se mostrava impotente na torcida, o mesmo acontecendo com Max dentro da pista. Somente algo fora do controle de Max, Lewis, Toto, Christian ou Michael poderia tirar o título de Hamilton. E ela veio quando faltavam seis voltas para o fim.

Quando conquistou seu primeiro título na F1, Hamilton teve a ajuda involuntária de Timo Glock, que perdeu rendimento dos pneus slicks na úmida pista de Interlagos para efetuar uma ultrapassagem lendária na última curva do circuito paulistano e tirar o título de Felipe Massa. Passados treze anos, Hamilton tem o seu 'Glock': Nicholas Latifi. O limitado canadense vinha numa disputa acirrada com Mick Schumacher, que por sinal tem um carro pior do que o de Nicholas, e acabou batendo sozinho num lugar claro que o Safety Car entraria na pista. E foi justamente o que aconteceu. Naqueles segundos em que o SC apareceu nos carros, os movimentos dentro dos boxes de Mercedes e Red Bull se mostraram cruciais. Peter Bonnington, conhecido carinhosamente como Bonno, já tinha deixado Hamilton na pista no VSC e de uma forma questionável, manteve o inglês na pista durante o SC. Sem nada a perder, a Red Bull não apenas trouxe Max, como colocou pneus macios para o que seria uma relargada épica. Mas em tempos de Michael Masi na direção de prova, não poderia faltar uma polêmica final.


Com os carros organizados atrás do belo Safety-Car, percebeu-se que haviam vários retardatários entre Hamilton e Verstappen. Normalmente os pilotos são informados para ultrapassar o SC para que os líderes relarguem juntos. Tudo muito simples e muito fácil. Não para Masi. As voltas foram passando, o carro de Latifi permanecia no meio da pista e parecia que a esperada corrida final terminaria atrás do Safety-Car, sem emoção alguma. Horner e Wolff já tagarelavam no ouvido de Masi. Bandeira vermelha? Melhor não. E os carros entre os líderes? Tira, tira, tira. De forma atabalhoada, os carros foram permitidos ultrapassar o SC a ponto de Daniel Ricciardo ser o terceiro carro na relargada, mas o terceiro colocado era Carlos Sainz, se aproveitando do tardio abandono de Pérez. Os carros que ultrapassaram o SC estavam em velocidade normal, quando a relargada foi dada para a última e histórica volta desse campeonato de 2021. Hamilton tentou enervar Max nas últimas curvas, mas o neerlandês não caiu na armadilha e usou seus pneus macios para ultrapassar Lewis no novo grampo antes da reta oposta. Max jogou-se, não como na primeira volta, mas foi cirúrgico. Hamilton não poderia contar com um toque e evitou qualquer contato, mas ainda havia uma sessão com DRS, que Lewis usou e atacou, Max espremeu para manter a posição e ao emergir na ponta, garantiu seu primeiro campeonato de forma incrível e emocionante. Eu me tremia todo!


Foi um lindo final de campeonato e as imagens depois da prova mostravam bem toda a alegria e tristeza de vitoriosos e derrotados. Num raro momento de emoção, Max Verstappen chorou no rádio. Ele era o primeiro holandês campeão da F1. Jos tinha lágrimas nos olhos, o mesmo acontecendo com Christian Horner, algo não visto em qualquer um dos quatro títulos de Vettel no começo da década passada. Kelly Piquet nem tinha nascido quando seu pai venceu o último título, mas ela chorava pelo amado. Do outro lado, Lewis Hamilton demorou um bom tempo para sair do seu carro até ser consolado por um longo abraço pelo seu pai. Dentro do boxe da Mercedes, a incredulidade estava no ar, enquanto Toto Wolff gritava no rádio contra Masi. Os próprios pilotos reclamaram do chamado tardio da direção de prova para ultrapassar o SC... Sainz completava o pódio para finalizar uma ótima temporada do espanhol em seu primeiro ano de Ferrari. Na sua melhor corrida do ano, Tsunoda finalizou em quarto, bem perto de Sainz e logo na frente de Gasly, mas não suficiente para tirar da Alpine o quinto lugar do Mundial de Construtores. Valtteri Bottas. O finlandês foi homenageado pela Mercedes antes da prova, correu com um macacão azul, mas foi uma verdadeira alma penada durante toda a corrida. Enquanto Pérez deu um show na disputa com Hamilton, Valtteri sequer conseguiu ultrapassar Tsunoda. Provavelmente o nórdico já estava com a cabeça na Alfa Romeo. Norris marcou pontos, mas o inglês ficou bem longe do terceiro lugar no grid de ontem, com as Alpines marcando ponto com seus dois pilotos e Leclerc, numa corrida decepcionante, fechando a zona de pontos e terminando o campeonato atrás de Sainz na luta interna da Ferrari. A Aston Martin terminou zerada num campeonato bem abaixo e com Vettel tendo que aturar levar fechada do limitado Stroll. Schumacher fez uma corrida boa, andando na frente de Latifi e indiretamente mudando toda a história da corrida e do campeonato. Williams e Alfa tiveram duplos abandonos, com os italianos podendo ter feito mais para seus pilotos, que se despediram da F1 antes da bandeirada, em especial Kimi.


Anos após ser chamado de 'GP2 Engine', a Honda se despede da F1 em grande estilo dessa vez, comemorando seu primeiro título trinta anos depois de Ayrton Senna. Um título que, mesmo com todo o peso dos tempos de Williams, McLaren, Piquet, Prost e Senna, terá um lugar especial para os japoneses, que deram a volta por cima depois de serem a chacota da F1 por algum tempo. A Red Bull viu suas apostas virem à tona. Mesmo com a Honda fazendo um motor bem abaixo das demais, mas em ascensão, os austríacos se associaram com os japoneses e com uma dificuldade aqui e ali, finalmente tiveram um ótimo motor à disposição em 2021 e a Honda construiu um ótimo motor que ajudou a Red Bull a voltar a vencer. Mas bem antes disso, a Red Bull superou, ironia das ironias, a concorrência de Toto Wolff para contratar o adolescente Max Verstappen e coloca-lo na F1 antes de completar 18 anos. Max sempre foi um talento fora da média desde o kart, onde foi campeão mundial. Tendo a mão de ferro do seu pai Jos, Max chegou na F1 como um fenômeno, mas talvez agressivo demais. Os acidentes não tardaram a acontecer, mas como sempre se falou, é mais fácil frear um piloto rápido do que tornar um piloto lento rápido. Com o tempo Max foi ganhando mais e mais bagagem e tudo culminou com um 2021 onde ele acordou um gigante. Os títulos recentes de Hamilton mais pareciam ações protocolares de um super piloto tendo em mãos o melhor carro do pelotão. A sensação que existia era que Hamilton não atuava em seu máximo simplesmente porque não havia necessidade. Bater o Bottas? Sem problemas para ele. Em 2021 ele teve um carro e um adversário à altura e com isso Lewis elevou seu sarrafo para andar no limite dos gênios da F1, mas do outro lado havia um grande candidato à gênio. Max Verstappen foi agressivo como fazia tempo que não se via, mas ele também precisou ir ao limite que o fez derrotar esse monstro chamado Lewis Hamilton e impedir o oitavo título seguido de um piloto da Mercedes, que conquistou seu oitavo título seguido de Construtores. Wolff parece não entender que saber perder também é uma virtude e reclama das trapalhadas de Masi. Porém, se fosse ou Max ou Lewis, o título desse inesquecível 2021 estaria em ótimas mãos. Depois de tanta tensão, houve o abraço entre Hamilton e Verstappen, mas uma grande rivalidade pode estar nascendo. Poderia ter dado Lewis, mas no fim... Max, você mereceu! Você é Campeão do Mundo!

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