sábado, 17 de dezembro de 2022

Sete

 


Ele foi um surpreendente rival de Valentino Rossi bem no auge do italiano na MotoGP. Surpreendente, pois até então Sete Gibernau era considerado apenas um bom piloto, mas sem maiores predicados para se tornar um campeão do mundo, mas ao conseguir um maior apoio da Honda, justamente quando esteve fora da equipe oficial, Gibernau se tornou um piloto de ponta e protagonizou disputas eletrizantes com Rossi, mesmo que sendo derrotado na maioria das vezes. Completando 50 anos nessa semana, vamos conhecer um pouco mais da carreira de Gibernau.


Manuel Gibernau Bultó nasceu no dia 15 de dezembro de 1972 na bela cidade de Barcelona e as motos sempre estiveram presentes na vida do garoto, que logo ficou conhecido por Sete. Gibernau é neto de Paco Bultó, fundador da marca espanhola de motos Bultaco, que inclusive disputou o Mundial de Motovelocidade. Gibernau fazia provas eventuais com motos Bultaco pela Espanha, mas somente aos 18 anos fez sua estreia no campeonato espanhol. Graças ao sobrenome famoso, Gibernau conseguiu rapidamente subir de categoria e apenas dois anos depois de debutar no espanhol, Sete fez sua estreia no Mundial de Motovelocidade, participando do Grande Prêmio da Espanha de 1992 na categoria 250cc. Gibernau disputou por quatro anos o Campeonato espanhol de motovelocidade das 250cc de forma competitiva, mas sem títulos. Sete fez provas pontuais no Mundial das 250cc, mas só fez sua estreia no certame completo em 1996 e mesmo fazendo uma temporada para lá de discreta, Gibernau surpreendeu a todos ao subir para as 500cc em 1997, contratado pela equipe de Wayne Rainey. Numa moto mais potente, Gibernau fez um papel decente em sua Yamaha e marcou alguns pontos no campeonato. Pela primeira vez na carreira e não seria a última, Gibernau se aproveitou do infortúnio de um japonês para conseguir dar um passo em sua carreira. A equipe oficial da Honda testava uma novo moto com seu piloto Takuma Aoki, quando este sofreu um sério acidente que o paralisou da cintura para baixo. Sem muitas opções, a Honda apostou em Gibernau, que entrou como quarto piloto da equipe Repsol Honda e usando uma moto experimental V2. Gibernau conquistou seu primeiro pódio no Mundial em Jarama e Sete ficou fora dos dez primeiros no campeonato.


Quando Mick Doohan sofreu seu sério acidente que finalizaria sua gloriosa carreira no começo de 1999, Gibernau assumiu a moto do australiano e seus resultados melhoraram, subindo mais vezes ao pódio e terminando o campeonato em quinto, mas bem longe do seu compatriota e companheiro de equipe Alex Crivillé, o campeão daquele ano. A expectativa para Sete no ano 2000 era boa e logo na primeira corrida ele marcou sua primeira pole no Mundial, mas esse seria praticamente o ponto alto de Gibernau na temporada. Num ano marcado por várias quedas, Gibernau despencou para 15º no campeonato e acabou dispensado pela Repsol Honda, se mudando para a Suzuki em 2001, no lugar de Nobuatsu Aoki. A mudança parecia promissora para Gibernau, pois a Suzuki vinha de dois anos muito fortes nas 500cc, culminando com o título de Kenny Roberts Jr, porém Honda e Yamaha evoluíram para 2001 e a Suzuki acabou ficando para trás na luta de forças no que seria um ano de transição no Mundial de Motovelocidade, com a entrada das motos quatro tempos. Tanto Suzuki como Roberts estiveram longe de defenderem o título, mas Gibernau surpreendeu ao conquistar sua primeira vitória no Mundial em Valencia, numa prova marcada pela chuva, mas quando a pista secou, Sete estava com os pneus certos e após uma briga fratricida com Alex Barros, derrotou o brasileiro e comemorou a vitória na frente de 120.000 espanhóis. Porém, a Suzuki ficou ainda mais para trás com a chegada das novas regras da MotoGP e Gibernau fez um campeonato opaco em 2002, bem coerente com o pobre equipamento que dispunha. Foram apenas alguns pontos marcados e uma decepcionante 16º posição no campeonato. Até então a carreira de Sete Gibernau não chamava muita atenção e parecia que caminhava rumo a mediocridade. Porém, alguns fatores ajudaram a tornar Sete num piloto de ponta a partir de 2003.


Graças aos seus contatos, Gibernau sempre teve bons patrocínios junto ao seu nome e como a Espanha estava animadíssima com o Mundial de Motovelocidade desde o título de Crivillé, não foi difícil para Sete conseguir uma boa moto para 2003. Apoiado pela Telefônica, Gibernau levou a gigante de telecomunicações espanhola da Suzuki para a Honda Gresini. Mesmo sendo uma equipe satélite, a Gresini tinha como trunfo o japonês Daijiro Kato, queridinho da Honda e no qual a montadora apostava como o próximo grande ídolo nipônico. Por isso, Kato tinha uma moto de fábrica e mesmo trazendo o sempre bem-vindo patrocinador máster, Gibernau ficaria com um equipamento satélite. Porém, a tragédia se abateu sobre a Honda em Suzuka, quando Kato caiu na região da Chicane Casio e morreu. Foi um choque para todos, inclusive para Gibernau. O espanhol herdou o equipamento de Kato e sempre usaria o número 74 do japonês em seu macacão. Na prova seguinte, Gibernau segurou Valentino Rossi para conseguir sua segunda vitória na carreira na África do Sul, num dia emocionante para todos e logicamente dedicado à Kato. Até aquele momento a relação entre Rossi e Gibernau era boa, inclusive com o italiano genuinamente feliz pelo triunfo do espanhol em Welkon. Porém, Gibernau se tornou um piloto de ponta, brigando pela vitória em praticamente todas as provas e na Alemanha, Sete voltou a vencer derrotando Rossi na última curva. Essa vitória marcou a quarta vitória de Gibernau em 2003, confirmando-o como um dos contendores ao título, mas a tensão aumentou entre Gibernau e Rossi devido aos diferentes níveis de status dentro da Honda. Rossi, como piloto de fábrica e então campeão mundial, teve naturalmente prioridade em termos de peças e desenvolvimentos, mas Gibernau, por sua vez, estava naturalmente pressionando para ter o máximo de apoio possível da HRC para aumentar suas esperanças de título. Rossi sempre falava que as motos eram praticamente iguais e segundo a lenda, o italiano chegou a testar a moto de Gibernau para provar isso! Essa tensão dentro da Honda deixava Rossi descontente e no final de 2003 ele surpreendeu a todos ao anunciar sua ida para a Yamaha.


Com o vice-campeonato nas mãos, Gibernau parecia que seria o favorito da Honda em 2004, mas a montadora contratou Alexandre Barros como piloto principal e o debate sobre o apoio da fábrica continuou, com Gibernau ainda pilotando uma Honda de fábrica para uma equipe satélite, enquanto Rossi tinha o apoio total da Yamaha. Como a Yamaha vinha de uma má fase crônica, a Honda tinha tudo para fazer um dos seus pilotos campeão e ainda fechar a boca de Rossi. Gibernau liderou os testes de pré-temporada e era naturalmente um dos grandes favoritos ao título, mas Rossi deu seu recado logo na primeira corrida, quando conquistou sua famosa vitória em Welkon. Sete venceu as duas corridas seguintes em Barcelona e Le Mans, mas sofreria três derrotas consecutivas doloridas para Rossi. Naquele tempo, era comum as corridas da MotoGP ter Gibernau liderando a maior parte da corrida para ser ultrapassado por Rossi no final da prova. Parecia até mesmo ser de propósito! Aquilo mexia no psicológico de Gibernau e por isso o espanhol teve algumas quedas, facilitando ainda mais a vida de Rossi. As hostilidades entre Rossi e Gibernau, após tantas disputas próximas, atingiu o  clímax no Grande Prêmio do Catar de 2004 - palco da última vitória de Sete na MotoGP - quando Rossi foi rebaixado para o final do grid depois que sua equipe foi 'flagrada' limpando ilegalmente seu lugar no grid na noite anterior à corrida. Com ou sem razão, Rossi culpou Gibernau por este protesto 'antidesportivo' e, após a corrida, declarou furiosamente que Gibernau 'não voltaria a ganhar'. Era a famosa praga de Rossi e o praticamente o fim dos tempos áureos de Gibernau no Mundial de Motovelocidade.


A praga de Rossi ficou evidente logo na abertura da temporada 2005, quando novamente ele e Gibernau lutaram pela vitória em Jerez. Na última curva da última volta, Rossi partiu para uma manobra temerária para cima de Gibernau, que acabou na brita. Rossi venceu e foi ruidosamente vaiado pela torcida espanhola. Sete foi ao pódio com cara de poucos amigos e falou algo para Rossi, que pareceu fazer pouco das reclamações de Gibernau. Para muitos, aquela manobra de Rossi foi o início das disputas mais duras e polêmicas que dali em diante marcaram a MotoGP, com reflexos até hoje. Com Rossi em seu auge, o italiano conquistou o título de 2005 de forma tranquila, enquanto Gibernau teve um ano cheio de quedas e problemas com os pneus. Na última corrida do ano em Valencia, Gibernau abandonou com um problema na sua moto no início da prova e a forma como ele ficou em cima da moto, com os braços cruzados desconsolado mostrava bem sua situação difícil naquele momento. Após uma relação conturbada com a Honda, Sete se mudou para a Ducati em 2006, onde novamente seria piloto oficial de fábrica e os primeiros testes com a moto italiana foram promissores, mas a temporada de Gibernau começou com uma falha mecânica enquanto estava no grupo da frente em Jerez e mais infortúnios se seguiram - com destaque para um acidente assustador na curva um em Barcelona, quando ele se tocou com o companheiro de equipe Loris Capirossi. Gibernau quebrou a clavícula na queda, obrigando-o a perder as três corridas seguintes, então, apenas duas corridas após seu retorno, foi necessárias uma nova operação após a placa inserida para curar a fratura ficar enfraquecida, obrigando-o a perder outra corrida. Gibernau retornou no final da temporada, mas uma nova queda fez com que Sete não participasse da última etapa do campeonato. Troy Bayliss assumiu a moto de Gibernau em Valencia e venceu a prova! Com a Ducati tendo contratado Casey Stoner para 2007, Gibernau surpreendeu ao anunciar sua aposentadoria aos 35 anos de idade.


Gibernau tinha algumas ofertas, mas recusou todas elas, percebendo que seu tempo na MotoGP tinha passado. Para colocar sal na ferida, Stoner pegou a moto que seria de Gibernau e foi campeão da MotoGP em 2007, derrotando Rossi. Em 2009 Gibernau fez um breve retorno à MotoGP com uma Ducati satélite, mas quando a equipe faliu após apenas seis corridas, a carreira de Sete Gibernau acabou de vez com 158 corridas, nove vitórias, 32 pódios, 13 poles e os dois vice-campeonatos de 2003 e 2004 na MotoGP como seus melhores resultados. Gibernau  fez um retorno surpresa ao paddock do Mundial em 2019, correndo na nova Copa do Mundo de MotoE pela Pons. Sete conseguiu um sexto lugar como melhor resultado na temporada de estreia da classe de motos elétricas antes de se aposentar para sempre. Piloto educado e bem relacionado, Sete Gibernau é um dos cinco pilotos a venceram nas 500cc e na MotoGP e para sempre será lembrado por sua habilidade na pista molhada. O temperamento forte atrapalhou Sete algumas vezes, principalmente nas disputas diretas com Rossi, que mesmo tendo várias diferenças com Gibernau, já declarou várias vezes que um dos rivais mais difíceis que teve na carreira foi Sete Gibernau.

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