domingo, 25 de fevereiro de 2007

O dentista voador



Muitos descrevem Tony Brooks como um dos grandes pilotos do pós-guerra, mas muito subestimado. Um homem quieto, ao longo da carreira ele reteve um ar de modéstia junto com um senso de tranqüilidade e é difícil de acreditar que este foi o homem que dominou Spa, Nurburgring e Monza ao volante de um elegante Vanwall durante o verão dourado de 1958.

Nascido no dia 25 de fevereiro de 1932 em Dukinfield, Chesire, Charles Anthony Stanford Brooks apareceu nos Grandes Prêmios de modo incomum. Ele começou a correr em 1952 e durante três anos ele se tornou um excelente piloto amador, primeiro com um Healey e depois com um Frazer-Nash. Ele nunca pensou em ser piloto como profissão, até mesmo depois de ser contratado pela Aston Martin para dirigir seus carros. Com 23 anos de idade, ele estava estudando odontologia na universidade de Manchester e pensava seguir a carreira do pai, um conhecido dentista cirurgião. Em 1955 Brooks participou de sua primeira corrida “séria” em Goodwood e conseguiu um terceiro lugar ao lado de Peter Collins em um Aston Martin DB3S. Ao término de julho, ele foi convidado por John Riseley-Pritchard a dirigir o Connaught A3 F2 dele pela Equipe Endeavour no London Trophy em Crystal Palace. Brooks terminou em quarto com um F2 atrás de três carros dos F1 de Hawthorn, Schell e Roy Salvadori. No dia 3 de setembro, Brooks estava no mesmo carro no Daily Telegraph Trophy em Aintree e foi novamente quarto, desta vez atrás de Salvadori, Bob Gerard e Graham Gould. Um quinto no geral significava uma vitória na F2 no Avon Trophy em Castle Combe no dia primeiro de outubro.

Com grandes exibições, ele foi convidado para correr no Grande Prêmio de Siracusa em um Connaught de F1. Nessa época, Brooks estava estudando para suas provas finais na faculdade e deu mais atenção aos livros do que à corrida. Com a ausência da Ferrari, as Maseratis 250Fs de Luigi Musso, Harry Schell e Luigi Villoresi eram os favoritos. Mas Brooks andou perto das Maseratis nos treinos e acabou vencendo sua primeira corrida de F1 de forma surpreendente. Brooks foi o primeiro piloto britânico a ganhar com um carro britânico no Continente desde a vitória de Sir Henry Seagrave no Grande Prêmio de San Sebastian em 1924.

Quando ele voltou à Inglaterra ele assinou com a BRM para a temporada de 1956 e fez a estréia dele no Campeonato Mundial em Silverstone, mas o carro sofreu um problema no acelerador na curva Abbey. O carro capotou e pegou fogo, com Brooks sendo jogado para fora do carro e tendo uma mandíbula fraturada.

Brooks assinou como piloto número dois da Vanwall em 1957, com Stirling Moss como primeiro piloto e Stuart Lewis-Evans como terceiro piloto. Um pouco antes do Grande Prêmio da Inglaterra, Brooks sofreu um sério acidente durante as 24 horas de Le Mans a bordo de um Aston Martin e não estava totalmente recuperado de suas contusões. Na verdade, no primeiro dia de treinos Brooks ainda estava no hospital, mas ele saiu da cama, direto para a pista e conseguiu um incrível terceiro lugar. Contudo, todos sabiam que Brooks não conseguiria terminar a corrida e se Moss tivesse algum problema em seu carro, Brooks entregaria seu carro ao primeiro piloto. Depois de construir uma boa vantagem, Moss abandonou, assumiu o carro do quinto colocado Brooks e conseguiu uma vitória legendária. Foi a primeira vitória de um carro inglês no Grande Prêmio da Inglaterra e Brooks estava nos livros de história.

Em 1958, a disputa seria entre Vanwall vs. Ferrari e Moss vs. Hawthorn. Mesmo com Brooks andando no mesmo ritmo dos seus compatriotas, ele só tinha oito pontos quando ele venceu sua primeira corrida “sozinho”, em Spa-Francorchamps. Na Alemanha, a Vanwall estava muito bem e Brooks pode vencer sua terceira corrida na temporada, mas sua bela exibição foi ofuscada pela tragédia da morte de Peter Collins. Brooks venceria também em Monza, à frente de Hawthorn. Três vitórias em 1958, todos em circuitos clássicos: Spa-Francorchamps, Nürburgring e Monza. Mas nem tudo era felicidade para Brooks.

Sua posição dentro da equipe lhe dava alguns contratempos. "Nunca me permitiram treinar tanto quanto queria, porque se eu fosse mais rápido que Stirling eles teriam que o deixar sair novamente, e tudo que eu fazia era colocado no carro dele. E então ele poderia querer o meu chassi e o motor dele, ou vice-versa que significava mais trabalho para os mecânicos. Stirling sempre tinha certeza que ele teria o melhor carro, e se ele pensasse que ele não tinha, ele misturava tudo! Mesmo assim, nós éramos os melhores amigos, e ainda somos". Isso mostra que as ordens de equipe não é novidade e nem monopólio da Ferrari de Schumacher.

Ao término de 1958, Tony Vandervell ficou profundamente triste depois da morte do terceiro piloto da Vanwall Stuart Lewis-Evans em Casablanca e decidiu licenciar a equipe dele. Enquanto Moss assinava com Rob Walker, Brooks se tornaria mais um inglês a ir para Ferrari. Ele deixou bem claro ao Commendatore que só assinaria contanto que não lhe exigissem correr em Le Mans. Um homem profundamente religioso, Brooks sentia que os riscos envolvidos eram filosoficamente perto de tentar cometer suicídio, e isso para ele era inaceitável. Esta autodisciplina rígida tirou todas as chances dele de ganhar o Campeonato Mundial de 1959.

A primeira vitória na temporada foi apenas na sétima etapa, no Grande Prêmio da França. Contudo, esta foi uma corrida clássica e uma das maiores vitória de Brooks. No super-rápido circuito de Reims, Brooks ficou com a pole e no dia da corrida, a F1 viu um dos dias mais quentes da história, com pedaços de asfalto se soltando tamanho era o calor. Brooks disparou na liderança e os pilotos abandonavam a corrida por esgotamento, como o americano Masten Gregory. Na tentativa de se refrescarem, os pilotos quebraram os pára-brisas, mas isso trouxe outro problema, com as pedras sendo jogadas em seus rostos. Graham Hill e Roy Salvadori tiveram que trocar os óculos de proteção e Jack Brabham disse que no final da corrida não estava mais usando os freios, pois seus pés estavam queimados. Behra, que teve problemas na largada, forçou muito e acabou superaquecendo seu motor. O chefe da Ferrari Tavoni foi reclamar com o francês que retribuiu com um soco na cara de Tavoni e a demissão da equipe. Numa corrida tão quente, Brooks liderou todas as 50 voltas e ainda chegou inteiro.

A Ferrari não participou do Grande Prêmio da Inglaterra devido a uma greve na Itália e Brooks andou com um Vanwall particular. Na Alemanha, o tradicional circuito de Nürburgring foi substituído pelo circuito de Avus nos subúrbios de Berlim. Como em Reims, Brooks venceu sem dificuldades, mas ele teve problemas em Portugal e em Monza. Como resultado Tony foi para Sebring para o Grande Prêmio dos Estados Unidos com uma chance pequena de ficar com o título. Para azar de Brooks, seu companheiro de equipe Von Trips o acertou na traseira e Brooks preferiu olhar os danos na sua Ferrari, mas ainda com esse infortúnio, ele chegou num ótimo terceiro lugar. Brabham foi o campeão e Brooks foi o vice.

Nesse momento da carreira, Brooks já estava olhando para uma vida além das corridas e ele comprou uma garagem em Weybridge, Surrey, e decidiu que, para os interesses do seu novo negócio, faria mais sentido dirigir para uma equipe britânica. Para tristeza de Enzo, Brooks deixou a Ferrari e para 1960 ele assinou um contrato para dirigir um carro com motor traseiro Vanwall num chassi da Lotus. O carro nunca se materializou e, até que isto ficasse claro, todos os bons carros já tinham dono.

Ele andou para a equipe Yeoman Credit, num Cooper-Climax antiquado e longe de ser competitivo, mas “era o melhor que eu podia achar”, diria Brooks mais tarde. Um ano igualmente desapontador com a BRM se seguiu em 1961 e, depois de terminar a temporada com um terceiro lugar atrás da Innes Ireland e Dan Gurney em Watkins Glen, ele abandonou o esporte com apenas 29 anos para o qual ele tinha dado tanto.

Hoje, quase quarenta anos desde a aposentadoria dele, Tony Brooks vive confortavelmente em St George Hill, Weybridge, perto da garagem dele que é agora uma grande concessionária da Ford. Ele é um homem que juntou qualidade de uma estrela atrás do volante de um carro de corrida com uma falta genuína de vaidade que lhe fez ganhar muitos amigos e admiradores em todo mundo. Hoje, no 75º aniversário dele, podemos apenas dizer obrigado Tony, o dentista voador.

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