domingo, 26 de maio de 2019

Carreras son carreras

Quando Lewis Hamilton manteve a ponta da corrida após uma largada sem incidentes, com Bottas tendo sorte em se manter em segundo após uma bela largada de Verstappen, parecia que o Grande Prêmio de Mônaco havia terminado na primeira volta. A sexta dobradinha consecutiva da Mercedes parecia questão das 78 voltas no principado acontecerem de forma calma e tranquila. Mas como diria o mestre Juan Manuel Fangio, carreras son carreras. Um safety-car ainda nas primeiras voltas após o furo do pneu de Charles Leclerc mudou toda a cara da corrida e Lewis Hamilton, que correu com um capacete igual ao de Niki Lauda, mudou sua pilotagem para enfrentar uma perseguição implacável de Max Verstappen no que foi o primeiro erro da Mercedes nesse ano. Num final emocionante de corrida, Hamilton segurou o holandês mesmo com os pneus médios em frangalhos, garantindo a vitória de número 77 e viu o hexacampeonato ficar cada dia mais próximo.

Para termos uma corrida emocionante em Monte Carlo, não basta ter ultrapassagens mirabolantes ou mudanças climáticas repentinas. Alguma intempérie acontecendo durante a prova e a tática das equipes ser atrapalhada por algo fora do script normal da corrida já basta para transformar uma corrida onde praticamente ninguém passa ninguém numa prova memorável. A chuva até ameaçou cair nesse domingo, mas o máximo que se viu foram algumas gotas e nada mais. O que mudou a corrida teve como causa-raiz o erro bisonho da Ferrari no sábado, deixando um irritado Charles Leclerc nas últimas posições. Com a faca entre os dentes por estar largando fora de sua posição potencial, Leclerc fez uma ultrapassagem antológica em cima de Grosjean na Rascasse. 'Kamizake', reclamou o francês pelo rádio. Vendo que podia fazer mais, Leclerc tentou a mesma manobra em cima de Hulkenberg, mas o alemão jogou duro e o piloto da Ferrari rodou ligeiramente, mas que custou-lhe um pneu furado. Leclerc teve que ir aos boxes deixando detritos em toda a pista, trazendo o safety-car para a pista e mudando a prova. A corrida se encaminhava em outro passeio no parque da Mercedes, com Hamilton liderando Bottas com facilidade até o final, numa muito provável dobradinha. Porém, o safety-car fez com que as equipes mudassem as estratégias dos seus pilotos e todos os líderes foram aos pits. Hamilton surgiu com os pneus médios, enquanto Vettel e Verstappen saíram com pneus duros, que nem utilizados foram em Monte Carlo. A mensagem era clara: eles não parariam mais.

Contudo, os problemas não terminaram ali. Verstappen foi liberado pela Red Bull em cima da Mercedes de Bottas, causando um toque e o holandês subindo para segundo. Não se sabe se o pneu de Bottas furou ou se a Mercedes percebeu o erro que tinha cometido, mas o nórdico voltou aos pits na volta seguinte para colocar os pneus duros. Também não pararia mais. Hamilton estava calçado com os pneus médios, mas ainda era o início da corrida. Ele conseguiria ir até o final? E a chuva viria ou não? Tudo isso tornou o Grande Prêmio de Mônaco extremamente tenso até a bandeirada. A chuva de forma literal não veio, mas Hamilton teve que se reinventar. Para levar seus pneus até o fim, ele baixou seu ritmo drasticamente, fazendo com que uma fila de carros o perseguisse. Verstappen tinha mais ação, mas lhe faltava tração, enquanto Hamilton só acelerava no túnel e na reta dos boxes. Nos outros pontos do circuito, Lewis praticamente parava o carro, com Verstappen quase batendo na traseira da Mercedes na Lowes. Para aumentar o drama, Verstappen foi punido em 5s por liberação insegura de sua equipe (algo bastante discutível...) e o holandês precisava de espaço para perder o menor tempo possível. Vettel e Bottas eram meros expectadores da disputa de gato e rato entre os dois líderes, enquanto Hamilton chorava as pitangas no rádio, reclamando do único erro da Mercedes até agora: ter colocado pneus médios no comecinho da corrida. Comprovando seu amadurecimento, Verstappen não foi para cima de forma tresloucada. Esperou que os desgastados pneus de Hamilton também o deixasse sem tração e na penúltima volta tentou o ataque na freada da chicane do porto, mas Lewis conseguiu se defender de forma perigosa, pois um pneu traseiro furado não seria impossível para Hamilton, que partiu para a vitória num dia de homenagens à Niki Lauda por todos os lados.

Com a punição de Verstappen, Vettel conseguiu o segundo lugar e Bottas completou o pódio, mas o finlandês já deve saber que as chances de títulos diminuíram consideravelmente com Hamilton tendo vinte pontos de vantagem na ponta do campeonato. Mesmo com sua bela corrida, Verstappen teve que se contentar com o quarto lugar. O ritmo dos líderes era tão lento, que Pierre Gasly resolveu colocar pneus macios nas últimas voltas para marcar a volta mais rápida da prova, chegando a ficar 28s atrás de Bottas. Na bandeirada, ele estava apenas 4s atrás da segunda Mercedes. Leclerc teve que abandonar com o assoalho quebrado e o coração partido ao ser o único abandono do dia na frente dos seus torcedores.

O abismo entre as três equipes grandes e o resto foi escancarado com o quinto colocado Ricciardo ficando mais de 24s em menos de quinze voltas do quarto colocado Vettel. Carlos Sainz ficou como o melhor do resto, quase um minuto atrás de um lento Hamilton. A dupla da Toro Rosso conseguiu uma bela corrida ao ficar com a sétima posição com Kvyat e a oitava com Albon. Quatro motores Honda entre os oito primeiros em Mônaco, enquanto Alonso teve que assistir tudo isso pela TV, antes de tirar uma siesta... Grosjean ficou em nono, mesmo ultrapassado por Leclerc no começo da prova e Ricciardo, que errou ao parar junto com os líderes no safety-car e perder muitas posições, completou a zona de pontuação. Destaque negativo para Lance Stroll, que não consegue andar bem num circuito onde o piloto faz a diferença, e para a Alfa Romeo, que ficaram nas últimas posições. Stroll, Raikkonen e Giovinazzi conseguiram a proeza de serem superados pela Williams de Russell, com Giovinazzi chegando em último e já se tornando uma das decepções da temporada.

Para uma corrida ser emocionante, não significa obrigatoriamente ultrapassagens em todo o lugar ou resultados lotéricos. Mônaco também provou que as corridas não terminam na primeira volta e que muita coisa pode acontecer durante os 305 km de uma corrida de F1. Lewis Hamilton precisou mudar sua pilotagem e contar com uma grande força mental para segurar Verstappen até o fim para vencer pela terceira vez em Monte Carlo. Com as benção de Niki Lauda!

4 comentários:

  1. Verstappen mostrou hoje que só é agressivo se o carro a sua frente não for uma Mercedes.

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  2. Belo texto, só algumas correções a fazer. O bote de Max foi na antepenúltima volta, e todas as corridas da F1 possui no mínimo 305 km, a exceção é justamente em Mônaco.

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    1. Vc está certo, mas quando citei os 305 km de corrida de F1, falei de forma genérica. Todos tem que esperar a bandeirada!

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    2. Se fosse uma Ferrari ao invés de uma Mercedes, Verstappen não teria titubeado em dar o bote bem antes mesmo que resultasse em batida.

      Vinicius Vergueiro

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