quarta-feira, 2 de novembro de 2011

AJ

Para alguns, ele foi um dos pilotos mais determinados, duros e agressivos que a F1 já viu. Para outros, ele era um ogro, mal-educado e intimidador, que só foi campeão por ter caído nas graças de Frank Williams no momento em que o chefe de equipe inglês tinha o melhor carro da época. De uma forma ou de outra, esses adjetivos caem bem para Alan Jones. Esse australiano de personalidade forte teve tudo na vida para ser um piloto de corridas, mas circunstâncias fizeram que Jones tivesse que lutar para realizar seu sonho e por isso ele se tornou um verdadeiro guerreiro nas pistas, pois para conquistar seus objetivos, ele não poderia medir esforços. Através das dificuldades, Alan Jones nunca desistiu e chegou ao estrelato de forma tardia e curta, mas deixou sua marca na F1. Completando 65 anos no dia de hoje, vamos conhecer um pouco mais deste australiano casca grossa.

Alan Stanley Jones nasceu no dia 2 de novembro de 1946 em Melbourne e as corridas sempre tiveram ao alcance do pequeno australiano. Seu pai, Stan Jones, era um próspero concessionário de carros e muitas vezes participava de algumas corridas importantes. Na década de 50 Stan conseguiu seu auge ao vencer o Grande Prêmio da Austrália de 1959, derrotando na ocasião os melhores pilotos da Europa e seu grande rival na época, Jack Brabham. Ferrari e BRM tentaram contratar o australiano, mas Stan Jones resolveu ficar em sua terra natal para cuidar dos seus negócios e de sua família. Desde jovem vendo o pai correr, não foi surpresa Alan começar a querer correr e no momento em que seu pai chegava ao auge em 1959, Alan Jones conquistava o bicampeonato de kart do estado de Victoria e começava a dirigir os carros de corrida do pai, quando a família Jones sofreu um enorme baque. Uma grande recessão na Austrália sacudiu a economia local e Stan Jones foi à falência durante a década de 60. Alan Jones ainda corria em corridas de turismo, algo em que ele iria se especializar mais tarde, e em 1967 ele vai pela primeira vez à Inglaterra, onde decide se tornar um piloto de corridas. Mesmo que para isso ele tivesse que fazer grandes sacrifícios.

Sem apoio financeiro e recém-casado, Alan Jones chegou à Londres em 1970 decidido a fazer carreira de piloto, mas sem apoio, o australiano só consegue comprar um F-Ford usado, onde começa a correr na Inglaterra. Para se sustentar (e também sustentar as corridas...), Jones compra carros usados, faz algumas modificações e os vende por um preço um pouco melhor, algo que seria bastante utilizado por Nelson Piquet, um dos seus maiores rivais, quase dez anos mais tarde. Sem foco nas corridas e com pouco dinheiro para investir, Jones não conseguia os resultados esperados e para piorar, ele quebra a perna em Brands Hatch, testando o seu F3. A partir de 1973, quando é contratado pela GRD, Jones consegue seus primeiros sucessos, mas foi nesse mesmo ano em que ele perdeu o pai, vítima de um infarto. Conta a lenda que a coroa de flores jogado no túmulo de Stan Jones fora ganho por Alan dias antes, após uma vitória em Silverstone. Mesmo perdendo o título para Tony Brise, a carreira de Alan Jones começava a evoluir e em 1974 ele faria uma temporada completa na F-Atlantic, uma categoria intermediária entre a F3 e a F2. Jones obtém sucesso e chama a atenção do seu chefe de equipe, que consegue comprar um chassi usado da Hesketh de F1 e o australiano faz sua estréia na categoria que sempre sonhou durante o tumultuado Grande Prêmio da Espanha de 1975. Jones foi um dos muitos que se acidentaram naquele dia triste da F1, marcado pelo acidente de Rolf Stommelen, que matou mais de cinco fotógrafos. O alemão ficou o resto da temporada de fora e Jones foi chamado para substituí-lo na equipe Hill, de propriedade de Graham. Jones teria como companheiro de equipe seu velho rival Tony Brise, que já era considerado um dos pilotos mais promissores da época, mas que acabaria morrendo no final do ano em um acidente de avião que matou Graham Hill e sua equipe. Jones faz ótimas corridas, culminando com um quinto lugar em Nürburgring, mas como a equipe Hill tinha dificuldades financeiras, o australiano foi trocado por um piloto-pagante, mas essa exibição chama a atenção de outro ex-campeão mundial, John Surtees, que o contrata para 1976.

Surtees era conhecido por seu um chefe de equipe irascível, que muitas vezes brigava com seus pilotos por não serem tão bons quanto ele fora como piloto. De personalidade muito forte, não demorou para Jones entrar em rota de colisão com o chefe de equipe, mas isso não impediu algumas boas corridas, como o quarto lugar na última corrida da temporada, no Japão. Cansado da teimosia de Surtees, Alan Jones saiu do time no final do ano e sem muito espaço na F1, o australiano já estava de malas feitas para ir aos Estados Unidos para correr na Can-Am quando uma tragédia o fez voltar a F1. Durante o Grande Prêmio da África do Sul de 1977, Tom Pryce sofre um dos acidentes mais bizarros da história da F1 e morre, deixando a Shadow órfão de um piloto que não apenas fizesse seu trabalho dentro da pista, mas que fosse também um líder fora dela. Mesmo sem muita experiência, Jones é chamado para substituir Pryce e fazia uma boa temporada, culminando no Grande Prêmio da Áustria. A região de Zeltweg era conhecida pela sua instabilidade climática e a chuva se fez presente durante a corrida, mas o sol também deu as caras, fazendo daquela corrida uma verdadeira loteria. Com os pneus certos na hora certa, Jones venceu sua primeira corrida, recebendo a bandeirada na frente da Ferrari de Niki Lauda. Com outro pódio em Monza, Jones impressiona a Ferrari, que o sonda para o lugar de Lauda em 1978. Era praticamente a mesma proposta feita ao seu pai vinte anos antes, mas Gilles Villeneuve foi escolhido pelos italianos e como a Shadow também já sofria com problemas financeiros, Jones novamente se via sem alternativa para o futuro na F1, quando surge no seu horizonte Frank Williams.

Até meados da década de 70, a Williams era uma equipe mambembe e os esforços de Frank em manter sua equipe de forma digna na F1 eram admiráveis, mas não vinha dando resultados. Porém, no final de 1977 Frank consegue um valioso contrato de patrocínio com árabes e a Williams teria verba necessária para fazer uma boa temporada. Alan Jones se interessa pelo projeto da equipe e entra de cabeça na Williams em 1978, mas nem Frank, muito menos Jones esperavam pelo carro-asa da Lotus de Colin Chapman. Assim como as demais equipes, a Williams se torna obsoleta de uma hora para outra, mas Jones mantém sua fé na equipe e consegue bons resultados ao longo do ano, culminando com um ótimo segundo lugar em Watkins Glen, na última corrida da temporada. A Williams crescia de tal forma que, segundo consta, Frank Williams teria oferecido um cheque em branco para ter Emerson Fittipaldi na sua equipe e agora tinha orçamento suficiente para ter um segundo carro, para o veterano Clay Regazzoni, em 1979. Contudo, graças a fidelidade de Jones no ano anterior, AJ, como era conhecido na Williams, permanece como primeiro piloto. Até a metade do ano, a Williams vinha fazendo uma temporada parecida com a de 1978, mas Jones consegue sua primeira pole de forma surpreendente em Silverstone. O australiano lidera boa parte da corrida, mas abandona com problemas mecânicos. Porém, a Williams mostra a sua força e Regazzoni dá a primeira vitória da equipe na Inglaterra, para delírio de Frank Williams. Como num passe de mágica, a Williams passa a largar na primeira fila em todas as corridas até o final de ano e Jones finalmente venceria pela primeira vez com a Williams na corrida seguinte, na Alemanha. Na verdade, se não fosse a primeira metade do ano absolutamente discreta de Jones, o australiano brigaria pelo título de 1979, pois o piloto da Williams vence quatro das últimas seis corridas da temporada, finalizando o campeonato em terceiro lugar. Em menos de seis meses, Alan Jones se torna uma das estrelas da F1.

Jones inicia 1980 como um dos favoritos ao título e corrobora com isso com uma vitória sensacional na Argentina, primeira etapa do ano, quando teve que fazer uma parada não programada nos boxes quando liderava, caiu para quarto e em apenas dez voltas estava novamente na liderança. Porém, ainda na terceira corrida da temporada, em Long Beach, seu maior rival da temporada vence pela primeira vez: Nelson Piquet. O brasileiro havia estreado na F1 em meados de 1978 e fazia sua segunda temporada completa em 1980 e logo de cara ameaçava a soberania da Williams com seu belo Brabham branco e azul. As equipes tradicionais, como Ferrari e Lotus, estavam em má fase, enquanto Williams e Brabham, Jones e Piquet, brigavam pelo título. Com mais duas vitórias durante o ano, Alan Jones desembarcou em Montreal, penúltima etapa do ano, como favorito destacado ao título, precisando apenas de uma vitória para se sagrar campeão. Piquet ainda estava forte na briga e consegue a pole, mas um ameaçador Jones fica ao seu lado na primeira fila. O australiano aparece no domingo com um intimidador macacão verde escuro, quase negro, enquanto Piquet parecia nervoso antes da largada. A primeira curva seria decisiva e naquela época, Montreal tinha uma primeira curva rápida e até mesmo perigosa. Numa cena que nunca foi mostrada, Jones e Piquet chegaram lado a lado na primeira curva e como ninguém aliviou, Jones toca em Piquet e o brasileiro acaba se dando mal, batendo no guard-rail e destruindo seu carro. Porém, como vários outros carros bateram, a corrida foi interrompida e Piquet correu para seu carro reserva. O problema era que o chefe de mecânicos se esqueceu de trocar o motor, específico na ocasião, para treinos e portanto, mais potente e menos durável. Sem tempo hábil, Piquet largaria com esse conjunto e rezar para o melhor. Sabendo disso, Jones deixou o brasileiro desaparecer na frente e esperou, esperou... na volta 23, Piquet encostou seu carro com o motor quebrado quando liderava e Jones venceria não apenas essa corrida, como também seu primeiro e único campeonato, se tornando o segundo australiano a ser Campeão Mundial de F1.

Jones ainda venceria a última corrida de 1980 e uma prova extra-campeonato na Austrália, repetindo o feito do seu pai 21 anos antes. Novamente o australiano iniciava o campeonato como favorito em 1981, mas uma série de problemas e fatos destruiria o sonho do bicampeonato de Jones. O companheiro de equipe de Alan era o veterano argentino Carlos Reutemann, há muitos anos perseguindo seu título mundial. Reutemann havia sido um segundo piloto fiel a não deu trabalho a Jones em 1980, mas em 1981 tudo seria bem diferente. Após comboiar o australiano em Long Beach, onde Jones venceu, Reutemann liderava com folga o Grande Prêmio do Brasil, realizado debaixo de muita chuva. Então, a Williams mostrou uma placa “JONES-REUT”, mostrando claramente que queria Jones vencendo aquela prova. Vendo essa placa, Jones se acomodou e esperava apenas que Reutemann lhe cedesse a posição. O tempo passou, a corrida foi chegando ao fim e nada de Reutemann deixar Jones passar. Quando o argentino recebe a bandeirada, aquela temporada começava a ser definida. Jones fica furioso com Reutemann a ponto de não subir ao pódio, enquanto a Williams, desrespeitada por Reutemann, também não fica nada satisfeita com a atitude do argentino, mas enquanto Reutemann conseguia manter o ritmo durante o ano, Jones tem vários problemas. Durante o Grande Prêmio da Bélgica, Jones joga Piquet novamente para fora da pista e é chamado pelo brasileiro de ‘a besta da F1’. Mal sabia Piquet que Jones seria seu grande aliado no final do ano. Em Hockenheim, Jones protagoniza uma luta de tirar o fôlego com Alain Prost, que depois chamaria Jones de impetuoso, para não dizer violento! Mesmo sem estar na briga pelo título, Jones ainda tinha a admiração de Frank Williams e Patrick Head e no final de 1981 anuncia que abandonaria a F1 no final da temporada. E por isso, queria a vitória na última corrida do ano, em Las Vegas. Carlos Reutemann tinha apenas um ponto de vantagem sobre Piquet quando a F1 chegou aos Estados Unidos e Jones (e a própria Williams...) não estava muito preocupado em ajudar Reutemann a ser campeão. Num ato de desespero, Reutemann chegar a pedir desculpas a Jones na véspera da corrida, no qual Jones manda ele tomar no rabo. E Reutemann tomou mesmo. Apesar de largar na pole, o argentino fez uma corrida totalmente apática, enquanto Jones partia impávido rumo a sua última vitória na F1.

A Williams fez uma enorme festa para Jones, não se importando muito que Reutemann tenha perdido o campeonato por apenas um ponto. A rivalidade entre Jones e Reutemann era de tal, que Jones disse que o maior prazer que ele teve em 1981 foi ter colocado uma volta em Reutemann na corrida final em Las Vegas. Depois de mais de dez anos na Inglaterra, Jones retornava a sua amada Austrália e as corridas de turismo, onde com um Porsche 935 vence o Campeonato Australiano de GT em 1982. Porém, Jones ainda se sente atraído pela F1 e faz uma corrida solitária em Long Beach, onde abandona após poucas voltas. Alan sempre fora um piloto rechonchudo, mas sua forma física parecia cada vez pior e o australiano estava totalmente fora de forma nos Estados Unidos. Em 1984 Jones participa das 24 Horas de Le Mans e chega em sexto, sendo contratado pela Alfa Romeo no ano seguinte. Porém, o australiano é atraído pelo projeto de Carl Hass de ter uma equipe americana na F1 e ainda em 1985 participa de algumas corridas como laboratório. Ao lado do também veterano Patrick Tambay, Alan Jones faz sua última temporada de F1 em 1986 com a equipe Lola-Hass, mas o time tem uma temporada bastante irregular, com várias quebras e não raras vezes, largando nas últimas posições. Jones ainda mostra alguma força ao marcar um quarto lugar em Zeltweg, mas sua forma física precária não o ajudava a fazer boas corridas e no final do ano Alan Jones deixava definitivamente a F1, com um total de 116 corridas, 12 vitórias, 6 poles, 13 melhores voltas, 24 pódios, 203 pontos e o título mundial de 1980.

Após essa sua segunda passagem na F1, Jones se tornou chefe de equipe do tradicional Campeonato Australiano de Turismo, participando eventualmente de algumas corridas, principalmente da Bathurst 1000, a principal corrida australiana. Jones correu até 2002, mas tentou participar da malfadada GP Masters, em 2005, mas sua forma física cada vez maior o impediu de participar da corrida inaugural em Kyalami. Jones permaneceu junto a F1 sendo comentarista da TV australiana, além de ter ajudado seu filho Christian a ter sucesso na F1, algo que não conseguiu. Desde 2010, é convidado pela FIA a ajudar os comissários a tomar decisões em punir os pilotos por atitudes anti-desportivas dentro das pistas. Algo que Jones entende bem. O australiano foi muitas vezes julgado de ser agressivo demais e suas entrevistas ácidas também entraram para a história. Assim como é dentro da pista, Jones também era agressivo fora delas e conta a lenda que ele correu o Grande Prêmio da Itália de 1980 com a mão quebrada após uma briga num bar em Londres. Outra diz que Jones sempre corria com a mesma cueca vermelha para dar sorte. De qualquer forma, mesmo não sendo um dos pilotos mais brilhantes que a F1 já viu, Alan Jones entrou para a história pelo seu comportamento, principalmente frente ao rival histórico Carlos Reutemann, e pela fidelidade a Williams, onde até hoje é lembrado com muito carinho por Frank e Patrick Head.

Parabéns!
Alan Jones

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