Como todo campeão que se preze, a corrida em que seu título foi definido é sempre palco de uma grande corrida. Jenson Button não ganhou a prova de hoje em Interlagos, mas sua bravura em conseguir as ultrapassagens que lhe garantiriam as posições necessárias para que o título viesse, fizeram que esse campeonato fosse mesmo para as mãos certas. Barrichello não foi feliz em Interlagos e sua falta de sorte latente em sua pista caseira já ganha ares de lenda, pois o brasileiro não teve um ritmo digno de vitória no primeiro stint e o furo do pneu foi apenas o final de qualquer esperança de título, sendo que Rubens terá que se preocupar agora com o vice, pois Vettel, outro grande nome da prova, ocupa o 2º posto neste momento.
A corrida em Interlagos foi bastante movimentada no seu início, com acidentes, rodadas e fogo numa carambola gigantesca na primeira volta. Trulli e Sutil se estranharam após Raikkonen tocar em Webber na Reta Oposta e o finland
ês perder rendimento com a asa dianteira quebrada. Sutil não conseguiu ultrapassar Kimi na primeira oportunidade e Trulli tentou efetuar a manobra por fora, mas acabou na grama e rodando para cima de Sutil, fazendo com que ambos saíssem da pista de forma violenta. Enquanto Trulli batia no muro, Sutil saía rodando pela grama e atingindo perigosamente Alonso no Laranjinha. Com todos muito bem assentados, o melhor momento foi a quase briga de Trulli e Sutil, com o italiano totalmente descontrolado e acusando Sutil de algo que não vi. Ainda como rescaldo da primeira volta, Raikkonen saía tranqüilamente dos boxes quando viu Kovalainen imitar Massa e sair do box levando a mangueira de combustível, mas desta vez de forma mais espetacular e jogando fogo justamente em Raikkonen, que deve ter levado um baita susto. Com tudo restabelecido e o safety-car nos boxes, a corrida iniciou com Button fazendo belas ultrapassagens e Barrichello não conseguindo ganhar vantagem sobre Webber e Kubica, que ultrapassou Rosberg na relargada. Estava cantada o fim da festa em Interlagos.
Barrichello perdeu duas posições após a primeira parada quando foi, algo que todos sabiam, o primeiro a parar e a partir de então seu ritmo não foi mais o mesmo, perdendo tempo com relação aos dois primeiros e ainda sendo pressionado por um surpreendente Hamilton. O brasileiro parecia impotente frente a perda de ritmo do seu carro e um furo do pneu após ser ultrapassado por Hamilton fez com que Barrichello visitasse os boxes por um terceira e não-programada vez e o título de Button estava definido. O inglês da Brawn fez sua melhor corrida dos últimos meses, onde ele abandonou a cautela e fez belas ultrapassagens sobre Grosjean, Nakajima, Kobayashi e Buemi, enquanto a sorte fez sua parte ao tirar muitos carros da sua frente pelos incidentes da primeira volta. O ritmo de Button foi forte o tempo todo e nem de longe
lembrou o piloto conformado das últimas corridas, quando um título praticamente certo parecia que ia embora. Se Button não pode contar com o desenvolvimento da Brawn ao longo do ano, algo até previsível pela falta de investimentos da equipe novata, Jenson tem muito a agradecer a Ross Brawn pelo excelente carro que tinha no início de temporada e por ter acreditado nele. Button parecia àquelas garotas com sua idade (29 anos) e ainda não havia casado, apesar de sua beleza. Todos conheciam o talento de Button desde a sua estréia na F1, quando assombrou o mundo com belas atuações mesmo com tão pouca experiência, mas o grande problema foi que isso aconteceu no ano 2000, e quase ninguém mais lembrava do que o jovem inglês havia feito naquele ano. Button passou por maus bocados na F1, foi tachado pejorativamente de playboy e ainda viu o cometa chamado de Lewis Hamilton, que se tornou automaticamente o herói inglês. Jenson foi para a BAR em 2003 e viu a transformação da equipe em Honda e depois em Brawn, quando a montadora saiu da F1 repentinamente e deixou a equipe na mão. Ross Brawn, que elogiou Button desde sua chegada na ainda Honda, foi fundamental em sempre acreditar em Button no delicado momento da equipe no início deste ano e o inglês foi fiel ao time, sacrificando seu alto salário para permanecer junto com Brawn. Essa parceria resultou no mais impressionante começo de temporada da história da F1, com seis vitórias em sete. Button estava no topo do mundo, mas bem no momento que chegava em casa, no GP da Inglaterra, a Brawn entrou em decadência, levando Button consigo. Foi uma segunda metade de temporada sem brilho do inglês e Jenson ainda viu a subida de Barrichello, seu até então opaco companheiro de equipe, mas Button soube jogar com sua enorme vantagem e conseguiu o seu primeiro título da carreira. Jenson Button teve seus méritos em chegar ao grande prêmio de uma vida de piloto e foi o grande destaque bem no momento importante do ano, mas Button terá que mostrar bem mais do que fez nesse segundo semestre para confirmar o título deste ano.
O vencedor Mark Webber acabou sendo o grande coadjuvante desta tarde, mas ninguém pode tirar o mérito ao australiano, que soube se manter próximo de Barrichello antes da primeira parada e não se intimidou pelos ataques de Raikkonen na pri
meira volta. Quanto Rubinho parou, o piloto da Red Bull manteve um ritmo muito forte e não perdeu mais a dianteira da corrida, vencendo, com autoridade, pela segunda vez no ano, acabando com a má fase iniciada após sua primeira vitória na Alemanha. Vettel fez uma corrida inteligente, onde não foi tão efetivo quanto Button nas ultrapassagens, mas o alemão sabia que tinha o melhor carro do final de semana e uma estratégia que lhe levaria ao pelotão da frente quando os líderes começassem a parar. Sebastian ainda teve o azar de um pequeno problema para trocar o pneu dianteiro esquerdo e perdeu um pouco de tempo, fazendo com que não conseguisse se aproximar mais rapidamente de Hamilton no final da prova, que poderia lhe garantir um pódio e mais alguns pontinhos, algo muito importante na briga pelo vice-campeonato, já que agora tem apenas dois pontos à frente de Barrichello.
A boa performance de Robert Kubica na corrida de Interlagos ilustra bem a inconstância da BMW ao longo desta temporada. A equipe ocupou em vários momentos as últimas posições, mas como mágica um dos seus pilotos acaba surpreendendo e aparece lá na frente em determinadas corridas. Kubica escapou bem dos acidentes à sua frente, ultrapassou Nico Rosberg na relargada e de repente estava em 3º, andando próximo de Mark Webber, mas como estava bastante leve, a
possibilidade de sua estratégia lhe jogar para trás era real. Porém, o polonês emergiu à frente do brasileiro após a primeira parada e quando o forte trânsito à sua frente foi aos boxes, o piloto da BMW foi o piloto mais rápido da pista, chegando a esboçar uma aproximação em cima de Webber, mas como foi o primeiro a fazer sua segunda parada, Kubica acabou tendo que cuidar bastante dos seus pneus moles e garantir um ótimo segundo lugar para a equipe BMW, para uma despedida digna da equipe, provando que a marca bávara pode estar cometendo um erro parecido com a da Honda. Heidfeld, que reclamou nesta semana de ser um piloto subestimado, foi um a abandonar, sendo que desta vez com um problema mecânico, quando ocupava as últimas posições. Nada muito agradável ao ver o companheiro de equipe brigando pelas primeiras posições...
Se Deus escreve certo em linhas tortas, Hamilton provou que o ditado é correto ao conseguir um surpreendente terceiro lugar após ter problemas na primeira volta. Como tinha que usar os dois compostos de pneus e teria que visitar os boxes, o inglês en
cheu o tanque de sua McLaren e trocou os pneus moles pelos duros. Hamilton, mais pesado, fez uma corrida estratégica, mas mostrava suas capacidades ao pressionar Barrichello após este voltar à pista a
pós sua primeira parada. Foram várias voltas tentando a ultrapassagem, mas Hamilton foi mais feliz quando Rubens teve um pneu furado e pode subir ao pódio numa corrida sempre muito especial para ele, onde foi do inferno ao céu em um ano. Kovalainen protagonizou o momento mais aterrorizante do final de semana quando saiu dos boxes levando a mangueira de combustível e pôs fogo no carro de Raikkonen, que vinha logo atrás. Esse foi o único momento em que o finlandês, que dificilmente ficará na McLaren em 2010, de maior destaque na corrida, sendo que não ficou muito claro quem errou na presepada dos boxes, o piloto ou a equipe. Raikkonen mostrou toda a sua frieza ao não se importar muito com o fogo que consumiu seu carro e permaneceu na prova como se nada tivesse acontecido, levando sua problemática Ferrari aos pontos, mas Kimi tinha boas chances se não fosse tão afoito na primeira volta e quebrar a asa dianteira após brigar pela segunda posição com Webber e desencadear toda a confusão que se seguiu. Fisichella fez uma corrida bem arroz-com-feijão e não marcou pontos mais uma vez, mas talvez o italiano esteja tão deslumbrado em conseguir correr pela Ferrari que foi ultrapassado pela segunda corrida seguida de forma até humilhante, ao não prestar muita atenção na porta escancarada que deixou por dentro para Kobayashi.
O japonês da Toyota, após Button, foi o grande destaque da corrida. Fazendo sua estréia numa pista desconhecida e um carro
que só andou três dias, sendo que dois debaixo de chuva, Kamui Kobayashi não decepcionou e fez uma bela apresentação em Interlagos, não se impressionando com Button e segundo o campeão por muitas voltas de forma segura e valente, além de protagonizar uma boa disputa com seu compatriota Kazuki Nakajima, desembocando na bonita ultrapassagem sobre Fisichella no final. Com a Toyota em crise e sem piloto para 2010, Kobayashi tende a ser uma escolha natural para a equipe, caso ela permaneça na F1 no ano que vem, mas não devemos esquecer que Nakajima fez uma boa corrida na estréia e o resultado todos estão vendo, como seu perigoso acidente de hoje, onde poderia ter atingido o próprio Kobayashi enquanto estava sem controle. O filho de Satoru deve estar mesmo de saída não apenas da Williams, como também da F1. Nico Rosberg parecia com problemas desde o início da prova e acabou abandonando com o motor quebrado, mas o alemão já deve estar sonhando com o cockpit do carro campeão deste ano. Buemi fez sua melhor corrida em muito tempo e marcou alguns pontinhos, mas o suíço perdeu rendimento após sua primeira parada, quando estava facilmente à frente Button e acabou ultrapassado pelo inglês e longe do sexto. Alguesuari correu? Nem vi... Outro que teve uma corrida fugaz foi Alonso, atingido perigosamente por um descontrolado Sutil, mas o espanhol deve estar pensando: Só falta uma para eu me livrar desta cadeira elétrica! Grosjean, coitado, prova que além do carro ser ruim, ele também não ajuda, com mais uma atuação patética quando foi facilmente ultrapassado
por vários carros quando estava em sexto. E pensar que Kobayashi, com menos experiência, fazia muito mais à sua frente...
Interlagos decide o campeonato pela quinta vez consecutiva, desta vez sem muitos dramas e a temida e esperada chuva acabou ficando em uma ameaça no horizonte. Claro que todos queriam, no mínimo, a vitória de Barrichello, mas Button, principalmente pelo que fez na primeira metade do campeonato, mereceu amplamente o título e deverá comemorar muito na noite paulistana, até mesmo soltando a voz na famosa música do Queens: We are the champions!