domingo, 24 de junho de 2012

Meninos, eu vi


Hoje tive a sensação de ter presenciado uma dos grandes momentos da história da F1 numa corrida de tirar o fôlego do começo ao fim. De grandes pilotos que serão lembrados para sempre como gênios da velocidade se espremendo na difícil e bonita pista de Valencia. Pista essa, que até o ano passado só tinha tido corridas chatas, mas que esse histórico 2012 vem para reverter toda a lógica. Inclusive, fazendo um normalmente frio Fernando Alonso comemorar como nunca vitória improvável em sua casa, após uma corrida monumental do espanhol, saindo da décima primeira posição rumo a um triunfo consagrador e ajudando seu país em crise dar um sorriso frente às dificuldades diárias. Foi uma corrida magnífica, decidida na pista, com homens lutando a todo o momento em manter seu espaço num dia em que a F1 lembrará por muitos anos.

Não deixou de ser surpreendente a prova em Valencia ter sido tão boa. O histórico não ajudava a prever uma corrida tão cheia de reviravoltas e ultrapassagens como a de hoje. Sebastian Vettel parecia que ganharia pela terceira vez seguida vindo da pole, mas um problema em seu carro abriu as portas para Fernando Alonso comprovar que está mesmo na história da F1. Assim como Jenson Button ano passado em Montreal, Alonso mostrou hoje uma das melhores apresentações individuais da história da F1 com um começo de corrida arrebatador, com uma ótima largada e várias ultrapassagens. Alonso também soube usar a estratégia, a mesma que o atrapalhou tanto no Canadá, para ganhar posições e aparecer em terceiro lugar na entrada do safety-car. Na relargada, ultrapassou com vigor um grande Romain Grosjean e se foi ajudado pela quebra do dominante Vettel, Fernando controlou a corrida a partir de então com a maestria do grande campeão que é. As imagens após a bandeirada emocionaram a todos, pois apesar de todos os seus defeitos, a F1 ainda é capaz de emocionar a todo um povo sofrido com uma crise histórica e Alonso fez questão de mostrar que vitórias como essas são capazes de alegrar até o mais triste coração. Para melhorar, Alonso pode ter dado um passo enorme rumo ao título. Após a corrida no Canadá, o campeonato se afunilava para uma disputa entre Hamilton, Alonso e Vettel, com o primeiro na liderança. Porém, com o abandono dos seus dois maiores rivais, Alonso agora tem uma folga de vinte pontos para o seu mais próximo perseguidor, Mark Webber. O tricampeonato agora é mais que possível! Felipe Massa vinha mais ou menos na balada de Alonso, mas como ocorria nos tempos da relação conturbada Schumacher-Barrichello, todos os problemas caíram na cabeça do brasileiro e um toque em Kobayashi pôs tudo a perder para o ferrarista. Massa teve que engolir ter que tomar uma volta de Alonso mais uma vez, mas desta vez, foram as circunstâncias que fizeram outro mal resultado de Massa.

Como Alonso acabou com a sequencia histórica de pilotos diferentes vencendo nas primeiras corridas no campeonato, talvez a Lotus tenha menos pressão, mas ainda assim os carros auri-negros são os favoritos para tirar o cabaço (como se diz aqui no Ceará) e vencer pela primeira vez no ano. Favoritos a fazê-lo em Valencia, a Lotus bateu na trave novamente com Kimi Raikkonen tendo outra grande exibição e chegando em segundo, mas o grande piloto da Lotus hoje foi Romain Grosjean. Apesar da Globo secar demais o francês, em nenhum momento Grosjean errou e parecia capaz de estragar a festa dos espanhóis e vencer a corrida nas ruas valencianas. Grosjean largou bem e ultrapassou de forma firme Maldonado na primeira curva, passando a perseguir Hamilton até passa-lo quando já tinha uma enorme desvantagem para o líder Vettel. Com o safety-car, Grosjean pode encostar no líder Vettel e até ataca-lo, mas o francês acabou ultrapassado por Alonso, mas nunca saiu de perto do espanhol e com as lembranças ainda vivas de como economizou pneus em Montreal, a previsão era de um ataque nas voltas finais, mas infelizmente esse ataque não veio por uma quebra mecânica da Lotus de Romain. Porém, Raikkonen diminuiu um pouco a frustração com outra pilotagem segura e sem grandes arroubos de talento, mas com muita eficácia. O finlandês estava claramente atrás de Grosjean a corrida todo, mas quando o companheiro abandonou, soube atacar Hamilton quando este ficou sem pneus e chegou novamente em segundo lugar, levando a Lotus a encostar na McLaren no segundo lugar no Mundial de Construtores. Ainda falta um final de semana em que tudo se encaixe para a Lotus vencer e este momento ainda deverá acontecer este ano.

Outro momento histórico da corrida de hoje foi o primeiro pódio de Michael Schumacher em sua volta à F1. O alemão largou ao lado de Alonso hoje, mas não teve a mesma volúpia do piloto da Ferrari, mas soube utilizar a estratégia que tanto o ajudou a vencer títulos com a Ferrari para ser o piloto mais rápido no final e fazer várias ultrapassagens para garantir um terceiro lugar emocionante. Está claro que Schummy não tem mais o mesmo vigor do seu auge na F1 e que a aposentadoria definitiva está próxima, mas o alemão mostrou que ainda pode vislumbrar os bons tempos. Nico Rosberg mal apareceu na TV e mesmo com uma estratégia parecida com a de Schumcher, o alemão não teve a mesma gana do companheiro de equipe na hora de ultrapassar e por isso ficou para trás. Largando em 19º, marcar pontos era um objetivo até difícil para Mark Webber, mas o australiano fez muito mais e por muito pouco não beliscou um pódio, mas o que ele fez não deixou de ser um ótimo resultado. Na verdade, Webber só não ultrapassou Schumacher na volta final por causa da bandeira amarela provocada pelo incidente entre Hamilton e Maldonado na volta anterior, que lhe garantiu mais duas posições, mas o impediu de ganhar outra. Porém, Webber marcou pontos suficientes para pular ao segundo lugar do campeonato, mesmo estando vinte pontos e não ter repetido, ainda, o brilhantismo de 2010. Vettel era o virtual vencedor da corrida quando abandonou tristemente pouco após a saída do safety-car. O alemão chegou a estar 20s na frente do segundo colocado Grosjean e com dois campeonatos nas costas, a chance de segurar Alonso era grande mesmo correndo na casa do adversário, mas o carro da Red Bull, que tinha se mostrado tão confiável ano passado, deixou a equipe na mão como fez algumas vezes em 2010, irritando Vettel e fazendo Adryan Newey botar as mãos na cabeça. 

As voltas finais teve um Lewis Hamilton perdendo ritmo de forma abrupta, provavelmente por causa dos pneus e isso fez com que Maldonado encostasse no inglês e um polêmico incidente acontecesse. Porém, novamente a McLaren errou num pit-stop de Hamilton, fazendo o inglês sair de sua segunda parada atrás de Alonso. Num momento de renovação de contrato, isso poderá pesar. Hamilton zerou pela primeira vez no ano e a forma como ficou após bater no muro mostrou não apenas a frustração pela batida, como também a chance do bicampeonato estar indo embora lentamente mais uma vez. Button pontuou novamente, o que não deixa de ser uma evolução, mas o inglês esteve longe de brilhar e mais uma vez ficou devendo! Maldonado fazia uma corrida correta até o incidente com Hamilton, que poderá acabar lhe valendo uma punição por tempo. O venezuelano levou várias ultrapassagens de forma até consciente, pois sabia que lutar demais poderia mais prejudicar do que ajuda-lo, mas a forma como bateu em Hamilton acabou estragando não apenas a obtenção de bons pontos, como poderá acabar por puni-lo mais uma vez, que acabou vitimando Bruno Senna, a meu ver, injustamente, em outro arroubo de Kobayashi. O brasileiro vinha fazendo uma prova segura, no mesmo ritmo de Schumacher e Webber, sendo que estava à frente de ambos, e provavelmente pontuaria de forma consistente até encontrar Koba pela frente e ser punido, destruindo sua boa corrida. A Force India foi consistente ao extremo e marcou bons pontos com seus dois pilotos, sendo que Hulkenberg passou a prova praticamente inteira na frente de Paul de Resta, quando o normal era o contrário. A entrada do safety-car pode ter estragado a estratégia do escocês, que provavelmente pararia uma vez menos.

Essa história de mito para Kamui Kobayashi está se tornando mais folclórico do que sério. Que o japonês da Sauber é rápido e agressivo, ninguém duvida, mas a realidade é que ele está sendo amplamente superado por Sérgio Pérez, que é tão rápido e muito mais eficiente, e seus acidentes fazem nos lembrar do também folclórico e simpático Satoru Nakajima. Pérez marcou pontos mais uma vez, mesmo largando lá atrás, enquanto Kobayashi abandonou após tantas pancadas nos brasileiros. A Toro Rosso fez outra corrida para esquecer e mesmo Daniel Ricciardo chegando a ficar em quarto devido a estratégia diferente de pneus na relargada da corrida, o time estava mesmo brigando com a Caterham, mostrando a involução da equipe. Por sinal, Verge fez outra corrida terrível e trouxe a entrada do safety-car ao provocar um acidente bobo com Kovalainen. A Caterham teve uma prova atribulada, mas chegou a ver Petrov em décimo por algumas voltas, até o russo se achar mais tarde com Ricciardo, em outra briga Caterham x Toro Rosso. O time verde já está no mesmo ritmo da filial da Red Bull, o que já é motivo para comemorar. A Marussia teve apenas Charles Pic para enfrentar a ascendente HRT na luta para se livrar da última posição e o francês acabou conseguindo superar os carros espanhóis, mesmo com dificuldades. Glock, coitado, não correu por uma vulgar caganeira!

Valencia hoje viveu momentos de Interlagos em 1993, quando o povo levantou nos braços Ayrton Senna após uma vitória improvável. Hoje, Alonso fez isso e ainda se garantiu como favorito ao título numa campanha marcada pelo talento, inteligência e oportunismo do espanhol, que vem cavando seu nome na história da F1. Para quem duvidava que estamos vendo uma melhores temporada da história da F1, hoje pode ter sido uma resposta, mesmo com Alonso disparando no campeonato. Hoje vimos brigas de altíssimo nível. Valencia nos mostrou uma corrida histórica e poderemos dizer mais tarde, daqui a alguns anos, que vimos um Alonso iluminado, um Raikkonen soberbo, um Schumacher agressivo, um Webber admirável, um Vettel dominante...

Um comentário:

  1. Não foi sensação não, foi a prova de que nem só de passado vive esta categoria.
    A corrida foi das maiores de todos os tempos.

    ResponderExcluir