Antigamente, os pilotos não se especializavam em apenas uma categoria, pois participavam de várias corridas diferentes e por isso, era normal um piloto de F1 disputando as 24 Horas de Le Mans ou as 500 Milhas de Indianápolis numa mesma temporada. Porém, poucos foram os que se destacaram em qualquer carro que estivesse em mãos. Jacky Ickx foi um dos maiores pilotos de endurance de todos os tempos, vencendo em Sarthe em seis oportunidades, além de dois títulos Mundiais de Esporte-Protótipo e até mesmo vencendo o Rally Paris-Dakar, mas nem por isso o belga deixou de se tornar um ídolo da F1, onde foi duas vezes vice-campeão e se tornou uma referência na categoria no início da década de 70. Contudo, nessas injustiças da vida, Ickx acabou por não conquistar um título da F1, apesar do seu talento e precocidade, acabando por se juntar a outras lendas sem taça, como Moss, Peterson e Villeneuve. Completando 65 anos no dia de hoje, vamos conhecer a rica carreira de Jacky Ickx.
Jacques Bernard Ickx nasceu no dia 1º de janeiro de 1945 em Bruxelas, na Bélgica. A chegada de Ickx ao esporte a motor veio por influência do seu irmão mais velho, um piloto amador belga, e de seu pai, o conceituado jornalista especializado em automobilismo Jacques Ickx, ele também um ex-piloto. O pequeno Jacques-Bernard, logo apelidado de Jacky, começou sua vida no esporte a motor com as motos, aos 12 anos de idade, quando seu pai lhe comprou uma pequena Zundapp 50cc. Ainda adolescente Ickx participou de seu primeiro campeonato de motovelocidade e foi campeão belga logo em seu primeiro ano, vencendo oito das treze corridas da temporada. Após conquistar o bicampeonato em 1964, Ickx fez uma mudança comum naquela época entre os motociclistas, quando trocou as duas pelas quatro rodas e em 1965 ele estreou no automobilismo a bordo de um Lotus Cortina, se tornando Campeão Belga de Turismo logo em sua estréia.
Mostrando um enorme talento em todo tipo de automóvel que ele dirigia, Ickx acabou por se mudar para os monospostos em 1966, participando, e bem, de corridas de F3 e de F2, já correndo na equipe de Ken Tyrrell. Ainda em 1966, ele venceria sua primeira corrida de longa duração, os 1000km de Spa, com um BMW 2000ti ao lado do alemão Hubert Hahne. Para 1967, a equipe Tyrrell de F2 mudava de nome para Matra International e Ickx conheceria como companheiro de equipe seu maior rival nas pistas: Jackie Stewart. O escocês tinha acabado de estrear na F1 pela BRM com muito estardalhaço, mas ainda estava ligado a Tyrrell, que tinha lhe dado o título de campeão inglês de F3 em 1964, e estrearia no Europeu de F2 com grandes expectativas, porém, Ickx já tinha um ano na categoria e venceu sua primeira corrida na categoria num lugar que lhe seria bastante especial: Nürburgring. A pista alemã se tornaria a favorita de Ickx, enquanto Stewart lutava para que o circuito alemão fosse tirado do calendário automobilístico de alto nível. Não demorou para que Ickx e Stewart começassem a serem rivais tanto dentro como fora das pistas, com Ickx sempre procurando desafios justamente no perigo nas pistas, enquanto Stewart clamava por mais segurança.
Ainda em 1967, com apenas 22 anos de idade e dois anos correndo no automobilismo, Ickx fez sua estréia na F1. O Grande Prêmio da Alemanha em Nürburgring tinha poucos inscritos e os organizadores, para rechear mais o magro grid, chamou as principais equipes de F2 para participar da corrida de F1. O paddock foi surpreendido quando o jovem belga, com seu Matra F2, ficou com o 3º melhor tempo da Classificação, ficando atrás somente de Denny Hulme e Jim Clark. Pelas regras da época, independente do tempo feito nos treinos, os carros de F2 largariam atrás dos carros de F1 e Ickx foi obrigado a largar lá atrás. Porém, isso não foi empecilho para que já na 4º volta o belga já estivesse na 5º posição, à frente de 12 carros de F1. Infelizmente, a sua suspensão dianteira quebrou e ele foi forçado a abandonar, mas Jacky Ickx já tinha deixado sua marca na principal categoria de automobilismo. As equipes de F1 ficaram muito interessadas em contratar o belga, mas com todas as vagas já preenchidas em equipes grandes, Ickx fez sua verdadeira estréia na F1 no Grande Prêmio da Itália daquele ano pela equipe Cooper-Maserati e, mesmo com um carro fraco, Ickx impressiona novamente ao conseguir o sexto lugar, marcando seu primeiro ponto logo em sua estréia de verdade. Para completar um ano magnífico, Ickx venceria o Campeonato Europeu de F2, derrotando o piloto oficial da Brabham, o australiano Derek Gardner. Fora dos monospostos, Ickx continuava se destacando em provas de longa duração e com mais uma vitória nos 1000 km de Spa, além de seus contatos com a Matra, Jacky é contratado pela equipe de John Wyer e faria sua estréia em Le Mans naquele ano.
No final de 1967, várias equipes de F1 oferecem um lugar a Ickx para a temporada de 1968, e o belga acaba escolhendo a Ferrari. Ainda com o carro de 1967, Ickx abandona as duas primeiras etapas da temporada, mas quando a F1 chega em Spa, praticamente o quintal de Ickx, o belga começa a mostrar seu verdadeiro talento e juntamente com a chegada do novo carro, Jacky consegue um lugar na primeira fila e termina a prova em terceiro, conseguindo seu primeiro pódio na F1. Em Zandvoort, Ickx mostra pela primeira vez outra marca que ficaria para sempre ligada a ele: sua pilotagem na chuva. Ickx se tornaria o primeiro piloto a ser conhecido como Rei da Chuva e só bastava alguns pingos na pista para que Ickx se tornasse favorito a vitória. A habilidade do belga debaixo d’água ficaria mais evidente na etapa seguinte, o GP da França em Rouen. Numa corrida marcada pela morte de Jo Schlesser, Ickx consegue sua primeira vitória na F1 debaixo de muita chuva e já se tornava uma estrela da categoria de forma bem precoce. Em Nürburgring, Ickx conquistaria sua primeira pole e mesmo a corrida acontecendo debaixo de uma tempestade e com muita neblina, Jacky fica apenas em quarto, muito por ter perdido sua viseira e ter corrido boa parte da prova assim. Com um terceiro lugar em Monza, Ickx, surpreendentemente, logo em sua temporada de estréia na F1, brigava pelo título com Graham Hill, Stewart e Hulme. O campeonato seria decidido nas três últimas corridas norte-americanas, mas a sorte abandona Ickx quando ele sofre um forte acidente nos treinos para o Grande Prêmio do Canadá e acaba quebrando a perna, ficando de fora de duas corridas e perdendo a chance de conquistar o Mundial de F1. Porém, ao final deste ano, Ickx teria que tomar uma decisão importante. Ainda contratado pela equipe de John Wyer, que tinha trocado a Matra pelos míticos Ford GT40, Ickx teria que escolher entre a Ferrari ou a Ford. Numa estranha decisão olhando nos dias de hoje, Ickx prefere ficar junto com a Ford e deixa a equipe Ferrari de F1, apesar da sua ótima temporada.
Porém, o Mundial de Esporte-Protótipo era um dos grandes campeonatos da época e Ickx já estava apaixonado por Le Mans e achando que teria mais chances na equipe de John Wyer, ele preferiu tomar esse caminho. Com sua ligação com a Ford mais do que estabelecida, Ickx consegue um lugar na equipe Brabham, mas, de forma lógica, a equipe se concentrou no dono da equipe, Jack Brabham. Os primeiros resultados do belga não foram bons, mas quando Brabham quebra o pé num teste, Ickx fica com o primeiro carro e os resultados começaram a aparecer, porém, a temporada de 1969 seria amplamente dominada pelo seu rival Stewart, com seu Matra-Ford. Após dois pódios na Inglaterra e na França, Ickx consegue uma esmagadora vitória sobre Stewart em Nürburgring, derrotando o escocês por 57s. Após um 2º lugar no México e uma vitória no Canadá, Ickx consegue o vice-campeonato de F1, mas seu melhor resultado do ano não seria na categoria. Em Le Mans, a Porsche era a principal favorita com seu novo modelo 917, que seria, mais tarde, considerado o melhor carro de corrida do século. Porém, o novo carro ainda precisava de mais desenvolvimento e a própria montadora alemã sabia disso e por isso também trouxe o modelo 908. A principal rival da Porsche seria a equipe de John Wyer e seu Ford GT40, que já estava sendo considerado obsoleto na época. Jacky Ickx era o principal piloto da equipe e disputaria a corrida com Jackie Oliver. O belga poderia não ser adepto a lutas a favor da segurança, mas Jacky era contra a tradicional largada em Le Mans, onde os carros ficavam parados em um lado da pista e os pilotos ficavam do outro lado, esperando que a largada fosse dada e corressem em direção a seus carros. Muitas vezes, os pilotos não afivelavam seus cintos, sem contar o risco iminente de atropelamentos. Em forma de protesto, Ickx atravessou calmamente a pista, afivelou seu cinto com cuidado e só depois largou com seu Ford GT40, em último. Infelizmente, o protesto de Ickx foi percebido de forma cruel ainda na primeira volta, quando o piloto privado John Woolfe bateu seu Porsche na Maison Blanche e acabou falecendo, pois não tinha colocado seu cinto de segurança de forma correta. Willy Mairresse, piloto da Ferrari, também sofreria um acidente em circunstâncias parecidas e teria encerrada sua carreira por causa disso. Após um atraso de duas horas a corrida foi reiniciada e os novos Porsche 917 dispararam na frente, mas a falta de confiabilidade fez com que os carros alemães caíssem um a um. No final da corrida, a vitória estava sendo disputada entre o Porsche 908 de Hans Herrmann/Gerard Larrouse e o Ford GT40 de Ickx/Oliver. Na hora final, o Porsche tem problemas de freios e tem que ir aos boxes, entregando a liderança a Ford, que era dirigido então por Ickx. Nas mãos do veterano Hans Herrmann, o Porsche 908 começou a tirar a diferença para o Ford. Faltando poucos minutos de uma corrida de 24h, os dois carros estavam colados e trocavam de posição como se estivessem numa corrida de 30 minutos. O Porsche 908 era bem mais rápido nas longas retas de Sarthe, enquanto o Ford era mais forte nas seções mais travadas. Mesmo bem mais jovem que Herrmann, Ickx foi catimbeiro na volta final, chegando a irritar o alemão, e conquistou sua primeira vitória em Le Mans por apenas 100 metros, até hoje a menor diferença entre o 1º e o 2º colocado na corrida francesa entre equipes diferentes. Ickx não apenas vencia uma corrida épica, como mudava a regra da largada em Le Mans, a partir de 1970. Porém, Ickx tinha que pensar em seu futuro na F1 e ele não podia ser apenas um segundo piloto da Brabham e por isso voltou a Ferrari para 1970, tendo que abandonar a equipe John Wyer e seus belos carros azuis com patrocínio da Gulf.
Contudo, a temporada de Ickx na F1 começou de forma complicada, inclusive com um terrível acidente no Grande Prêmio da Espanha, quando Jacky teve sua Ferrari atingida por outro carro e tendo seu F1 pegando fogo. Após 20s tentando deixar seu carro em chamas, Ickx foi internado com queimaduras graves, mas após 17 dias ele estava de volta ao seu cockpit no Grande Prêmio de Mônaco para conquistar um ótimo 2º lugar. O carro da Ferrari melhorava e no Grande Prêmio da Alemanha, em Hockenheim, Ickx terminaria em 2º, colado no vencedor e dominador daquela temporada Jochen Rindt. Mostrando o quanto a Ferrari tinha evoluído, Ickx venceria o Grande Prêmio da Áustria. Depois do falecimento de Piers Courage em Zandvoort, a morte que voltaria a chocar a F1 apenas três semanas mais tarde com a morte de Rindt nos treinos para o Grande Prêmio da Itália. Ickx se torna o único piloto com chances de tirar o título de Rindt, que já tinha cinco vitórias até então, mas em Monza quem venceu foi o novo piloto da Ferrari Clay Regazzoni. Ainda tentando conquistar o título, Ickx vence no Canadá, mas no GP dos Estados Unidos, Emerson Fittipaldi conquista a primeira vitória brasileira e garante, matematicamente, o título para Rindt, mesmo com Ickx tendo vencido a corrida seguinte no México. Era o segundo vice-campeonato seguido do belga. Após três anos na equipe de John Wyer, Ickx teria que os vencer a partir de agora com a Ferrari, mas Wyer já tinha um contrato com a Porsche e praticamente dominou tanto em Le Mans, como o Mundial de Esporte-Protótipo.
Com um ótimo final de campeonato, Ickx era o principal favorito para 1971, mas a Ferrari é superada por Lotus e, principalmente, Tyrrell. Stewart esmaga a concorrência como poucas vezes vista e Ickx só venceria uma corrida em Zandvoort, não por coincidência na chuva. A Ferrari ainda se concentrava em duas frentes durante a temporada e sempre começava o ano pensando primeiramente no Mundial de Esporte-Protótipo, algo que já tinha feito John Surtees abandonar a equipe no final de 1966. Para piorar, em 1971 a Ferrari tem um ano ainda pior no Mundial de Esporte-Protótipo, com vários abandonos e apenas um 2º lugar com Ickx em Brands Hatch. Para 1972, Ickx fica mais um ano na Ferrari e após dois 2º lugares na Espanha e em Mônaco, a Ferrari entrou em um espiral de abandonos, até que Ickx chega a Nurburgring e com sua velha classe, consegue não apenas a vitória, como também a pole e a melhor volta. O que ninguém sabia era que esta seria a última vitória de Ickx na F1. Em compensação, Ickx esmaga a oposição no Mundial de Esporte-Protótipo e conquista o campeonato com seis vitórias, ao lado de pilotos como Andretti, Regazzoni e Redman. Porém, 1973 seria um verdadeiro desastre para Ickx. Na F1, a Ferrari produz o modelo 312B3, que de tão ruim, teve que ser reconstruído no meio da temporada, ainda com péssimos resultados. Após Ickx conquistar um 19º lugar no grid no GP da Inglaterra, a Ferrari resolve não participar do GP da Alemanha, em Nürburgring, a corrida favorita de Ickx. O belga não gosta nem um pouco da idéia e simplesmente agradece a Enzo Ferrari seus anos na equipe e abandona a Ferrari no meio do ano. No Mundial de Esporte-Protótipo, Ickx ainda vence em Monza e Nürburgring antes de sair da Ferrari, mas aquele ano tinha sido dominado pela Matra de Henri Pescarolo e Gérard Larrousse.
Jacky Ickx ainda era considerado um dos grandes pilotos da F1 e ainda era jovem para a média geral (29 anos). Por isso, ele foi o escolhido pela Lotus para substituir Emerson Fittipaldi, que tinha ido para a McLaren em 1974. A equipe estava usando o modelo 72 desde 1970 e produz o Lotus 76, que não estava a altura do antecessor. Para piorar, Ickx encontra em Ronnie Peterson um piloto difícil de bater e suas constantes derrotas nas Classificações fazem com que a imprensa começasse a criticar o belga. O modelo 76 fracassa de forma retumbante e a Lotus volta a usar o mítico Lotus 72, em sua quinta temporada seguida, e com ele Peterson consegue três vitórias, enquanto Ickx só consegue três 3º lugares, mas o belga ainda voltaria a se destacar na Corrida dos Campeões, uma prova de F1 fora do campeonato realizado em Brands Hatch, onde o belga venceu debaixo de muita chuva e após uma ultrapassagem por fora, na Paddock Bend, sobre a Ferrari de Niki Lauda. Em 1975 a Lotus insiste no modelo 76 e a segunda tentativa se torna um desastre, com a equipe voltando a usar o Lotus 72E, já em sua sexta temporada e bastante defasado em relação as demais equipes. Para piorar, Peterson continuava a derrotar Ickx nos treinos e o belga resolve abandonar a Lotus no meio da temporada. Isto seria praticamente o fim da carreira na F1 para Ickx. Porém, nas corridas de Endurance a vida de Jacky estava ótima. Ickx faz uma volta a equipe de John Wyer e vence as 24 Horas de Le Mans de 1975 ao lado do inglês Derek Bell.
Mesmo com apenas 31 anos de idade, todos na F1 davam Ickx como morto, mas o belga ainda insiste na categoria, agora assinando com a equipe Williams, na época considerada um time mambembe. Dos tempos de glória, quando estava acostumado com as vitórias e a posição de favorito, Ickx agora teria que se conformar com a triste situação de eterno retardatário em uma equipe pequena e com carro ruim. Após oito corridas, o belga se transfere para a equipe Ensign, mas seus resultados não melhoram e Ickx ainda sofre um sério acidente em Watkins Glen. Jacky reflete sua situação na carreira e resolve abandonar a F1 e se dedicar unicamente ao Mundial de Esporte-Protótipo. A essa altura Ickx já tinha assinado como piloto oficial da Porsche e com ela tinha conseguido o título mundial de Esporte-Protótipo de 1976 com sete vitórias em dez corridas, além da sua terceira vitória em Le Mans, ao lado do holandês Gijs van Lennep. Em 1977, Ickx consegue aquela que seria sua melhor vitória em Le Mans. Correndo ao lado de Henri Pescarolo, Ickx tem problemas logo no início da corrida e então a Porsche o colocou no carro de Jürgen Barth e Hurley Haywood, que no momento estava em 42º lugar. Usando sua experiência e velocidade, Ickx empreendeu uma espetacular corrida de recuperação e na manhã de domingo liderava a prova, mas então seu Porsche tem problemas de motor. Para continuar na corrida, a equipe alemã desliga um cilindro e coloca Ickx no volante para ele levar o carro até o fim, algo que o belga conseguiria com maestria. Como era comum na época, Ickx participa de outras categorias e vence provas importantes em 1977, como a tradicional Bathurst 1000, realizada na Austrália. Jacky ainda voltaria a F1 em 1977, substituindo Clay Regazzoni na equipe Ensign no Grande Prêmio de Mônaco e isso faz com que Ickx desista de sua aposentadoria da F1 e assina com a equipe para 1978, mas após quatro corridas sem resultados competitivos, Ickx abandona a equipe, só retornando à F1 em 1979, substituindo Patrick Depailler na equipe Ligier, quando o francês sofre um acidente de asa delta e tem que se afastar por seis meses das pistas. Amplamente batido por Jacques Laffite nos treinos, Ickx usa sua experiência para conseguir um 6º lugar no GP da Inglaterra, um 5º lugar na Holanda e um último show. Sob pista molhada, Ickx mostra sua velha maestria com uma atuação destacada em Montreal, fazendo várias ultrapassagens deslizando na pista úmida até abandonar com problemas de câmbio. Em Watkins Glen, na corrida seguinte, Jacky Ickx faria sua última corrida na F1. Foram 114 Grandes Prêmios, oito vitórias, treze poles, quatorze melhores voltas, 25 pódios, 181 pontos ganhos e dois vice-campeonatos (1969 e 1970).
Ickx chegou a anunciar que estava abandonando o automobilismo e passou o ano de 1980 administrando a reforma em Spa para que a pista belga recebesse novamente a F1, mas um convite para correr em Le Mans com uma equipe particular da Porsche e, principalmente, um resultado surpreendente fez com Ickx revogasse sua aposentadoria e ele é contratado pela Porsche para correr com o modelo 956. Foi com esse carro e tendo ao lado o velho parceiro Derek Bell que Ickx venceu em Le Mans pela quinta vez em 1981. O belga se tornara uma lenda na corrida francesa, mas Ickx ainda precisava de novos desafios e em 1981 fez sua estréia no Rally Paris-Dakar com um Citröen CX. Em 1982, agora patrocinado pela Rothmans, a Porsche dominou inteiramente o Mundial de Esporte Protótipo e as 24 Horas de Le Mans, com a montadora alemã conquistando os três primeiros lugares tanto na Classificação final do Mundial, como em Le Mans, com Ickx conseguindo sua sexta e última vitória em Sarthe, ao lado de Derek Bell. O ano de 1983 começa de forma vitoriosa para Ickx, ao vencer o Paris-Dakar com uma Mercedes 280GE, tendo como navegador Claude Brasseur, após vencer cinco especiais. Porém, no Mundial de Esporte-Protótipo, o belga teve um pouco mais de trabalho. A dominação da Porsche chegou a ser humilhante frente aos seus adversários. Foram nove vitórias em dez corridas no Mundial de Esporte-Protótipo e nove carros alemães, contando as equipes particulares, nas dez primeiras posições em Le Mans, mas desta vez quem venceu foi o trio Vern Schuppan/Hurley Haywood/Al Hobert, com a dupla Ickx/Bell ficando em segundo lugar. Porém, o maior problema de Ickx era outro. Internamente, Ickx era a principal figura da equipe Porsche, mas com a chegada do jovem e atrevido Stefan Bellof, aos poucos as atenções da equipe se voltaram para Bellof, que além de espetacular, era alemão, causando ciúmes em Ickx. Conta a lenda que essa ciumeira de Ickx foi uma causas da saída de Bellof da equipe oficial da Porsche em 1984, mas Ickx e Bellof ainda se encontrariam de forma decisiva em duas oportunidades.
A primeira seria no Grande Prêmio de Mônaco de 1984 de F1, quando Ickx era o diretor de prova daquela corrida, que começou debaixo de muita chuva, ironicamente, as condições preferidas de Ickx. Prost liderava a corrida tranquilamente, quando a chuva apertou de vez quando a prova se aproximou dos 30 minutos. Prost estava com problemas de freios e via com apreensão a aproximação de Senna, mas Bellof, que tinha largado em último, andava 1s mais rápido do que Senna e se aproximava dos dois. Sem consultar nenhum comissário de prova, Ickx interrompeu a corrida na volta 31, dando a vitória para Prost e deixando Senna e Bellof bastante irritados. Não faltaram insinuações de que tudo aquilo se tratava de negócios, pois Ickx era piloto da Porsche e Prost corria com um motor Porsche, mas nada pode ser provado e o máximo o que aconteceu foi que Ickx sofreu uma punição por não ter pedido a opinião de ninguém para interromper a corrida. Com uma quebra no Paris-Dakar de 1985, Ickx vinha fazendo uma boa temporada no Mundial de Esporte-Protótipo pela Rothmans Porsche e ao lado de Jochen Mass, brigava com seus companheiros de equipe Hans-Joachim Stuck/Derek Bell pelo título mundial e cada dupla tinha três vitórias quando chegaram a Spa para a disputa da tradicional corrida de 1000 km. Stefan Bellof já era considerado a grande revelação da F1 no momento e tinha praticamente tudo certo com a Ferrari para 1986, mas ele ainda fazia corridas eventuais pelo Mundial de Esporte-Protótipo e correndo com um Porsche 956 da equipe de Walter Brun, o alemão faria parte da corrida em Spa. Ickx liderava a corrida, mas Bellof fazia uma bela corrida de recuperação e se aproximava do belga. Os começaram uma emocionante briga pela ponta, com Bellof querendo vingança sobre Ickx pelos anos em que ficaram juntos na equipe oficial da Porsche. Bellof tentou uma ultrapassagem espetacular e otimista sobre Ickx na entrada da Eau Rouge e os dois se tocam. Ickx roda e bate com força no guard-rail, mas Bellof bate violentamente de frente e acaba morrendo. Ickx fica arrasado e no final de 1985 ele encerra sua carreira no Mundial de Esporte-Protótipo.
Ickx passa a se dedicar unicamente aos ralis, principalmente o Paris-Dakar. Correndo pela Porsche, Ickx consegue alguns bons resultados até se transferir para a soviética Lada em 1988. Uma escolha exótica, que acabou dando poucos resultados ao belga, mas Ickx volta ao topo quando se junta a Peugeot em 1989. E também as polêmicas. A principal rival da Peugeot era a Mitsubishi e quando os carros da marca japonesa abandonam, o chefe de equipe Jean Todt chama Ickx e Ari Vatanen num canto e explica sua ‘estratégia’. Querendo fazer um rally tranqüilo até o final, o francês promove um cara-ou-coroa para decidir quem venceria o Paris-Dakar daquele ano. A moeda cai no lado de Vatanen e Ickx fica extremamente irritado com a presepada, chegando a parar seu carro de propósito em algumas especiais para que Vatanen passasse a frente e o finlandês acabou vencendo o Paris-Dakar daquele ano. Vinte anos depois, Todt e Vatanen disputariam a presidência da FIA... Em 1990 Ickx venceria a única especial da história do Lada Niva no Paris-Dakar e um incêndio com seu Citröen, impediu que o belga conquistasse sua segunda vitória em terras africanas em 1991. No Rally dos Faraós de 1992, Ickx sofre um acidente com seu Peugeot 405 e o carro pega fogo. O belga sai ileso do acidente, mas seu navegador Christian Tarin, que fazia anos trabalhava com Jacky, morreria carbonizado. Testemunhando outra morte de perto, Ickx abandonou definitivamente as corridas no final de 1992, aos 47 anos de idade.
Piloto apaixonado, Jacky Ickx não se divorciou por completo do automobilismo, atuando em corridas promocionais e voltando a ser diretor de prova em Mônaco. Aos 55 anos, Ickx voltou ao Paris-Dakar ao lado de sua filha Vanina, em 2000, terminando em 18º com um Toyota Land Cruiser. Por sinal, Vanina Ickx se tornou uma piloto bem sucedida, principalmente na categoria turismo, onde atuou no DTM e corridas de endurance, como em Le Mans e Spa (além de ser uma gata!). Também em 2000, Jacky Ickx se tornou Cidadão honorário de Le Mans pelos seus feitos na pista francesa e em 2005 ele teve seu recorde de vitórias na pista francesa quebrado por Tom Kristensen. Hoje vivendo em Bruxelas, Ickx continua sendo reverenciado pelo seu estilo de pilotagem e pela coragem demonstrada nas pistas. Uma pessoa apaixonada pelas corridas, Ickx adorava desafios e por causa disso ele foi um ídolo em várias categorias, sendo um multi-campeão no Mundial de Esporte-Protótipo, se tornando uma lenda na Ferrari, mesmo não sendo campeão na F1, e uma figura mítica em Le Mans. Extremamente respeitado entre seus pares, não importando a época, Jacky Ickx podia vencer em qualquer tipo de pista, tempo ou distância. Provando isso, as palavras finais ficam para o dinamarquês Tom Kristensen. “Eu posso ter mais vitórias do que Ickx, mas ele é absolutamente único, uma grande personalidade, o Mister Le Mans.”
Parabéns!
Jacky Ickx
Jacques Bernard Ickx nasceu no dia 1º de janeiro de 1945 em Bruxelas, na Bélgica. A chegada de Ickx ao esporte a motor veio por influência do seu irmão mais velho, um piloto amador belga, e de seu pai, o conceituado jornalista especializado em automobilismo Jacques Ickx, ele também um ex-piloto. O pequeno Jacques-Bernard, logo apelidado de Jacky, começou sua vida no esporte a motor com as motos, aos 12 anos de idade, quando seu pai lhe comprou uma pequena Zundapp 50cc. Ainda adolescente Ickx participou de seu primeiro campeonato de motovelocidade e foi campeão belga logo em seu primeiro ano, vencendo oito das treze corridas da temporada. Após conquistar o bicampeonato em 1964, Ickx fez uma mudança comum naquela época entre os motociclistas, quando trocou as duas pelas quatro rodas e em 1965 ele estreou no automobilismo a bordo de um Lotus Cortina, se tornando Campeão Belga de Turismo logo em sua estréia.
Mostrando um enorme talento em todo tipo de automóvel que ele dirigia, Ickx acabou por se mudar para os monospostos em 1966, participando, e bem, de corridas de F3 e de F2, já correndo na equipe de Ken Tyrrell. Ainda em 1966, ele venceria sua primeira corrida de longa duração, os 1000km de Spa, com um BMW 2000ti ao lado do alemão Hubert Hahne. Para 1967, a equipe Tyrrell de F2 mudava de nome para Matra International e Ickx conheceria como companheiro de equipe seu maior rival nas pistas: Jackie Stewart. O escocês tinha acabado de estrear na F1 pela BRM com muito estardalhaço, mas ainda estava ligado a Tyrrell, que tinha lhe dado o título de campeão inglês de F3 em 1964, e estrearia no Europeu de F2 com grandes expectativas, porém, Ickx já tinha um ano na categoria e venceu sua primeira corrida na categoria num lugar que lhe seria bastante especial: Nürburgring. A pista alemã se tornaria a favorita de Ickx, enquanto Stewart lutava para que o circuito alemão fosse tirado do calendário automobilístico de alto nível. Não demorou para que Ickx e Stewart começassem a serem rivais tanto dentro como fora das pistas, com Ickx sempre procurando desafios justamente no perigo nas pistas, enquanto Stewart clamava por mais segurança.
Ainda em 1967, com apenas 22 anos de idade e dois anos correndo no automobilismo, Ickx fez sua estréia na F1. O Grande Prêmio da Alemanha em Nürburgring tinha poucos inscritos e os organizadores, para rechear mais o magro grid, chamou as principais equipes de F2 para participar da corrida de F1. O paddock foi surpreendido quando o jovem belga, com seu Matra F2, ficou com o 3º melhor tempo da Classificação, ficando atrás somente de Denny Hulme e Jim Clark. Pelas regras da época, independente do tempo feito nos treinos, os carros de F2 largariam atrás dos carros de F1 e Ickx foi obrigado a largar lá atrás. Porém, isso não foi empecilho para que já na 4º volta o belga já estivesse na 5º posição, à frente de 12 carros de F1. Infelizmente, a sua suspensão dianteira quebrou e ele foi forçado a abandonar, mas Jacky Ickx já tinha deixado sua marca na principal categoria de automobilismo. As equipes de F1 ficaram muito interessadas em contratar o belga, mas com todas as vagas já preenchidas em equipes grandes, Ickx fez sua verdadeira estréia na F1 no Grande Prêmio da Itália daquele ano pela equipe Cooper-Maserati e, mesmo com um carro fraco, Ickx impressiona novamente ao conseguir o sexto lugar, marcando seu primeiro ponto logo em sua estréia de verdade. Para completar um ano magnífico, Ickx venceria o Campeonato Europeu de F2, derrotando o piloto oficial da Brabham, o australiano Derek Gardner. Fora dos monospostos, Ickx continuava se destacando em provas de longa duração e com mais uma vitória nos 1000 km de Spa, além de seus contatos com a Matra, Jacky é contratado pela equipe de John Wyer e faria sua estréia em Le Mans naquele ano.
No final de 1967, várias equipes de F1 oferecem um lugar a Ickx para a temporada de 1968, e o belga acaba escolhendo a Ferrari. Ainda com o carro de 1967, Ickx abandona as duas primeiras etapas da temporada, mas quando a F1 chega em Spa, praticamente o quintal de Ickx, o belga começa a mostrar seu verdadeiro talento e juntamente com a chegada do novo carro, Jacky consegue um lugar na primeira fila e termina a prova em terceiro, conseguindo seu primeiro pódio na F1. Em Zandvoort, Ickx mostra pela primeira vez outra marca que ficaria para sempre ligada a ele: sua pilotagem na chuva. Ickx se tornaria o primeiro piloto a ser conhecido como Rei da Chuva e só bastava alguns pingos na pista para que Ickx se tornasse favorito a vitória. A habilidade do belga debaixo d’água ficaria mais evidente na etapa seguinte, o GP da França em Rouen. Numa corrida marcada pela morte de Jo Schlesser, Ickx consegue sua primeira vitória na F1 debaixo de muita chuva e já se tornava uma estrela da categoria de forma bem precoce. Em Nürburgring, Ickx conquistaria sua primeira pole e mesmo a corrida acontecendo debaixo de uma tempestade e com muita neblina, Jacky fica apenas em quarto, muito por ter perdido sua viseira e ter corrido boa parte da prova assim. Com um terceiro lugar em Monza, Ickx, surpreendentemente, logo em sua temporada de estréia na F1, brigava pelo título com Graham Hill, Stewart e Hulme. O campeonato seria decidido nas três últimas corridas norte-americanas, mas a sorte abandona Ickx quando ele sofre um forte acidente nos treinos para o Grande Prêmio do Canadá e acaba quebrando a perna, ficando de fora de duas corridas e perdendo a chance de conquistar o Mundial de F1. Porém, ao final deste ano, Ickx teria que tomar uma decisão importante. Ainda contratado pela equipe de John Wyer, que tinha trocado a Matra pelos míticos Ford GT40, Ickx teria que escolher entre a Ferrari ou a Ford. Numa estranha decisão olhando nos dias de hoje, Ickx prefere ficar junto com a Ford e deixa a equipe Ferrari de F1, apesar da sua ótima temporada.
Porém, o Mundial de Esporte-Protótipo era um dos grandes campeonatos da época e Ickx já estava apaixonado por Le Mans e achando que teria mais chances na equipe de John Wyer, ele preferiu tomar esse caminho. Com sua ligação com a Ford mais do que estabelecida, Ickx consegue um lugar na equipe Brabham, mas, de forma lógica, a equipe se concentrou no dono da equipe, Jack Brabham. Os primeiros resultados do belga não foram bons, mas quando Brabham quebra o pé num teste, Ickx fica com o primeiro carro e os resultados começaram a aparecer, porém, a temporada de 1969 seria amplamente dominada pelo seu rival Stewart, com seu Matra-Ford. Após dois pódios na Inglaterra e na França, Ickx consegue uma esmagadora vitória sobre Stewart em Nürburgring, derrotando o escocês por 57s. Após um 2º lugar no México e uma vitória no Canadá, Ickx consegue o vice-campeonato de F1, mas seu melhor resultado do ano não seria na categoria. Em Le Mans, a Porsche era a principal favorita com seu novo modelo 917, que seria, mais tarde, considerado o melhor carro de corrida do século. Porém, o novo carro ainda precisava de mais desenvolvimento e a própria montadora alemã sabia disso e por isso também trouxe o modelo 908. A principal rival da Porsche seria a equipe de John Wyer e seu Ford GT40, que já estava sendo considerado obsoleto na época. Jacky Ickx era o principal piloto da equipe e disputaria a corrida com Jackie Oliver. O belga poderia não ser adepto a lutas a favor da segurança, mas Jacky era contra a tradicional largada em Le Mans, onde os carros ficavam parados em um lado da pista e os pilotos ficavam do outro lado, esperando que a largada fosse dada e corressem em direção a seus carros. Muitas vezes, os pilotos não afivelavam seus cintos, sem contar o risco iminente de atropelamentos. Em forma de protesto, Ickx atravessou calmamente a pista, afivelou seu cinto com cuidado e só depois largou com seu Ford GT40, em último. Infelizmente, o protesto de Ickx foi percebido de forma cruel ainda na primeira volta, quando o piloto privado John Woolfe bateu seu Porsche na Maison Blanche e acabou falecendo, pois não tinha colocado seu cinto de segurança de forma correta. Willy Mairresse, piloto da Ferrari, também sofreria um acidente em circunstâncias parecidas e teria encerrada sua carreira por causa disso. Após um atraso de duas horas a corrida foi reiniciada e os novos Porsche 917 dispararam na frente, mas a falta de confiabilidade fez com que os carros alemães caíssem um a um. No final da corrida, a vitória estava sendo disputada entre o Porsche 908 de Hans Herrmann/Gerard Larrouse e o Ford GT40 de Ickx/Oliver. Na hora final, o Porsche tem problemas de freios e tem que ir aos boxes, entregando a liderança a Ford, que era dirigido então por Ickx. Nas mãos do veterano Hans Herrmann, o Porsche 908 começou a tirar a diferença para o Ford. Faltando poucos minutos de uma corrida de 24h, os dois carros estavam colados e trocavam de posição como se estivessem numa corrida de 30 minutos. O Porsche 908 era bem mais rápido nas longas retas de Sarthe, enquanto o Ford era mais forte nas seções mais travadas. Mesmo bem mais jovem que Herrmann, Ickx foi catimbeiro na volta final, chegando a irritar o alemão, e conquistou sua primeira vitória em Le Mans por apenas 100 metros, até hoje a menor diferença entre o 1º e o 2º colocado na corrida francesa entre equipes diferentes. Ickx não apenas vencia uma corrida épica, como mudava a regra da largada em Le Mans, a partir de 1970. Porém, Ickx tinha que pensar em seu futuro na F1 e ele não podia ser apenas um segundo piloto da Brabham e por isso voltou a Ferrari para 1970, tendo que abandonar a equipe John Wyer e seus belos carros azuis com patrocínio da Gulf.
Contudo, a temporada de Ickx na F1 começou de forma complicada, inclusive com um terrível acidente no Grande Prêmio da Espanha, quando Jacky teve sua Ferrari atingida por outro carro e tendo seu F1 pegando fogo. Após 20s tentando deixar seu carro em chamas, Ickx foi internado com queimaduras graves, mas após 17 dias ele estava de volta ao seu cockpit no Grande Prêmio de Mônaco para conquistar um ótimo 2º lugar. O carro da Ferrari melhorava e no Grande Prêmio da Alemanha, em Hockenheim, Ickx terminaria em 2º, colado no vencedor e dominador daquela temporada Jochen Rindt. Mostrando o quanto a Ferrari tinha evoluído, Ickx venceria o Grande Prêmio da Áustria. Depois do falecimento de Piers Courage em Zandvoort, a morte que voltaria a chocar a F1 apenas três semanas mais tarde com a morte de Rindt nos treinos para o Grande Prêmio da Itália. Ickx se torna o único piloto com chances de tirar o título de Rindt, que já tinha cinco vitórias até então, mas em Monza quem venceu foi o novo piloto da Ferrari Clay Regazzoni. Ainda tentando conquistar o título, Ickx vence no Canadá, mas no GP dos Estados Unidos, Emerson Fittipaldi conquista a primeira vitória brasileira e garante, matematicamente, o título para Rindt, mesmo com Ickx tendo vencido a corrida seguinte no México. Era o segundo vice-campeonato seguido do belga. Após três anos na equipe de John Wyer, Ickx teria que os vencer a partir de agora com a Ferrari, mas Wyer já tinha um contrato com a Porsche e praticamente dominou tanto em Le Mans, como o Mundial de Esporte-Protótipo.
Com um ótimo final de campeonato, Ickx era o principal favorito para 1971, mas a Ferrari é superada por Lotus e, principalmente, Tyrrell. Stewart esmaga a concorrência como poucas vezes vista e Ickx só venceria uma corrida em Zandvoort, não por coincidência na chuva. A Ferrari ainda se concentrava em duas frentes durante a temporada e sempre começava o ano pensando primeiramente no Mundial de Esporte-Protótipo, algo que já tinha feito John Surtees abandonar a equipe no final de 1966. Para piorar, em 1971 a Ferrari tem um ano ainda pior no Mundial de Esporte-Protótipo, com vários abandonos e apenas um 2º lugar com Ickx em Brands Hatch. Para 1972, Ickx fica mais um ano na Ferrari e após dois 2º lugares na Espanha e em Mônaco, a Ferrari entrou em um espiral de abandonos, até que Ickx chega a Nurburgring e com sua velha classe, consegue não apenas a vitória, como também a pole e a melhor volta. O que ninguém sabia era que esta seria a última vitória de Ickx na F1. Em compensação, Ickx esmaga a oposição no Mundial de Esporte-Protótipo e conquista o campeonato com seis vitórias, ao lado de pilotos como Andretti, Regazzoni e Redman. Porém, 1973 seria um verdadeiro desastre para Ickx. Na F1, a Ferrari produz o modelo 312B3, que de tão ruim, teve que ser reconstruído no meio da temporada, ainda com péssimos resultados. Após Ickx conquistar um 19º lugar no grid no GP da Inglaterra, a Ferrari resolve não participar do GP da Alemanha, em Nürburgring, a corrida favorita de Ickx. O belga não gosta nem um pouco da idéia e simplesmente agradece a Enzo Ferrari seus anos na equipe e abandona a Ferrari no meio do ano. No Mundial de Esporte-Protótipo, Ickx ainda vence em Monza e Nürburgring antes de sair da Ferrari, mas aquele ano tinha sido dominado pela Matra de Henri Pescarolo e Gérard Larrousse.
Jacky Ickx ainda era considerado um dos grandes pilotos da F1 e ainda era jovem para a média geral (29 anos). Por isso, ele foi o escolhido pela Lotus para substituir Emerson Fittipaldi, que tinha ido para a McLaren em 1974. A equipe estava usando o modelo 72 desde 1970 e produz o Lotus 76, que não estava a altura do antecessor. Para piorar, Ickx encontra em Ronnie Peterson um piloto difícil de bater e suas constantes derrotas nas Classificações fazem com que a imprensa começasse a criticar o belga. O modelo 76 fracassa de forma retumbante e a Lotus volta a usar o mítico Lotus 72, em sua quinta temporada seguida, e com ele Peterson consegue três vitórias, enquanto Ickx só consegue três 3º lugares, mas o belga ainda voltaria a se destacar na Corrida dos Campeões, uma prova de F1 fora do campeonato realizado em Brands Hatch, onde o belga venceu debaixo de muita chuva e após uma ultrapassagem por fora, na Paddock Bend, sobre a Ferrari de Niki Lauda. Em 1975 a Lotus insiste no modelo 76 e a segunda tentativa se torna um desastre, com a equipe voltando a usar o Lotus 72E, já em sua sexta temporada e bastante defasado em relação as demais equipes. Para piorar, Peterson continuava a derrotar Ickx nos treinos e o belga resolve abandonar a Lotus no meio da temporada. Isto seria praticamente o fim da carreira na F1 para Ickx. Porém, nas corridas de Endurance a vida de Jacky estava ótima. Ickx faz uma volta a equipe de John Wyer e vence as 24 Horas de Le Mans de 1975 ao lado do inglês Derek Bell.
Mesmo com apenas 31 anos de idade, todos na F1 davam Ickx como morto, mas o belga ainda insiste na categoria, agora assinando com a equipe Williams, na época considerada um time mambembe. Dos tempos de glória, quando estava acostumado com as vitórias e a posição de favorito, Ickx agora teria que se conformar com a triste situação de eterno retardatário em uma equipe pequena e com carro ruim. Após oito corridas, o belga se transfere para a equipe Ensign, mas seus resultados não melhoram e Ickx ainda sofre um sério acidente em Watkins Glen. Jacky reflete sua situação na carreira e resolve abandonar a F1 e se dedicar unicamente ao Mundial de Esporte-Protótipo. A essa altura Ickx já tinha assinado como piloto oficial da Porsche e com ela tinha conseguido o título mundial de Esporte-Protótipo de 1976 com sete vitórias em dez corridas, além da sua terceira vitória em Le Mans, ao lado do holandês Gijs van Lennep. Em 1977, Ickx consegue aquela que seria sua melhor vitória em Le Mans. Correndo ao lado de Henri Pescarolo, Ickx tem problemas logo no início da corrida e então a Porsche o colocou no carro de Jürgen Barth e Hurley Haywood, que no momento estava em 42º lugar. Usando sua experiência e velocidade, Ickx empreendeu uma espetacular corrida de recuperação e na manhã de domingo liderava a prova, mas então seu Porsche tem problemas de motor. Para continuar na corrida, a equipe alemã desliga um cilindro e coloca Ickx no volante para ele levar o carro até o fim, algo que o belga conseguiria com maestria. Como era comum na época, Ickx participa de outras categorias e vence provas importantes em 1977, como a tradicional Bathurst 1000, realizada na Austrália. Jacky ainda voltaria a F1 em 1977, substituindo Clay Regazzoni na equipe Ensign no Grande Prêmio de Mônaco e isso faz com que Ickx desista de sua aposentadoria da F1 e assina com a equipe para 1978, mas após quatro corridas sem resultados competitivos, Ickx abandona a equipe, só retornando à F1 em 1979, substituindo Patrick Depailler na equipe Ligier, quando o francês sofre um acidente de asa delta e tem que se afastar por seis meses das pistas. Amplamente batido por Jacques Laffite nos treinos, Ickx usa sua experiência para conseguir um 6º lugar no GP da Inglaterra, um 5º lugar na Holanda e um último show. Sob pista molhada, Ickx mostra sua velha maestria com uma atuação destacada em Montreal, fazendo várias ultrapassagens deslizando na pista úmida até abandonar com problemas de câmbio. Em Watkins Glen, na corrida seguinte, Jacky Ickx faria sua última corrida na F1. Foram 114 Grandes Prêmios, oito vitórias, treze poles, quatorze melhores voltas, 25 pódios, 181 pontos ganhos e dois vice-campeonatos (1969 e 1970).
Ickx chegou a anunciar que estava abandonando o automobilismo e passou o ano de 1980 administrando a reforma em Spa para que a pista belga recebesse novamente a F1, mas um convite para correr em Le Mans com uma equipe particular da Porsche e, principalmente, um resultado surpreendente fez com Ickx revogasse sua aposentadoria e ele é contratado pela Porsche para correr com o modelo 956. Foi com esse carro e tendo ao lado o velho parceiro Derek Bell que Ickx venceu em Le Mans pela quinta vez em 1981. O belga se tornara uma lenda na corrida francesa, mas Ickx ainda precisava de novos desafios e em 1981 fez sua estréia no Rally Paris-Dakar com um Citröen CX. Em 1982, agora patrocinado pela Rothmans, a Porsche dominou inteiramente o Mundial de Esporte Protótipo e as 24 Horas de Le Mans, com a montadora alemã conquistando os três primeiros lugares tanto na Classificação final do Mundial, como em Le Mans, com Ickx conseguindo sua sexta e última vitória em Sarthe, ao lado de Derek Bell. O ano de 1983 começa de forma vitoriosa para Ickx, ao vencer o Paris-Dakar com uma Mercedes 280GE, tendo como navegador Claude Brasseur, após vencer cinco especiais. Porém, no Mundial de Esporte-Protótipo, o belga teve um pouco mais de trabalho. A dominação da Porsche chegou a ser humilhante frente aos seus adversários. Foram nove vitórias em dez corridas no Mundial de Esporte-Protótipo e nove carros alemães, contando as equipes particulares, nas dez primeiras posições em Le Mans, mas desta vez quem venceu foi o trio Vern Schuppan/Hurley Haywood/Al Hobert, com a dupla Ickx/Bell ficando em segundo lugar. Porém, o maior problema de Ickx era outro. Internamente, Ickx era a principal figura da equipe Porsche, mas com a chegada do jovem e atrevido Stefan Bellof, aos poucos as atenções da equipe se voltaram para Bellof, que além de espetacular, era alemão, causando ciúmes em Ickx. Conta a lenda que essa ciumeira de Ickx foi uma causas da saída de Bellof da equipe oficial da Porsche em 1984, mas Ickx e Bellof ainda se encontrariam de forma decisiva em duas oportunidades.
A primeira seria no Grande Prêmio de Mônaco de 1984 de F1, quando Ickx era o diretor de prova daquela corrida, que começou debaixo de muita chuva, ironicamente, as condições preferidas de Ickx. Prost liderava a corrida tranquilamente, quando a chuva apertou de vez quando a prova se aproximou dos 30 minutos. Prost estava com problemas de freios e via com apreensão a aproximação de Senna, mas Bellof, que tinha largado em último, andava 1s mais rápido do que Senna e se aproximava dos dois. Sem consultar nenhum comissário de prova, Ickx interrompeu a corrida na volta 31, dando a vitória para Prost e deixando Senna e Bellof bastante irritados. Não faltaram insinuações de que tudo aquilo se tratava de negócios, pois Ickx era piloto da Porsche e Prost corria com um motor Porsche, mas nada pode ser provado e o máximo o que aconteceu foi que Ickx sofreu uma punição por não ter pedido a opinião de ninguém para interromper a corrida. Com uma quebra no Paris-Dakar de 1985, Ickx vinha fazendo uma boa temporada no Mundial de Esporte-Protótipo pela Rothmans Porsche e ao lado de Jochen Mass, brigava com seus companheiros de equipe Hans-Joachim Stuck/Derek Bell pelo título mundial e cada dupla tinha três vitórias quando chegaram a Spa para a disputa da tradicional corrida de 1000 km. Stefan Bellof já era considerado a grande revelação da F1 no momento e tinha praticamente tudo certo com a Ferrari para 1986, mas ele ainda fazia corridas eventuais pelo Mundial de Esporte-Protótipo e correndo com um Porsche 956 da equipe de Walter Brun, o alemão faria parte da corrida em Spa. Ickx liderava a corrida, mas Bellof fazia uma bela corrida de recuperação e se aproximava do belga. Os começaram uma emocionante briga pela ponta, com Bellof querendo vingança sobre Ickx pelos anos em que ficaram juntos na equipe oficial da Porsche. Bellof tentou uma ultrapassagem espetacular e otimista sobre Ickx na entrada da Eau Rouge e os dois se tocam. Ickx roda e bate com força no guard-rail, mas Bellof bate violentamente de frente e acaba morrendo. Ickx fica arrasado e no final de 1985 ele encerra sua carreira no Mundial de Esporte-Protótipo.
Ickx passa a se dedicar unicamente aos ralis, principalmente o Paris-Dakar. Correndo pela Porsche, Ickx consegue alguns bons resultados até se transferir para a soviética Lada em 1988. Uma escolha exótica, que acabou dando poucos resultados ao belga, mas Ickx volta ao topo quando se junta a Peugeot em 1989. E também as polêmicas. A principal rival da Peugeot era a Mitsubishi e quando os carros da marca japonesa abandonam, o chefe de equipe Jean Todt chama Ickx e Ari Vatanen num canto e explica sua ‘estratégia’. Querendo fazer um rally tranqüilo até o final, o francês promove um cara-ou-coroa para decidir quem venceria o Paris-Dakar daquele ano. A moeda cai no lado de Vatanen e Ickx fica extremamente irritado com a presepada, chegando a parar seu carro de propósito em algumas especiais para que Vatanen passasse a frente e o finlandês acabou vencendo o Paris-Dakar daquele ano. Vinte anos depois, Todt e Vatanen disputariam a presidência da FIA... Em 1990 Ickx venceria a única especial da história do Lada Niva no Paris-Dakar e um incêndio com seu Citröen, impediu que o belga conquistasse sua segunda vitória em terras africanas em 1991. No Rally dos Faraós de 1992, Ickx sofre um acidente com seu Peugeot 405 e o carro pega fogo. O belga sai ileso do acidente, mas seu navegador Christian Tarin, que fazia anos trabalhava com Jacky, morreria carbonizado. Testemunhando outra morte de perto, Ickx abandonou definitivamente as corridas no final de 1992, aos 47 anos de idade.
Piloto apaixonado, Jacky Ickx não se divorciou por completo do automobilismo, atuando em corridas promocionais e voltando a ser diretor de prova em Mônaco. Aos 55 anos, Ickx voltou ao Paris-Dakar ao lado de sua filha Vanina, em 2000, terminando em 18º com um Toyota Land Cruiser. Por sinal, Vanina Ickx se tornou uma piloto bem sucedida, principalmente na categoria turismo, onde atuou no DTM e corridas de endurance, como em Le Mans e Spa (além de ser uma gata!). Também em 2000, Jacky Ickx se tornou Cidadão honorário de Le Mans pelos seus feitos na pista francesa e em 2005 ele teve seu recorde de vitórias na pista francesa quebrado por Tom Kristensen. Hoje vivendo em Bruxelas, Ickx continua sendo reverenciado pelo seu estilo de pilotagem e pela coragem demonstrada nas pistas. Uma pessoa apaixonada pelas corridas, Ickx adorava desafios e por causa disso ele foi um ídolo em várias categorias, sendo um multi-campeão no Mundial de Esporte-Protótipo, se tornando uma lenda na Ferrari, mesmo não sendo campeão na F1, e uma figura mítica em Le Mans. Extremamente respeitado entre seus pares, não importando a época, Jacky Ickx podia vencer em qualquer tipo de pista, tempo ou distância. Provando isso, as palavras finais ficam para o dinamarquês Tom Kristensen. “Eu posso ter mais vitórias do que Ickx, mas ele é absolutamente único, uma grande personalidade, o Mister Le Mans.”
Parabéns!
Jacky Ickx
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