Muitos pilotos são reconhecidamente rápidos e vencedores, mas suas maiores glórias estiveram longe do circo da F1. Mesmo tendo boas oportunidades na categoria máxima do automobilismo mundial, certos pilotos conseguem o ápice de suas carreiras em outras categorias ou corridas menos importantes. Esse foi o caso de Henri Pescarolo. Esse francês de cara barbada e meio calvo não teve uma carreira triunfante na F1, mas fora dela imortalizou seu nome na famosa corrida de 24 horas de Le Mans e também no Rally Paris-Dakar. Na véspera de completar 65 anos de idade, vamos olhar a carreira do atual dono da equipe Pescarolo Sports.
Henri-Jacques William Pescarolo nasceu no dia 25 de Setembro de 1942 em Paris e era filho de um cirurgião francês. Henri pretendia seguir a carreira do pai, mas quando já estava no terceiro ano de faculdade de medicina a vida de Pescarolo muda radicalmente. Em 1962 o pai de Henri é convidado para participar de um Rally amador reservado só para médicos e já sabendo do gosto pela velocidade do filho, o papai Pescarolo se inscreve no rally e divide o volante com seu filho. Mesmo sofrendo um acidente em sua primeira tentativa no automobilismo ao lado do pai, Henri Pescarolo fica ainda entusiasmado pelas corridas e logo depois se matricula numa escola de pilotagem da AGACI (Associação de pilotos de carros independentes) no circuito de Montlhéry e logo se torna um dos alunos mais brilhantes.
Em 1964 a revista francesa Sport Auto promove uma competição com vários pilotos amadores franceses munidos de Lotus Sevens. O intuito desse campeonato criado por Jean Lucas e o veterano Gérard Crombac era descobrir novos talentos franceses para o automobilismo. Mais de dez mil pilotos se inscrevem inicialmente, até que apenas 19 pilotos sobram para a fase final, com Pescorolo sendo o representante da região de Paris. A competição era acirrada e vários pilotos que despontariam mais tarde para o automobilismo mundial estavam competindo como Johnny Servoz-Gavin (Savoie), José Dolhem, Patrick Depailler(Auvergne) e Jimmy Mieusset(Lyon). Por ironia do destino, o único piloto que não atingiu a F1 no futuro, Mieusset, foi o vencedor da competição, mas Pescarolo tinha chamado a atenção, vencendo a primeira etapa em Montlhéry e ganhando um título simbólico de melhor piloto em subida de montanha.
Pescarolo tem seu talento reconhecido e é contratado pela Matra ainda em 1965 para disputar a F3. A empresa de tecnologia francesa Matra tinha o claro objetivo de chegar à F1 e para isso trouxe algumas promessas francesas, como os também velozez Jean-Pierre Beltoise, Jean-Pierre Jassaud e Eric Offenstadt. No ano seguinte a Matra sobe para a F2 levando consigo Beltoise e assim Pescarolo se torna o primeiro piloto da equipe Matra de F3, mas o título acaba ficando para com o companheiro de equipe Johnny Servoz-Gavin. Apesar da decepção, Pescarolo se recupera e vence o campeonato francês de F3 em 1967 com o recorde de onze vitórias na temporada. Ainda nesse ano, Pescarolo faz algumas corridas pela equipe Matra na F2 ao lado de Beltoise.
Em 1968 a Matra domina a F2 e Beltoise vence o campenato francês e europeu da categoria com Pescarolo ficando como vice-campeão em ambos os campeonatos. Pescarolo faz sua estréia na F1 no Grande Prêmio do Canadá de 1968 na equipe Matra e abandona a corrida com problemas de pressão de óleo. Porém, Pescarolo começa a conquistar o coração dos franceses em seu habitat natural: Le Mans. No ano em que estréia na F1, Pescarolo participa de sua terceira edição na clássica corrida ao volante do Matra 630B ao lado de Servoz-Gavin e quando o seu jovem companheiro de equipe tem um problema no pára-brisa na chuvosa madrugada francesa, Pescarolo entra no carro mesmo sem pára-brisa, com pouca visibilidade e desobedencendo o chefe da equipe, que anunciara o abandono do carro pouco antes. E Pescarolo coloca o carro na segunda posição pela manhã! Faltando duas horas para o fim da corrida, um pneu explode e finalmente Pescarolo abandona.
Quando sua carreira estava deslanchando, Henri Pescarolo recebe um grande baque em abril de 1969. Líder do campeonato de F2, Pescarolo sofre um sério acidente nos treinos preparatórios da 24 horas de Le Mans. O Matra 640 tem um problema aerodinâmico na reta Hunaudièreses e o carro é jogado contra as árvores. Pescarolo tem seu rosto muito queimado e fratura duas vértebras. Milagrosamente Pescarolo consegue participar da edição de 1969 das 24 Horas de Le Mans, mas perde o campeonato de F2 para sua asa negra Johnny Servoz-Gavin. Já totalmente recuperado do seu acidente, Pescarolo se junta a Beltoise na equipe de F1 da Matra em 1970. Logo na terceira corrida daquela temporada, Pescarolo consegue seu primeiro e único pódio em Mônaco, com um terceiro lugar. Mesmo com esse bom resultado e ter sido escolhido como o melhor piloto francês de 1970, Pescarolo é demitido da equipe Matra e é substituído por Chris Amon na F1.
Desapontado com a Matra, Pescarolo também sai da equipe francesa no Mundial de Esporte-Protótipos e vai para a equipe Esparto Romeo, com um protótipo da Alfa Romeo, onde vence o tradicional 1000 km de Brands Hatch ao lado de Andrea de Adamich. Na F1, Pescarolo é contratado pela pequena equipe chefiada por Frank Williams para dirigir Marchs alugados. Os resultados são péssimos e Pescarolo tem de ser acostumar a fechar o grid na maioria das vezes, mas o francês consegue um resultado de sonho ao ser quarto colocado no Grande Prêmio da Inglaterra em Silverstone e ainda consegue a melhor volta no Grande Prêmio da Itália, que seria por muitos anos a média horária mais rápido da história da F1. Pescarolo continua com Frank Williams em 1972, mas os resultados continuam péssimos e o francês abandona a equipe no final do ano, mesmo tendo estreado um carro fabricado por Frank no GP da Inglaterra desse ano.
Pescarolo não renova com a equipe Esparto Romeo, mas é lembrado pela Matra para disputar as 24 Horas de Le Mans de 1972 ao lado do veteraníssimo Graham Hill. A equipe Matra tinha na época o melhor carro de endurance do mundo e a dupla Pescarolo-Hill teve que enfrentar a outra dupla da equipe francesa, com François Cevert e Howden Ganley ao volante. Pescarolo e Hill vencem seus companheiro de equipe mais jovens e ganham pela primeira vez as 24 Horas de Le Mans, dando a Hill o recorde até hoje não quebrado de ser o único piloto até hoje a ter vencido em Mônaco, Indianápolis e Le Mans. Pescarolo ainda teve tempo para correr pela equipe Rondel de F2 em 1972 para ajudar seu amigo (e iniciante no negócio) Ron Dennis e o francês vence uma corrida em Enna-Pergusa.
Sem equipe na F1, Pescarolo se concentra unicamente no Mundial de Esporte-Protótipo em 1973 pela equipe Matra, que o tinha contratado de volta. Pescarolo vence as 6 horas de Vallelunga e os 1000 km de Dijon antes de enfrentar as Ferraris na 24 Horas de Le Mans. A equipe italiana colocou quatro carros na pista para ter o título da tradicional corrida francesa de volta, mas Pescarolo, ao lado de Gérard Larrousse, acabou com o sonho ferrarista ao derrotar os carros vermelhos da dupla Jacky Ickx e Brian Redman. Pescarolo ainda venceria os 1000 km de Zeltweg e as 6 horas de Watkins Glen, se tornando campeão mundial de Esporte-Protótipo. Pescarolo também correu pela equipe de Ron Dennis de F2 e venceu em Thruxton. A equipe March de F1 chama Pescarolo para disputar o Grande Prêmio da Espanha de 1973 no lugar de Jean-Pierre Jarier, mas não faz nada demais.
Porém isso o suficiente para que Pescarolo fosse contratado pela BRM para disputar a temporada de 1974 de F1. Contudo, a tradicional equipe inglesa estava com problemas financeiros e a nona posição de Pescarolo no Grande Prêmio da Argentina foi o melhor resultado do francês. Foi praticamente o fim da sua carreira na F1. Pescarolo continua como piloto contratado da Matra no Mundial de Esporte-Protótipo e ao lado de Larrousse vence em Spa, Zeltweg e Watkins Glen e a cereja do bolo foi o tricampeonato consecutivo nas 24 Horas de Le Mans. Em 1975 Pescarolo sai da Matra e volta para a equipe Esparto Romeo, agora com carros da Porsche, e vence novamente em Spa, Zeltweg e Watkins Glen. Pescarolo é chamado para correr em Le Mans pela equipe Ligier, mas abandona desta vez.
Em 1976 Pescarolo tenta fazer uma volta à F1 com Surtees alugados, mas o francês não faz nada demais e abandona definitivamente a categoria máximo do automobilismo no final do ano com apenas 56 corridas no currículo. Pescarolo recusa uma proposta da Porsche para correr em Le Mans e isso seria seria bastante ruim para o francês, que vê a equipe alemã vencer com Ickx por três anos seguidos, enquanto Pescarolo não faz nada demais. No início dos anos 80 Pescarolo começa a se dedicar aos rallys e bate um recorde inusitado em 1984: ter cruzado em menor tempo o atlântico à bordo de um avião monomotor. Ainda em 1984 ele volta à Sarthe para um triunfo final. Ao lado de Klaus Ludwig, Pescarolo vence pela quarta vez as 24 Horas de Le Mans à bordo, quem diria, de um Porsche da equipe Joest. Pescarolo se anima com a vitória e volta ao Mundial de Esporte-Protótipo, mas sem o mesmo sucesso de antes, apesar de correr em equipes como Lancia e Mercedes-Sauber.
Em 1988 Pescarolo teve uma ótima chance de vencer as 24 Horas de Le Mans ao ser inscrito pela Jaguar ao lado de Raul Boesel e John Watson, mas o carro quebra durante a madrugada. Porém, foi nesse ano que Pescarolo chegou à Dakar pela primeira vez no Rally Paris-Dakar com um Peugeot 405 Turbo oficial de fábrica. Em 1994, após anos sem ser notado, Pescarolo consegue a pole das 24 horas de Le Mans com um Courage Cougar, mas o trio formado por ele, Frank Lagorce e Alain Ferté abandona ainda de madrugada. No ano seguinte, Pescarolo foi convidado pela Elf para fazer parte de um programa de revelação de novos pilotos e graças a esse programa, pilotos como Sebastien Bourdais e Franck Montagny puderam ter a mesma oportunidade que Pescarolo teve no final do anos 60.
Henri Pescarolo permaneceu na equipe Courage até 1999, quando disputou pela última vez as 24 Horas de Le Mans. Foi a trigésima terceira participação de Pescarolo e até hoje é o recorde de participação de um mesmo piloto na tradicional corrida. No ano 2000, Pescarolo forma a equipe Pescarolo Sport para disputar as 24 Horas de Le Mans e corridas de Endurance pelo mundo. No início a equipe usava chassis cedidos pela Courage, mas desde 2004 a equipe desenvolve o próprio chassi com motor Judd com várias vitórias no campeonato da Le Mans Series e com ótimas participações nas 24 Horas de Le Mans. Enfrentando gigantes como Audi e Peugeot, a equipe de Pescarolo é a única que equipe particular a brigar de igual para igual com as grandes montadoras e isso deve orgulhar bastante Pescarolo, mas com certeza Henri Pescarolo deve se lembrar com mais saudades das incríveis batalhas contra Ferrari e Porsche no início dos anos 70 com seu Matra e o incrível tricampeonato que colocou seu nome definitivamente entre os nomes imortais do automobilismo.
Parabéns Henri Pescarolo!
Excelente matéria sobre o Pescarolo. Cinco estrelas!
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