Alguns anos atrás, o Grande Prêmio da Hungria era praticamente um caso perdido. O circuito estreito e lento não proporcionava ultrapassagens e o clima, que poderia salvar a prova, sempre nos presenteava com um belo dia de sol e calor muito forte no domingo à tarde. Porém, de uns anos para cá, não sei se devido ao aumento da temperatura global, Budapeste está presenciando cada vez mais corridas de F1 com chuva, para alegria dos fãs, que ao invés de se desanimarem com uma corrida modorrenta, como as que ocorrem no circuito de Hungaroring com tempo seco, cada vez mais vêem corridas espetaculares como a de hoje, onde a estratégia e o timing foram essenciais para garantir o sucesso ou o fracasso na prova de hoje. Entre vitoriosos e perdedores, os três ocupantes do pódio não tem muito do que reclamar, enquanto os três primeiros da classificação de ontem tem muito o que lamentar pela corrida de hoje.
A chuva se fez presente com força minutos antes da largada, deixando a pista encharcada, mas como se tratou de uma famosa pancada de chuva, ela foi embora rapidinho e deixou apenas perguntas para os pilotos e engenheiros: com qual pneu largar? Mesmo a pista bastante molhada em alguns pontos, todos os 22 pilotos, incluindo os que saíram dos boxes, largaram com pneus intermediários. Hamilton dava o tom do que seria a corrida ao rodar ainda na segunda curva, mas sem maiores danos no seu Mercedes, que rapidamente começou a ultrapassar quem vinha pela frente, enquanto lá na frente Nico Rosberg abria uma diferença absurda para Valtteri Bottas e Sebastian Vettel, que duelavam pelo segundo lugar. O alemão da Mercedes chegava a abrir de um a um segundo e meio para os demais. Porém, não demorou para que safety-car aparecesse num forte acidente de Marcus Ericsson e mudasse dramaticamente a face da corrida e as consequências no final foram nítidas. Quando Ericsson bateu com muita força seu Caterham na saída da curva 3, pilotos e equipes discutiam se já não estava na hora de colocar pneus slicks. Quando o safety-car foi à pista, os quatro primeiros (Rosberg, Bottas, Vettel e Alonso) já tinham passado da entrada dos boxes. O quinto colocado Button entrou nos boxes, mas teve um pit longo e, arriscando tudo, colocou outro jogo de pneus intermediários, enquanto Ricciardo era o primeiro a ter pneus slicks macios de todo o pelotão. Os quatro primeiros foram aos pits na volta seguinte e então começou todo o jogo de estratégia que marcaria o Grande Prêmio da Hungria de 2014.
Na relargada Button ultrapassou Ricciardo, enquanto Magnussen, que havia largado dos boxes e tinha ficado na pista, segurava um enorme pelotão, que era liderado surpreendentemente pela Toro Rosso de Jean-Eric Vergne. Porém, a dupla da McLaren não durou muitas voltas com pneus intermediários e foram aos pits buscar pneus slicks, entregando a liderança para Ricciardo, com Felipe Massa em segundo. Porém, demonstrando o quão perigosa estava a corrida, Pérez bateu muito forte na saída da última curva, trazendo novamente o safety-car e Vettel escapou, como se diz por aqui, fedendo ao rodar no mesmo local e o maior estrago que teve no seu carros foram seus pneus literalmente lixados. Então, Ricciardo deu outro golpe decisivo ao entrar nos pits durante o último safety-car e novamente colocar pneus macios. Com mais da metade da prova ainda por se realizar, o australiano claramente ainda teria que fazer uma troca de pneus, mas Daniel estava logo atrás dos líderes, que tiveram que fazer suas paradas e o piloto da Red Bull subiu novamente para a liderança, onde chegou abrir 17s para o piloto mais próximo. Quando fez sua parada final faltando quinze voltas, Ricciardo estava colado em Hamilton e Alonso, cada um sofrendo com seus pneus de forma diferente. Se Hamilton tinha um jogo de pneus médios usados, Alonso tinha um jogo de pneus macios mais usados ainda. Porém, Ricciardo vivia o drama de uma possível chuva que poderia vir, ou da aproximação vertiginosa de Nico Rosberg, com pneus macios novos, mais atrás. Com os três primeiros colados, mas com o terceiro carro melhor equipado, Ricciardo foi para o ataque em cima de Hamilton (numa bela manobra por fora da curva 2) e de Alonso e assumiu a liderança faltando três voltas e voltar a exibir o seu já famoso sorriso na primeira posição. Ninguém, em sã consciência, poderia imaginar Daniel Ricciardo fazendo a temporada que está fazendo quando o australiano foi anunciado pela Red Bull para substituir o aposentado Mark Webber, dominando seu conceituado companheiro de equipe Vettel e sendo o único piloto capaz de impedir uma temporada invicta da Mercedes, já que o time alemão tem potencial para isso. Enquanto Ricciardo vencia a corrida e assumia, finalmente, o terceiro lugar no campeonato com inteira justiça, após sua segunda vitória em 2014 e na carreira, Sebastian Vettel fez uma corrida anônima após sua espetacular rodada no meio da corrida e o alemão teve que se conformar com um sétimo lugar, tendo que sustentar-se dos ataques de Valtteri Bottas no final. E lembrar que os dois brigavam pelo segundo lugar no começo da corrida. E lembrar também que Vettel está quase 50 pontos atrás de Ricciardo no campeonato...
Fernando Alonso parecia um pouco desconsolado no pódio. Mesmo com uma corrida estupenda do espanhol, o espírito competitivo de Alonso esperava por uma vitória hoje, mesmo tendo que enfrentar um sem número de adversidades para fazê-lo. O que Alonso fez hoje é para se recordar daqui a alguns anos, pois o piloto da Ferrari levou seu problemático carro não apenas ao pódio, como ainda segurou duas Mercedes nas últimas voltas com os pneus em frangalhos. A arriscada estratégia de Alonso, de ficar na pista mesmo com pneus macios além de sua capacidade mostrou um Alonso querendo fazer algo mais do que é possível normalmente de sua Ferrari e mesmo não ficando com a vitória, Alonso tem muito do que se orgulhar de sua prova. Talvez querendo mostrar algum serviço, Raikkonen fez uma boa corrida e saindo da décima sexta posição, o finlandês da Ferrari terminou em sexto, após pressionar por várias voltas seu antecessor na Ferrari, Felipe Massa. Outro personagem importante do dia foi Lewis Hamilton. O inglês ficou tão magoado com os problemas que vem enfrentando, que sequer participou da quase obrigatória reunião pós-classificação. Chegando mais cedo ao hotel, provavelmente Hamilton nunca imaginou chegar à frente de Rosberg, ficando o campeonato cada vez mais inalcançável para ele, com Rosberg provavelmente conseguindo outra vitória e abrindo cada vez mais.
Contudo, Hamilton fez outra corrida espetacular de recuperação quando a pista ainda molhada permitiu ultrapassagens na pista e se colocou muito bem frente ao seu companheiro de equipe Nico Rosberg. Na primeira relargada, Hamilton tinha apenas um carro entre ele e Rosberg, enquanto que na segunda, Lewis já estava na frente. Porém, assim como Alonso, Hamilton não parecia muito feliz no pódio. Novamente o clima dentro da Mercedes deverá esquentar. Durante a corrida, com Hamilton com pneus médios e Rosberg com pneus macios, a Mercedes solicitou mais de uma vez para que Hamilton cedesse a posição para Nico. Porém, em nenhum momento Rosberg se aproximou para tentar a ultrapassagem, provavelmente esperando que Lewis fosse um gentleman e abrisse a porta com tapete vermelho para que Rosberg passasse. Nico reclamou mais de uma vez também. Se isso atrapalhou ou não o ritmo de Rosberg, o fato foi que o alemão ficou de fora do pódio pela primeira vez no ano e numa disputa na última volta, Hamilton deu uma bela fechada no companheiro (?) de equipe. Provavelmente se tivesse passado Hamilton naquele momento, Rosberg teria ritmo para brigar pela primeira posição mais na frente, mas Lewis está brigando pelo campeonato com Rosberg e se o inglês puder prejudicar, mesmo que indiretamente, seu rival pelo título, Lewis tem todo o direito de fazê-lo e um fim de semana que parecia perdido, Hamilton conseguiu diminuir sua desvantagem no campeonato. Porém, como será o clima dentro da Mercedes depois de mais esse incidente entre os pilotos, só as férias poderão nos responder.
A Williams teve sua boa fase interrompida, assim como também a fase de azares de Felipe Massa. Conservador ao extremo na largada, Massa chegou a perder posições, mas ao menos conseguiu contornar a primeira curva normalmente, mas via Bottas assumir o segundo posto e provavelmente assumir também um papel mais importante dentro da equipe durante a temporada, mas o destino e o primeiro safety-car não quis assim, com Bottas ficando atrás de Felipe a corrida inteira. Porém, a Williams cometeu outra gafe estratégica ao colocar pneus médios no meio da prova, dando uma indicação de que não pararia mais, quando isso seria praticamente impossível. Tanto Massa como Bottas tiveram que parar de qualquer maneira, mas no caso do brasileiro o erro foi mantido, quando Felipe teve que lhe dar com Raikkonen melhor calçado, já que Massa voltou a colocar pneus médios, quando a lógica dizia o contrário. Para piorar, a boa corrida da Ferrari fez com que a Williams voltasse ao quarto lugar no Mundial de Construtores, enquanto que a vitória de Ricciardo deixou a Red Bull ainda mais longe na segunda posição. Com erros assim, será difícil a Williams reter seu lugar (segunda força) de direito. Jean-Eric Vergne fez sua melhor corrida de sua carreira na F1 e chegou a ocupar a segunda posição da prova, segurando por várias voltas e sem muito esforço a Mercedes de Nico Rosberg. Quando a corrida assentou, o francês foi perdendo rendimento e ele acabou apenas em nono, mas apesar de já ter conseguido posições melhores, Vergne deu seu recado na prova de hoje, enquanto Kvyat teve uma corrida problemática, começando por ter deixado o motor morrer na volta de apresentação e abandonando anonimamente.
A McLaren tentou dar o bote quando deixou Button e Magnussen com pneus intermediários durante o primeiro safety-car, mas a esperada chuva não apareceu mais e os carros prateados ficaram para trás, com Button ainda fechando a zona de pontuação, tirando sua invencibilidade na Hungria com chuva, já que Button venceu as duas únicas provas com piso molhado em Budapeste. Sem pontos ficou a Force India e talvez tendo que resolver um problema interno, pois a invencibilidade de Nico Hulkenberg em 2014, de sempre pontuar nesse ano foi destruída após o alemão ser tocado por... Sergio Pérez, seu companheiro de equipe. Hulk parecia bem contrariado enquanto abandonava seu carro e se foi praga ou não, Pérez teve seu castigo voltas mais tarde ao destruir seu carro no muro dos boxes e trazer o safety-car mais uma vez. Assim como Pérez, Gutierrez estava feliz pela confirmação da volta do Grande Prêmio do México no ano que vem, mas o mexicano não teve muito o que comemorar quando abandonou quando estava na zona de pontuação, enquanto Sutil chegou novamente em 11º, colado em Button, deixando a Sauber ainda zerada em 2014. A Lotus também teve uma corrida para esquecer, com Grosjean conseguindo bater enquanto aquecia os pneus slicks no piso úmido durante o período de safety-car, e Maldonado continuando a bater em tudo e em todos, ficando fora dos pontos mais uma vez. Haja dinheiro público venezuelano para manter Maldonado na F1! Se ontem Bianchi já havia impressionado, hoje, com chuva, o francês da Marussia chegou a andar junto dos pilotos de Sauber e Lotus, o que para o carro que tem, é uma façanha, mas ao ser atingido por um destrambelhado Maldonado, a corrida de Bianchi começou a cair a partir de então. Porém, a Caterham foi ainda pior e desde a venda de sua equipe, ainda não terminou nenhuma prova.
A F1 agora entra de férias com uma ótima última impressão. Em suas piadas de mal gosto, Ecclestone chegou a anunciar que colocaria sprinkers ao longo das pistas, para molha-las quando a corrida ficasse chata. Se fosse o caso, que sempre façam isso em Hungaroring! Daniel Ricciardo mostrou que está no nível das estrelas da F1 atual e com seu carisma, será um piloto observado, assim como será bastante observado o clima entre os pilotos da Mercedes nas próximas semanas sem corrida.