O SporTV fez um tremendo golaço quando teve a ideia de reprisar dez corridas da F1 entre 1984 e 1993 na íntegra, inclusive com a narração original no último dia primeiro de maio. Lógico que a homenagem foi à Senna e os vinte anos de sua morte, mas os homenageados acabaram sendo todos nós que gostamos de F1, pois entre sete da manhã e nove da noite, vimos dez corridas de F1 históricas. Eu, por exemplo, não cansei da maratona.
Assentado a poeira, presto atenção em alguns depoimentos em redes sociais e algo me incomodou. Era um tal "essa época que era boa", "só havia corridas boas, ao contrário de agora", "meus domingos de manhã eram melhores naqueles tempos" e por aí vai. Gosto muito de história e me fascina ler e assistir grandes momentos do esporte e até mesmo da sociedade de outros tempos. Porém, temos que viver o hoje e admirar as coisas boas que acontecem no nosso mundo contemporâneo. Indo para o mundo das corridas, não tenho medo de errar que a temporada 2012 foi uma das melhores de todos os tempos e que a corrida do Bahrein deste ano não deve nada a algumas grandes provas que passaram no SporTV 2 no último dia primeiro. Se não há pilotos carismáticos como eram Senna, Piquet, Mansell e Prost naqueles tempos, não há como negar o talento de Vettel, Alonso e Hamilton.
Outro fator foi que passaram grandes corridas num período de dez anos, mas tenho absoluta certeza de que nesse período também teve corridas chatas e enfadonhas. O Grande Prêmio do Japão de 1990, que passou na última quinta-feira por exemplo, teve apenas de bom a arte de Nelson Piquet vencer uma corrida andando mais devagar possível. De resto? Nada. Nenhuma ultrapassagem antológica ou perseguição alucinante, o que não faltou nas demais nove corridas reprisadas. Claro que havia mais momentos icônicos naquela época e essa mesma prova vencida por Piquet teve a pancada que Senna deu um Prost na primeira curva que definiu o campeonato de 1990 de forma polêmica.
Ver essas provas também foi bom por rever algumas situações históricas, mesmo sabendo do resultado final. No Grande Prêmio do Brasil de 1991, prestei bastante atenção nas câmeras on-board de Senna e era claro que o piloto ainda tirava a mão do volante para trocar marchas com poucas voltas para o final. O McLaren se tornou um carro de uma única marcha no finalzinho da prova, faltando cinco ou seis voltas, o que não diminui o feito de Senna, pois os problemas de câmbio na McLaren começaram, pela narração dos tempos, bem antes. E falando em narração, foi flagrante que no entrevero de Suzuka em 1989, Galvão Bueno já pressentia que Senna poderia ser desclassificado. Quando Senna começou a ser empurrado pelos comissários de pista, Galvão dizia que Senna não podia cortar a chicane, que o brasileiro teria que dar a volta. Ayrton fez o contrário o que Galvão clamava no microfone e o narrador global paralisou por uns segundos e começou a exaltar o que Senna havia feito na pista, quase que como se soubesse que o amigo seria desclassificado minutos depois. Ou seja, se o Galvão sabia dessa regra, Senna com certeza sabia também. E não o fez. No auge da briga entre Reginaldo Leme e Ayrton Senna, o comentarista deu uma baita indireta no então desafeto quando no pódio em Suzuka/90, Reginaldo disse que a F1 estava feliz com o pódio com Piquet e Moreno, pois 'eles eram homens que mereciam esse momento'. Acho que os editores do SporTV, que tiveram o cuidado de cortar todas as chamadas de patrocínio e intervalos que povoaram aquelas corridas, esqueceram de cortar essa parte também...
No final, o dia primeiro de maio de 2014 foi muito divertido e, claro, de muita nostalgia. Era outra F1, mais humana e até mesmo mais carismática, mas também há virtudes na F1 atual e ao invés de ficar lamentando um tempo que não volta mais, devemos curtir o que há de bom nessa F1.
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