domingo, 20 de março de 2022

Ano começa vermelho


Toda pré-temporada de F1 gera mais desconfianças do que respostas, principalmente quando ocorrem resultados inesperados. Em 2022, com um regulamento completamente distinto dos últimos anos, a Ferrari surgiu bastante forte, impressionando a todos, enquanto a então dominadora Mercedes ficara para trás. A Ferrari seria novamente a campeã de inverno? A Mercedes estaria blefando? A Red Bull parecia a única que estava constante e forte. As primeiras respostas vieram nesse domingo e as desconfianças se mostraram infundadas. A Ferrari realmente está muito forte, a Red Bull vem com a mesma força do ano passado, enquanto a Mercedes terá que trabalhar bastante se quiser entrar na briga por vitórias. Claro que a primeira dobradinha da Ferrari em dois anos e meio veio muito pelo abandono de Max Verstappen nas últimas voltas, mas não se pode negar a força da trupe de Maranello, que pela primeira vez em muitos anos inicia uma temporada como o time a ser batido.


A primeira corrida de 2022 foi bastante animada, mas o que chamou atenção nas primeiras voltas foi a lentidão dos novos carros. Com um conjunto de quase uma tonelada nas primeiras voltas, era nítido que os F1 estavam com sobrepeso e talvez com isso em mente, a largada ocorreu sem maiores problemas, assim como na primeira volta. Leclerc confirmou sua pole, seguido por Verstappen e Sainz. Pérez largou mal e foi ultrapassado por Hamilton e um incrível Kevin Magnussen, com a não menos incrível Haas. Enquanto as voltas iam-se passando, a verdadeira relação de forças da F1 atual ficou bem clara. Pérez ultrapassou Hamilton e Magnussen para ficar em quarto, enquanto George Russell se colocou na sexta posição, com Magnussen, ainda sem ritmo de corrida de F1, com erros aqui e ali, ficava 8s atrás do jovem inglês da Mercedes. Nesse momento, temos Ferrari e Red Bull na frente, Mercedes isolada no terceiro pelotão e o resto vindo na balada, sem muitas chances de ataque aos líderes. Em comparação à 2021, temos uma terceira equipe até mesmo mais forte do que Red Bull e Mercedes, com os alemães ainda tendo que trabalhar bastante para se colocarem numa posição de luta pela vitória. O melhor momento da corrida foi posterior a primeira rodada de paradas, quando Max Verstappen se aproximou de vez de Charles Leclerc, iniciando duas voltas frenéticas, onde ambos usaram muito bem o DRS para trocarem de posição. Impressionante como Max se jogava na freada da curva 1, surpreendendo Leclerc, que recuperava a posição algumas curvas depois, na próxima zona de DRS. Isso custou caro à Verstappen, que fritou na terceira tentativa na curva um e além de não ter ultrapassado Leclerc, ficou sem pneus. A partir daí, Leclerc parecia que partiria impávido rumo à vitória. Foi quando começou o drama da Red Bull.

Com novos pneus de aro 18, o desgaste de pneus ainda é algo a ser aprendido por equipes e pilotos, fazendo com que muita gente procurasse os boxes uma terceira vez. Nesse momento as quinze voltas finais ficariam bem interessantes, pois Leclerc resolveu ficar na pista, enquanto os que vinham logo atrás da Ferrari trocaram os pneus pela terceira vez, porém, o motor de Pierre Gasly começou a pegar fogo e com o carro do francês parado ao lado da pista, o Safety-Car deu às caras. Sorte de Leclerc, que trocou os pneus sem maiores sobressaltos, enquanto Max reclamava via rádio de um problema no sistema de direção do seu carro. Parecia que problemas estavam à espreita no reino de Christian Horner. Na relargada, enquanto Leclerc desaparecia na frente, Sainz começou a atacar Max. Os dois que foram companheiros de equipe na Toro Rosso e não se davam muito bem, começaram uma briga onde Max começava a reclamar de potência. Faltou um pouco de huevos para Sainz ultrapassar logo, mas quando o espanhol efetuou a manobra e completar a dobradinha ferrarista, Verstappen apareceu lento e foi aos boxes para abandonar. Porém, nem tudo que esteja ruim que ainda possa piorar. Antes do SC, Pérez ensaiava um ataque em cima de Sainz pelo terceiro lugar, mas o mexicano logo estava sob ataque de Hamilton e o temido rádio de 'No Power' apareceu. Na abertura da última volta, Pérez rodou aparentemente sozinho, mas bastou um câmera on-board para perceber que ao virar o volante, o motor apagou, travando as rodas de Checo. Game Over para a Red Bull, que iniciou o ano com zero ponto e dos três abandonos da noite barenita, todos foram causados pelo powertrain Honda/Red Bull.


Leclerc não ligou para os infortúnios da Red Bull. Três anos depois de sua doída derrota em Sakhir, quando teve problemas em sua Ferrari quando estava com a vitória nas mãos, o monegasco não deu maiores chances ao azar e pela primeira vez em sua carreira lidera o campeonato de pilotos, enquanto a Ferrari lidera o Mundial de Construtores pela primeira vez desde 2018. Sainz parecia aliviado com o segundo lugar, pois ele sabia que a posição pertencia verdadeiramente à Verstappen. Mais aliviado ainda estava Hamilton. O inglês em nenhum momento deu pinta que subiria ao pódio e no primeiro stint da corrida, andou claramente mais do que o carro e ao fazer isso, queimou os pneus e foi o primeiro a parar. Depois disso, Lewis ficou num discreto quinto lugar até o azar da Red Bull se manifestar e Hamilton subir num inesperado pódio, com Russell logo atrás, em quarto. Um resultado alentador para a Mercedes, mas Toto Wolff sabe que precisará de muito trabalho para enfrentar agora não apenas a Red Bull, mas uma fortíssima Ferrari.


Depois dos líderes, o grande destaque da corrida foi, sem sombra de dúvida, Kevin Magnussen. O danês, até vinte dias atrás, estava se preparando para a próxima corrida da IMSA em Long Beach e iniciar os treinos com a Peugeot para a corrida em Le Mans, quando todo o problema com Mazepin o fez retornar à F1 de forma repentina. K-Mag só fez três dias de testes e rapidamente se adaptou ao carro, colocou Mick Schumacher no bolso e com os problemas redtaurinos, conseguiu um excelente quinto lugar, para delírio da Haas, que sabe que dificilmente isso seria conseguido por Nikita Mazepin. Porém, não deixou de ser decepcionante Mick ficar tão atrás de Magnussen, que liderou o 'resto' com tranquilidade. O crescimento da Ferrari trouxe no vácuo suas clientes e logo atrás de Magnussen chegou Valtteri Bottas. O nórdico largou muito mal, caindo para 14º. Bottas iniciou uma bela corrida de recuperação que o colocou numa ótima sexta posição, a melhor colocação da Alfa Romeo em muitos anos. Para completar a festa, o estreante Guanyu Zhou fez uma corrida bastante madura, onde o único erro aconteceu na largada, mas não demorou para o chinês alcançar Bottas e andar na balada do companheiro de equipe por muito tempo, incluindo ultrapassagens em vários pilotos bem mais experientes. No fim, Zhou chegou em décimo e já entrou na história, ao se tornar o primeiro chinês não apenas a pilotar na F1, como também a marcar ponto. Tsunoda foi o único sobrevivente da hecatombe da Red Bull e o nipônico fez uma bela corrida de recuperação, saindo de 18º no grid para oitavo, marcando pontos pelo segundo consecutivo em Sakhir.


A Alpine marcou pontos com seus dois pilotos, com Ocon regularmente na frente de Alonso. Se o espanhol esperava ficar mais tempo na F1 se a mudança de regulamento fizesse a Alpine lutar por vitórias, podemos estar vendo o último ano da carreira de Alonso. E se a ótima fase da Ferrari puxou suas clientes, ao contrário ocorreu com as clientes da Mercedes. A F1 sempre se mostrou cíclica e da mesma forma que nos primeiros anos da Era Híbrida a potência do motor Mercedes chegou até mesmo a esconder as deficiências das suas clientes, dessa vez, com um motor abaixo de Ferrari e Honda/Red Bull, as clientes da Mercedes ocuparam regularmente as últimas posições, com Aston Martin, McLaren e Williams fechando a raia. Chamou a atenção a McLaren, que começou a pré-temporada tão bem em Barcelona, mas uma sessão cheia de percalços no Bahrein fez com que seus pilotos não lutassem por pontos e com Ricciardo chegando a ficar em último. Para quem lutou pelo terceiro lugar no Mundial de Construtores, a McLaren ralará bastante em 2022. Na Aston Martin, o substituto Nico Hulkenberg andou na frente do horrível Lance Stroll nos treinos, mas faltou ao alemão ritmo de corrida para consolidar a sova em cima de Stroll, que com quanto mais o tempo passa, mais fica a sensação que o seu lugar é atrás de uma mesa no escritório de uma das empresas do seu pai. 


As mudanças de regulamento da F1 fez com que os carros andassem mais próximos, ocasionando várias disputas, mas ao contrário do que várias equipes apostavam, muitos times não se tornaram competitivos como por um toque de midas. Alpine, Aston Martin e Williams continuam no pelotão intermediário e somente corridas extraordinárias, que por sinal ocorreram algumas nos últimos anos, que podem fazer que os competentes pilotos dessas equipes possam estar na ponta. Claro que o status quo da F1 mudou, com a força de Haas e, principalmente, da Ferrari, que claramente deverá lutar por vitórias e pelo título. Mesmo a Mercedes tendendo a crescer, os times lutam pelo teto de gastos, enquanto a Red Bull correrá atrás da confiabilidade perdida. Até lá, a Ferrari deverá marchar na ponta por algum tempo. 

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