Em certos momentos da carreira, alguns profissionais precisam tomar certas decisões para se posicionar, mesmo que isso signifique perca de dinheiro, multas e contratos quebrados. O que vimos após a bandeirada do Grande Prêmio do Canadá foi um profissional bem sucedido se posicionar frente ao sistema, ao corpo dirigente de sua categoria. Não adianta muito entrar em discussão sobre a polêmica punição de Vettel. Certo ou errado, o que ficará dessa corrida será o sério posicionamento de Sebastian Vettel contra a FIA e Emanuelle Pirro, que lhe penalizou em 5s e deu a vitória para Hamilton. O alemão da Ferrari disse que estava sendo roubado no rádio, não estacionou seu carro no lugar certo, não deu as entrevistas obrigatórias, mas ainda assim foi convencido a ir ao pódio, não sem antes colocar o número 2 na frente do carro de Hamilton. Vettel não ligou se será multado. Ele já estava prejudicado demais para que uns trocados saíam do seu bolso, até porque Vettel já é milionário e não é de hoje.
A punição de Vettel na 48º volta acabou fazendo do quinquagésimo Grande Prêmio do Canadá entrar para a história, mesmo que pelos motivos errados. Até então a corrida era um tenso e interessante jogo de gato e rato entre Vettel e Hamilton. Com pneus macios no primeiro stint, Vettel tinha um carro superior, mas com os pneus duros, borracha escolhida pelos pilotos no segundo stint, Hamilton tirou toda a diferença e os dois multi-campeões andaram por várias voltas separados não menos de 1s. Então, veio o momento da discórdia. Pressionado e com 22 voltas pela frente, Vettel saiu da pista na curva 5, cortou a grama e voltou à pista imprensando Hamilton contra o muro. Dizer que o alemão não viu Hamilton seria o cúmulo da inocência, mas como Vettel diria depois: para onde eu iria? Sebastian deveria ter dado espaço para Hamilton, deve ter pensado os comissários da corrida, liderados por Emanuelle Pirro, piloto de carreira medíocre na F1, mas uma lenda nos carros protótipos e em Le Mans. Mas como falou Luciano Burti nos comentários, qual piloto não faria de tudo para se manter na ponta naquela situação? Toda essa manobra que deve ter durado uns 3s entrou no campo interpretativo, contudo, faltou à FIA e a Pirro outro elemento para tomar a decisão: bom senso.
Ter bom senso é algo que falta em muitas pessoas, mas que deveria sobrar para quem toma as decisões de uma corrida que movimenta milhões de qualquer dinheiro no mundo. Pirro só está nessa situação por ter sido piloto e por isso, deveria se colocar na situação de cada situação a ser investigada. Pirro tiraria o pé se estivesse no lugar de Vettel? Duvido muito, mas ele achou que Vettel não deveria ter imprensando Hamilton contra o muro quando retornou à pista e o alemão da Ferrari foi penalizado, criando um anti-clímax absurdo depois da corrida. Hamilton cruzou a linha de chegada e vibrou, mas ao perceber as vaias do público, entrou no modo Michael Schumacher em 2002 na Áustria. Ele era o principal beneficiado de uma questionável decisão alheia e por isso, era visto como vilão pelo público. Vettel não estava zangado com Hamilton, mas se pudesse jogar a garrafa de champanhe na cabeça de Pirro, ele faria com o maior prazer. Porém, em outro momento de grandeza de Vettel, ao ver que Hamilton era vaiado pelo público, tomou o microfone de Martin Brundle e pediu que vaiassem o verdadeiro vilão da tarde: FIA e Emanuelle Pirro.
Claro que isso causará uma enorme confusão nos próximos dias. Ao tomar essa decisão polêmica, Pirro entrará no olho do furacão da imprensa do próprio país, que deverá estar xingando até o famoso general Pirro, que governou a Macedônia no século 3 antes de Cristo. Muito forte politicamente, a Ferrari já deve estar ligando para Jean Todt para pedir explicações sobre o ocorrido em Montreal. A situação só não será mais dramática porque com essa terceira vitória consecutiva e uma corrida abaixo da crítica de Bottas, Hamilton vai se encaminhando firmemente para o sexto título, não restando muito para que a Ferrari pudesse fazer. Num momento em que várias categorias são duramente criticadas por decisões que mudam as posições de pilotos depois da corrida, essa vitória de Hamilton por uma decisão de alguém que estava atrás de uma tela pegou muito mau para uma F1 ávida por novos fãs.
Isso tudo deixou todo o resto em quadragésimo plano. Leclerc estacionou a única Ferrari debaixo do pódio, mas o monegasco poderia muito bem pedir explicações a sua equipe por estar apenas 3s atrás de Hamilton antes da rodada de paradas e após retardar seu pit-stop, Leclerc tinha mais de 10s de desvantagem para Lewis. A Ferrari ainda fez com que Leclerc tentasse ir para cima de Hamilton quando veio a punição, mas já era tarde demais e no final poderia deixar Vettel em terceiro. Bottas marcou a volta mais da corrida, no único momento de destaque de um final de semana ruim para o finlandês em todos os sentidos. Max Verstappen largou mais atrás por causa do erro de avaliação da Red Bull ao calça-lo com pneus médios no Q2 e o acidente de Magnussen colocar tudo a perder. Saindo com pneus duros, Max foi um dos últimos a parar e ao ultrapassar os dois Renault, garantiu o quinto lugar. Quem fez uma corrida medonha foi Gasly. O francês ficou preso atrás de Stroll após sua parada e terminou atrás da dupla da Renault, em outra corrida esquecível para Gasly, enquanto Ricciardo e Hulkenberg comemoraram seus melhores resultados no ano. Correndo em casa Stroll ganhou dois pontinhos ao ultrapassar Sainz nas últimas voltas, trazendo a reboque Kvyat. Depois de colocar seus dois carros no Q3, a McLaren decepcionou com Sainz fora dos pontos e Norris abandonando no início da prova com a suspensão quebrada. Magnussen levou a patada do ano via rádio ao reclamar do seu carro e Steiner praticamente manda-lo calar a boca. Magnussen estava entre os dois carros da Williams, numa situação nada boa. A volta de Kubica é uma boa história, mas a verdade é que hoje o polaco tomou um minuto do seu companheiro de equipe.
Numa situação constrangedora, até mesmo parecida com Zeltweg/2002, o pós-corrida em Montreal foi tenso. Vettel foi para o pódio a contra-gosto, mas para mostrar seu descontentamento, colocou a posição de número dois na frente do carro de Hamilton. O público foi ao delírio, pois para quem assistiu a corrida de hoje, aquela seria a posição de Lewis, cuja a vitória de hoje não lhe fará diferença no final do ano. No fim, quem saiu perdendo foi a F1. O público saiu do autódromo insatisfeito, milhões estão reclamando nas redes sociais por uma decisão sem nenhum bom senso e ninguém viu uma disputa tete a tete entre Vettel e Hamilton nas voltas finais. Pelo menos Vettel não se fez de sonso e mostrou todo o seu descontentamento, como fez Rubens Barrichello dezessete anos atrás.
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