quarta-feira, 9 de agosto de 2017

História: 30 anos do Grande Prêmio da Hungria de 1987

No último final de semana de julho de 1987, Peter Warr recebeu uma carta do advogado de Ayrton Senna reivindicando uma cláusula do contrato do brasileiro com a Lotus sobre a competitividade da equipe. Senna estava em negociações avançadas com a McLaren e não queria outro problema judicial em sua saída da Lotus, como ocorrera com a Toleman três anos antes, e para isso usou a cláusula de competitividade, já que era nítido que a Lotus não poderia lutar com Williams e McLaren pelo título, enquanto o time de Ron Dennis estava muito próximo de anunciar o motor Honda para 1988. Irritado, Warr contratou Nelson Piquet para 1988. O brasileiro estava extremamente insatisfeito com a Williams e sua política de igualidade de condições entre seus pilotos. "Eu trabalhei muito duro para transformar o carro da Williams no melhor da F1 sem ajuda de ninguém. E agora vou ter que disputar o título com meu companheiro de equipe? Isso não me serve!", bradou Piquet. Isso foi um golpe para Senna. Ele negociava um grande contrato com a McLaren e a Marlboro, pois sabia que tinha um contrato com a Lotus se algo desse errado, mas com Piquet garantido na Lotus, ganhando um salário altíssimo bancado pela Camel, Senna teria que diminuir sua pedida se quisesse mesmo ir para a McLaren em 1988.

Um fato pouco conhecido era que o principal alvo da McLaren para 1988 era Piquet, mas o brasileiro não queria outra guerra aberta com Prost após a experiência com Mansell na Williams. Mesmo com a ajuda da Honda, Senna era uma segunda opção. Muito se falou na época em salários e depois ficou comprovado que Piquet tinha o maior salário da F1 com o seu contrato com a Lotus em 1988. Para garantir o melhor motor da F1, Warr assegurou Satoru Nakajima em 1988 na Lotus, mesmo o japonês não tendo feito uma estreia auspiciosa na F1. E Piquet teria no contrato que era o piloto número um da Lotus. A ida de Piquet para a Lotus também atingiu em cheio a Williams. Nelson era um piloto Honda, inclusive com seus salários pagos pelos japoneses. A intransigência da Williams em não dar o status de piloto número um para Piquet fez o brasileiro sair da equipe, deixando a Honda ainda mais irritada com a parceira. Não nos esqueçamos que a Honda nunca engoliu muito bem a perca do título de 1986. A Williams ainda sonhava em permanecer com a Honda, pois o contrato datava até o final de 1988, mas era claro que um divórcio era iminente e naquela momento a melhor equipe da F1 estava praticamente sem motor e procurando pilotos. Os favoritos eram Thierry Boutsen, Alessandro Nannini, Martin Brundle e Jonathan Palmer, este último, antigo piloto de testes da Williams. 

Mansell ficou com a sua décima primeira pole com o tempo da sexta-feira, que ocorreu com o clima mais fresco e até mesmo um pouco de chuva. No sábado, o forte calor impediu que todos melhorassem seus tempos, por pura falta de aderência na pista. Mansell superava em 3s a pole de Senna de 1986, mas ao lado do inglês estava a grande surpresa do dia: a Ferrari de Berger. Desde o verão de 1985 que a Ferrari não colocava ninguém na primeira fila! Provando o bom entendimento da Ferrari em Hungaroring, Alboreto conseguia um bom quinto lugar, enquanto Piquet era terceiro. Prost teve problemas com sua McLaren, que tentava sanar o banal problema que tirou a vitória do francês na Alemanha, e teve que se conformar com a quarta posição. Senna era apenas sexto, enquanto Warwick conseguia um miraculoso nono lugar, mesmo enfrentando uma forte conjuntivite.

Grid:
1) Mansell (Williams) - 1:28.047
2) Berger (Ferrari) - 1:28.549
3) Piquet (Williams) - 1:29.724
4) Prost (McLaren) - 1:30.156
5) Alboreto (Ferrari) - 1:30.310
6) Senna (Lotus) - 1:30.387
7) Boutsen (Benetton) - 1:30.748
8) Johansson (McLaren) - 1:31.228
9) Warwick (Arrows) - 1:31.416
10) Patrese (Brabham) - 1:31.586

O dia 9 de agosto de 1987 amanheceu com forte calor em Budapeste, o que poderia indicar uma corrida difícil naquela dia de verão na Hungria. Nos treinos, com muito calor, os pilotos reclamaram bastante da falta de aderência com a pista quente. "Parece gelo", reclamou Johansson. Berger sofria com problemas estomacais e estava em constante cuidados quando estava fora do carro, o mesmo acontecendo com Warwick. O Grande Prêmio da Hungria havia se tornado um sucesso de público e a corrida seria transmitida ao vivo até para a União Soviética. Mesmo com o forte calor e os problemas de aderência, a Goodyear sugeriu às equipes que não trocassem os pneus durante a corrida. Na luz verde, Berger vacila um pouco ao evitar queimar a largada e é ultrapassado por Piquet, enquanto Mansell lidera com facilidade a primeira curva. Ainda na segunda curva, Berger retoma a segunda posição e é acompanhado por Alboreto, com as Ferraris separando os dois carros da Williams. Prost larga muito mal e cai para sexto.

Para surpresa geral, Berger e Alboreto não apenas seguem Mansell de perto, como colocam pressão no inglês, com Piquet ficando a 4s de Alboreto, num solitário quarto lugar. Senna ficava para trás e já era pressionado por Boutsen. A má largada de Prost se mostrava num problema de câmbio que faz o francês perder algumas posições nas primeiras voltas. Mansell aumenta o ritmo, mas Berger ainda o perseguia de perto, com ambos trocando a melhor volta da corrida, enquanto eram acompanhados por Alboreto e Piquet, que se aproximou do italiano. Após muito tempo, a Ferrari voltava à briga pela vitória! Porém, na volta 13, Berger sai lento da última curva e abandona com o diferencial quebrado, deixando Mansell com 6s de vantagem na ponta. Duas passagens depois Johansson, que tinha ultrapassado Prost, tem o diferencial quebrado na chicane e acaba rodando. Para evitar bater no companheiro de equipe, Prost roda, mas mantém o carro funcionando e volta à corrida, ainda mais atrasado. Senna era pressionado por Boutsen na briga pelo quarto lugar, mas o belga tinha problemas nos freios e talvez por isso, não ameaçava de forma mais incisiva o brasileiro, que lutava com um Lotus bem instável no momento.

Num circuito estreito e sinuoso como Hungaroring, negociar bem com os retardatários era essencial. Alboreto e Piquet brigavam pela segunda posição enquanto se livravam dos carros mais lentos. Na volta 29, Piquet consegue colocar o carro por dentro na primeira curva, mas perde o carro um pouco na freada e Alboreto emparelha, porém, Piquet fica por dentro na segunda curva e completa uma ultrapassagem trabalhada. A Williams voltava a fazer dobradinha, algo normal em 1987. Assim que ultrapassa Alboreto, Piquet aumenta o ritmo e parte em perseguição à Mansell, mas o inglês responde e os dois passam a trocar melhor volta da corrida. Nigel tinha 12s de vantagem e a corrida, aparentemente, sob controle. Senna se livra um pouco da presença de Boutsen quando os problemas nos freios do belga pioram e ele diminui o ritmo. Senna começava a cortar a diferença (que era grande) para Alboreto, mas logo fica claro o motivo disso, quando o italiano encosta sua Ferrari na grama com o motor quebrado. Zero ponto para a Ferrari, mas finalmente um desempenho encorajador para os italianos em 1987. A corrida fica estática e o único momento de emoção foi o toque entre os dois carros da Arrows. Apesar dos problemas, Prost permanecia na corrida e estava para se aproveitar de um problema no turbo de Boutsen, que fez o belga perder ainda mais rendimento. Na volta 59, o francês assumia o quinto lugar, já uma volta atrás de Mansell, que administrava sua vantagem sobre Piquet, contudo, ambos andando muito forte e bem mais rápido do que o resto do pelotão.

A corrida se encaminhava para o colo de Mansell, que completara 34 anos no dia anterior. Piquet diminui o ritmo quando uma vibração faz o brasileiro se aquietar. O problema parecia sério a ponto de Piquet ter dificuldades nas voltas finais. Porém, o problema se mostra ainda mais sério no outro carro da Williams, num dos abandonos mais cruéis da F1 nos anos 1980. Faltando cinco voltas para a bandeirada, Mansell vinha impávido quando seu Williams bambeia no final da reta oposta. O inglês ainda consegue fazer duas curvas, mas logo estaciona seu carro na grama. O replay mostrava a porca da roda traseira direita do carro de Mansell se soltando e destruir outra vitória do inglês em 1987. Nigel se senta num guard-rail inconsolável. Foi um duro golpe para Mansell! Informado do problema do seu companheiro de equipe e supondo que era isso a causa das fortes vibrações em seu carro, Piquet diminui o ritmo, já que Senna vinha 43s atrás. Apesar do drama, Piquet recebe a bandeirada em primeiro, numa vitória totalmente inesperada, com Senna completando outra dobradinha brasileira, mas sem o mesmo brilho de 1986. Apesar dos problemas, Prost termina em terceiro, com o seu motor soando muito mal, mas Boutsen tinha quebrado seu turbo faltando duas voltas e se arrastou para receber a bandeirada em quarto, uma volta atrás de Piquet. Patrese marcou seus primeiros pontos de 1987 e mesmo tocado pelo companheiro de equipe e sofrendo com conjuntivite, Warwick fechou a zona de pontuação. Piquet dava um passo decisivo rumo ao tricampeonato. Ele tinha oito pontos de vantagem sobre Senna, mas todos sabiam que Ayrton não tinha como deter a força da Williams-Honda. Porém, Mansell já se encontrava dezoito pontos atrás, o que significava duas corridas completas, com o campeonato já se aproximando do seu final. "Eu já dei o meu beijo de despedida do campeonato", lamentou Mansell. Enquanto isso, Piquet se regozijava. "Eu falei na Alemanha que minha temporada tinha começado lá. Pobre do Mansell...", falava o carioca com um sorriso no canto da boca. O título se encaminhava ao brasileiro da Williams, mesmo de saída da equipe.

Chegada:
1) Piquet
2) Senna
3) Prost
4) Boutsen
5) Patrese
6) Warwick

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