segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Corrida que não deveria ter acontecido

Trinta anos atrás era realizado o Grande Prêmio da África do Sul de 1985, mas a vitória de Nigel Mansell, a segunda consecutiva do inglês, ficou totalmente em segundo plano pelo o que aconteceu nos bastidores da corrida.

O odioso sistema do Apartheid vivia um momento particularmente sangrento em outubro de 1985, com a data da execução de Benjamin Moloise marcada para o dia 18. Exatamente um dia antes da corrida. A população negra sul-africana foi às ruas protestar contra a execução do poeta, enquanto a comunidade internacional apelava para que Moloise não fosse executado. Mesmo o COI e a FIFA banindo a África do Sul das suas disputas desde a década de 1970, a F1 continuou correndo no país do Apartheid como se nada tivesse ocorrendo de errado por lá, porém, os eventos de outubro de 1985 quase cancelaram a corrida.

O parlamento finlandês solicitou à Keke Rosberg que não viajasse para a corrida, o mesmo fazendo o governo italiano. A RAI cancelou a transmissão da corrida. O governo socialista de François Mitterand foi mais eficiente (até porque a equipe Renault fazia parte de uma empresa estatal...) e nem Ligier, muito menos a Renault viajaram para a África, enquanto Alain Prost, recém coroado campeão, foi impelido pela McLaren a correr em Kyalami, mas nenhum patrocinador quis aparecer numa corrida que nunca deveria ter ocorrido. 

E os nossos representantes? O então presidente José Sarney, assim como a maioria dos governantes da época, solicitou que a corrida não acontecesse e depois pediu que os pilotos brasileiros não corressem. No que foi totalmente ignorado. "Não tem problema. Faço apenas o meu trabalho, que é correr por uma equipe inglesa," respondeu aos apelos Ayrton Senna.  Nelson Piquet não fez melhor, enquanto que do outro lado do Atlântico, já correndo na Indy, Emerson Fittipaldi disse que a corrida deveria mesmo acontecer. "Esporte e política não se mistura", argumentou o bicampeão. Definitivamente, não foi o melhor momento dos três maiores pilotos brasileiros de todos os tempos...

Como previsto, Moloise foi executado numa sexta-feira dia 18 de outubro de 1985, a apenas 20 km do circuito de Kyalami, gerando uma enorme onde de violência em Joanesburgo. A corrida aconteceu normalmente no dia seguinte, com um magro grid de vinte carros, pois a Lola/Hass tirou Alan Jones da corrida de última hora. Em apenas dezessete voltas, só haviam dez carros na pista e somente sete receberam a bandeirada. Mansell venceu, começando o embalo que o levaria a ser considerado um ícone na F1 nos próximos anos. Keke Rosberg, mesmo com problemas de câmbio, completou a dobradinha da Williams, mostrando a força da futura equipe de Piquet em 1986. Prost havia prometido antes da prova que não subiria ao pódio se tivesse esse direito. Na hora agá, o francês descumpriu o que prometeu e estava todo serelepe ao lado de Mansell e Rosberg. Durante as primeiras voltas, os dois pilotos da Lotus brigavam pelo quarto lugar, quando Elio de Angelis teria sido fechado por Ayrton Senna. Essa cena nunca foi mostrada, mas deixou o italiano revoltado a ponto de quase agredir (muito se fala que o italiano chegou a dar um safanão em Senna, mas isso também nunca foi mostrado...) o companheiro de equipe dentro dos boxes da Lotus. Talvez não fosse para tanto, mas saindo da Lotus após anos de fidelidade, De Angelis apenas estava com muita frustração acumulada por se ver relegado dentro da Lotus após tantos sacrifícios.

Logo após a corrida, as equipes de F1 arrumaram as malas rapidinho e se mandaram para a nova corrida do calendário, o Grande Prêmio da Austrália, com certeza numa clima bem mais amistoso do que encontraram na África do Sul. Tradicionalmente ocorrendo no sábado, o Grande Prêmio da África do Sul de 1985 foi a última corrida de F1 que não aconteceu num domingo e também foi a última vez que o velocíssimo traçado de Kyalami original sediou uma prova de F1. Após tanto desgaste por fazer essa corrida num momento totalmente inoportuno, a F1 se tocou e também baniu a África do Sul do seu calendário, voltando sete anos depois com um Kyalami totalmente diferente e, principalmente, com uma África do Sul bem diferente, livre do Apartheid.   

4 comentários:

  1. Sem contar também que François Mitterand era muito amigo de Guy Ligier,o que apenas facilitou as coisas pra que a Ligier não viajasse pra Kyalami,porém o seu piloto na época,Philippe Streiff correu ``emprestado´´ pela Tyrrell.

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  2. E Jones não largou(ele se classificou pra largada em 18o) porque estava doente.

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  3. E Zakspeed e RAM foram as outras duas ausentes desse GP. A primeira porque desde a sua estreia já estava planejado que ela faria apenas as corridas europeias e a segunda não viajou por falta de dinheiro,mesma razao que a faria se ausentar também do GP da Austrália,o último da temporada 85.

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  4. Bela lembrança... Mas assim como o Show do Queen em Cape Town, penso que os eventos deveriam acontecer sim.
    Porque bem ou mal, chamava a atenção do mundo sobre o que acontecia lá.

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