quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Ciao


 Por mais que esperássemos, o definitivo adeus sempre marca e muitas vezes dói. Está ali na nossa cara, mas não queremos entender o óbvio. Ou seria, não queremos aceitar o óbvio? Valentino Rossi vem fazendo corridas ruins na MotoGP não é de hoje. Lembrando o que já fez na pista, era dolorido ver Valentino Rossi nas últimas corridas. Contando com 42 anos, parecia que o italiano de Tavullia era ainda o imberbe garoto meio desengonçado que tomou o Mundial de Motovelocidade como um furacão ainda no final dos anos 1990. Rossi era carismático, engraçado e muito, muito rápido. Era a mistura ideal para um ídolo.

Valentino Rossi rapidamente adotou o amarelo como sua cor e o galo Osvaldo como mascote. A sua torcida coloria os circuitos pelo mundo e Rossi nem na categoria principal estava. Ele passou pelas três categorias do Mundial de forma muito parecida e apesar de ser, no mínimo, irreverente, Rossi era muito metódico. Ele fazia um primeiro ano de exploração, mas na metade final do campeonato já era considerado o principal favorito na temporada seguinte, confirmando com o título um ano dominante. Foi assim nas 125cc e nas 250cc. Vale faria isso nas 500cc? Com todos de olho nele, Rossi demorou a completar sua primeira corrida, mas o fez logo subindo no pódio. A primeira vitória que completou vinte anos em 2020 foi numa corrida complicada, debaixo de chuva no início e depois com pista seca. Rossi logo emendaria vitórias e pódio que o colocaria como vice-campeão em sua estreia nas 500cc. Correndo na Honda sob supervisão de Mick Doohan e com a montadora esperando que ele fosse o sucessor da lenda australiana, rapidamente Rossi se tornou o principal piloto da Honda. E assim como fez nas categorias menores, Rossi venceu seu primeiro título nas 500cc em seu segundo ano. Daí em diante, não havia mais categorias a subir. Para Rossi, só restava a eternidade a ser conquistada. 

Foram três títulos consecutivos com a Honda, mas se sentindo truncado pelo conservadorismo da montadora, Rossi chocou o mundo se mudando para a Yamaha em 2004. Muitos pensavam que Rossi estava louco numa moto que não vencia, mas na verdade ele enlouqueceu seus fãs com uma vitória inesquecível em sua primeira corrida em Welkon. De forma incrível, foram mais três títulos seguidos. Um pequeno recesso e mais dois títulos em 2008 e 2009, deixava Rossi entre as lendas. Chegando aos 30 anos, parecia que Rossi bateria todos os recordes possíveis e impossíveis nas motos.

Porém, os pilotos que o acompanhavam na TV começaram a chegar na MotoGP observando a forma de trabalho de Rossi. Chegaram Daniel Pedrosa, Jorge Lorenzo e Casey Stoner. Uma geração mais nova, Rossi os derrotou nos primeiros anos, mas ganhando a experiência necessária, eles começaram a desbancar Valentino. Mesmo que Biaggi e Gibernau fossem grandes pilotos e que davam muito trabalho à Rossi, o italiano parecia que vencia quando e como queria. Com essa geração não era assim e Rossi começou a sair de sua zona de conforto, ocasionando seu primeiro acidente grave em Mugello/2010. Quando retornava às pistas após longa recuperação de uma fratura exposta na perna, Rossi chocaria o mundo novamente quando anunciou que iria para a Ducati. Era o sonho de um piloto italiano vencer em cima de uma moto italiana. A Ducati já tinha vencido com Stoner, mas parecia que apenas o australiano podia domar a Desmocedici e Rossi provou essa teoria da pior das formas. No auge da frustração, Vale ainda viu seu protegido Marco Simoncelli morrer num acidente em que Rossi estava envolvido. Muitos apostaram na aposentadoria de Rossi. Isso em 2012...

Rossi mostrou que ele não era de um material comum. Ele tinha a fórmula da juventude? Vale voltou para a Yamaha se reencontrar com os pódios e as vitórias. Ué, e por que não os títulos? A nova geração que viu Rossi crescer na TV ia aos poucos deixando o pedestal. Stoner, Pedrosa... Apenas Lorenzo e sua arrogância permanecia. E surgiu um espanhol com uma trajetória parecida com a de Rossi, mas com nem um décimo do carisma. Marc Márquez era outro fenômeno e seres especiais conheciam seres especiais. Rossi e Márquez se davam bem no começo, mas a competitividade de ambos o afastaram aos poucos. Em 2015 Rossi se mostrava incrivelmente sólido e lutava com Lorenzo pelo título. Márquez, que havia assombrado o mundo no ano anterior e foi campeão, mostrava algumas fragilidades de noviciado, algo que Rossi não mostrou em sua época. 

Valentino Rossi teve a humildade de mudar seu estilo de pilotagem para se manter na ponta, algumas vezes violentando sua forma de correr. Porém, um toque com Márquez na Malásia o fez ser penalizado na última corrida e Lorenzo acabou como campeão. Muitos diziam que Rossi tinha sido o campeão moral ou o campeão do povo. Aos 36 anos o italiano ainda era a maior estrela da MotoGP, mas como todo astro, uma hora ele vai se apagando. A disputa de 2015 foi a última chance de Rossi conseguir seu esperado décimo título. Os anos foram passando e as vitórias foram rareando. Depois foram os pódios que se tornaram ocasiões pontuais para Rossi. Valentino olhava para o lado e simplesmente não encontrava mais nenhum dos seus primeiros rivais. Biaggi, Gibernau, Roberts, Barros, Capirossi... todos estavam aposentados. Até a geração a seguir foi deixando a pista, como foi o caso de Stoner precocemente, mas depois foi a vez de Pedrosa e Lorenzo. Agora os pilotos que corriam ao lado de Rossi tiravam fotos com ele, uma estrela na MotoGP, ainda quando eram crianças.

A competitividade de Rossi o fazia postergar o óbvio. Vale completou 40 anos e saiu da equipe oficial da Yamaha, a sua marca favorita, pois ele não mostrava resultados para alguém numa equipe de fábrica. Ele foi para a satélite Petronas, onde encontraria outro discípulo seu, Franco Morbidelli. Seu meio irmão Lucas Marini, que nasceu no mesmo ano em que conquistou seu primeiro título, ainda nas 125, estreou na MotoGP esse ano. A sua equipe que serviu como celeiro de jovens italianos foi subindo de categoria e em 2022 estará na MotoGP. Rossi estaria lá?

No meio dessa manhã de 5 de agosto de 2021 a MotoGP anunciou uma coletiva extraordinária com Rossi. Era um aviso de que algo estava para acontecer. Era o fim. 

Fim das comemorações engraçadas. Da torcida em amarelo nas arquibancadas em Jerez, Brno e, principalmente, em Mugello. De pilotagens sublimes, derrotando seus rivais na última volta. Claro que houveram problemas, mas seu jeito tocante fazia de Rossi herói. E seus antagonistas os terríveis vilões. Biaggi, Gibernau, Stoner, Lorenzo e Márquez. Todos eles se tornaram figuras antipáticas, mesmo que incrivelmente talentosas e que fizeram Rossi um piloto cada vez melhor. O número 46 ficará no imaginário de todos nós como aquela moto dominante, mas que pilotada de forma tão fluída, que parecia que a vitória era fácil. Que a vitória era de Valentino Rossi.

Um ídolo eterno de todos nós! 

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