domingo, 29 de agosto de 2021

Como a viúva Porcina

 


Na épica novela Roque Santeiro, que nesse ano completa 35 anos que foi terminada e nunca será esquecida, existia a personagem da viúva Porcina, interpretada por Regina Duarte, que ficou conhecida como 'a quem foi, sem nunca ter sido', pois apesar de ter pegado para si a fama de viúva de Roque Santeiro, mito da cidade de Asa Branca, ela mal o conhecia e a verdadeira noiva era dona Mocinha. Passada a introdução novelística, o Grande Prêmio da Bélgica de 2021 deverá ficar conhecido como a 'corrida que foi, sem nunca ter sido', como a fictícia viúva Porcina.

Hoje houve um vencedor, houve pódio, houve pontuação (pela metade) e houve até mudanças de posição, mas a corrida simplesmente não existiu graças ao inclemente clima em Spa, que impediu qualquer volta realizada em bandeira verde. Claro que Max Verstappen não tem nada com isso e com a pole conquistada ontem e pelo simples fato de estar atrás do Mercedes de Bernd Maylander (menos mal que não era o de Hamilton...), o neerlandês conseguiu mais uma vitória em 2021 onde mal acelerou pelas únicas quatro voltas realizadas em Spa. Ainda houve a festa pelo primeiro pódio de George Russell, que conseguiu seu milagroso segundo lugar na classificação e estava na mesma posição quando a 'corrida' foi iniciada e terminada. Foi o primeiro pódio da Williams em quatro anos e pelo o que vem mostrando até o momento, deverá ser o primeiro de muitos do jovem inglês. A única mudança de posição ocorreu com a saída de pista de Sergio Pérez na volta de alinhamento, que fez o mexicano quase não largar, depois foi autorizado a sair do pit-lane, o que não fez muita diferença, pois Pérez ficou em último e de lá não saiu, perdendo mais alguns valiosos pontinhos para a Red Bull, que renovou seu contrato pensando justamente nisso.

A longa espera pela largada chateou a todos que acompanhavam a epopeia que acontecia em Spa. Pilotos dormiram, chás foram servidos e os comissários brincavam de bocha. Porém, muita gente deve estar criticando a atual a F1 a chamando de' Nutella'. Vamos aos fatos. Não foi a primeira vez que uma corrida foi suspensa devido à uma chuva forte, mesmo que isso seja raro na história da F1, a última vez tendo acontecido em 2009 na Malásia. O recente histórico de Spa também foi um fator preponderante para o que aconteceu nesse domingo, principalmente na curva Eau Rouge. Em 2019 ocorreu a morte trágica de Anthoine Hubert. Poucas semanas atrás, num dia de corrida na chuva, um forte acidente na Eau Rouge mandou dois pilotos de GT para o hospital. Na sexta, um múltiplo acidente no local envolveu seis pilotos da W Series e duas foram ao hospital. E por último, o fortíssimo acidente de Lando Norris ontem na Eau Rouge quando a chuva estava mais forte foi colocado na conta da FIA, que não teria interrompido a classificação a tempo. Todos esses incidentes, sem nunca esquecer os acontecimentos em Suzuka de 2014, fizeram com que a corrida em Spa de hoje se transformasse numa longa novela em que era nítido que dificilmente teríamos corrida. Só faltou tocar a música 'Dona', do grupo Roupa Nova e que na época embalava as cenas românticas da Viúva Porcina. As voltas atrás do SC foram feitas unicamente para que a corrida seja válida, mesmo que com metade dos pontos sendo distribuídos.

Alguém irá questionar: mas antigamente se corria em situações tão molhadas e traiçoeiras como a de hoje e mesmo assim tinha corrida! Antigamente também se corria sem cinto de segurança, com macacão que mais parecia uma roupa de festa, com abismos ao lado das pistas e pedras no asfalto. O fator segurança pode ser considerado chato ou 'Nutella', mas nunca devemos brincar com a vida dos outros, mesmo com pilotos super bem pagos e que escolheram essa vida quando crianças, sabendo de todos os riscos. Se a largada fosse dada, seria um show de Safety-Car ou ainda pior, poderíamos estar lamentando uma tragédia. A corrida não aconteceria de forma normal e ficaria bem abaixo da expectativa geral. A única crítica mais forte a ser feita foi a FIA ter postergado tanto tempo para algo óbvio. Outro fator é, com carros tão longos, os bólidos de F1 são mais susceptíveis a sofrer com aquaplanagens, fazendo de qualquer corrida na chuva algo mais perigoso do que o normal. Algo que deveria ser anotado para o novo carro de 2022.

São muitas discussões e problemas a serem sanados. Hoje não teve corrida e pelas condições impostas, além de todo o contexto, não dá para sair crucificando a F1, Spa ou os pilotos. Lógico que queríamos uma boa corrida na sempre empolgante pista de Spa, mas alguns fatores tem que ser colocados em questão e lições sejam aprendidas para evitar que 'corridas' como a de hoje não se repitam.   

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