quarta-feira, 4 de agosto de 2021

Garoto Maravilha

 


Por várias décadas a Nascar foi palco de velhos cowboys do asfalto, restando pouco espaço para jovens forasteiros. Campeões como Richard Petty, Cale Yarborough, Darrell Waltrip, Dale Earnhardt e Bill Elliott eram os exemplos práticos dos grandes pilotos da Nascar até os anos 1980. Eram o que chamamos hoje de pilotos-raíz. Isso começou a mudar nos anos 1990 e o principal piloto dessa nova geração foi um jovem prodígio que primeiro se interessou em monopostos, mas teve que se mudar para os stock-car americanos devido aos custos. Jeff Gordon sempre se mostrou um piloto rápido desde criança, mas demorou a conseguir espaço dentro da Nascar por causa de sua jovialidade e o que representava. Além de jovem, Gordon era comunicativo, articulado, corria com um carro colorido e tinha jeito de galã. Era o que se poderia chamar de piloto-Nutella. E Gordon alvo fácil das grandes marcas da Nascar, que o apelidaram de forma pejorativa de 'Wonder boy' ou 'Rainbow warrior' (Guerreiro do arco-íris). Seria dor de cotovelo? Jeff Gordon se tornou ele uma marca registrada da fase moderna na Nascar e com seus números incríveis, entra facilmente na lista dos grandes pilotos da categoria. Completando 50 anos no dia de hoje, iremos ver um pouco da carreira de Jeff Gordon.


Jeffery Michael Gordon nasceu no dia 4 de agosto de 1971 na cidade Vallejo, na Califórnia. Seus pais se separaram quando Jeff ainda era um bebê, mas seu padastro, John Bickford, lhe deu todo o apoio necessário para que ele se tornasse piloto. Com apenas quatro anos Gordon teve seus primeiros contatos com karts e pequenos carros de midgets, logo se tornando um fenômeno, vencendo inúmeros títulos. Quando completou 16 anos Jeff Gordon ganhou uma licença da USAC, se tornando o mais jovem a consegui-lo e venceu o título nacional de Midget aos 19 anos e no ano seguinte venceu a USAC Silver Crown, se tornando o mais jovem a vencer o tradicional campeonato. Foi nessa época que Jeff Gordon, que nessa época morava em Pittsboro, no estado do Indiana, se interessou pela F-Indy e realizar o sonho de correr nas 500 Milhas de Indianápolis. Junto com seu padastro, Gordon bateu em várias portas na Indy, mas com preços proibitivos, Jeff desistiu do seu sonho. 'O currículo de Jeff era impecável, mas as equipes sempre nos pediam muito dinheiro. Na temporada seguinte, pilotos que andavam muito abaixo de Jeff eram contratados por essas mesmas equipes, levando muito dinheiro', falou mais tarde John Bickford, padastro e também empresário de Gordon. A desistência de Jeff Gordon da Indy no começo dos anos 1990 foi um exemplo muito usado por Tony George de como a Indy estava cara demais e usou também esse fator para criar a IRL anos depois. Foi em 1989 que Gordon deu seus primeiros passos em carros com para-lamas, de turismo, algo bem diferente do que o jovem estava acostumado, mas Jeff rapidamente se adaptou ao novo tipo de bólido. E uma lenda começaria.


Jeff Gordon fez suas primeiras corridas na Nascar em 1990, correndo na Busch Series e tendo como engenheiro um desconhecido Ray Everham. Para a temporada seguinte, Gordon conseguiu um lugar na equipe de Bill Davis e logo mostrou sua marca, ganhando o título de Novato do Ano. Para 1992 Gordon continuava mostrando grande velocidade na Busch Series, conseguindo onze poles e já chamando a atenção dos grandes donos de equipe da Winston Cup. Correndo com carros da Ford, Gordon negociou com Jack Roush, mas o padastro de Jeff insistiu que Everham fosse contratado e o negócio esfriou. Gordon venceu uma corrida de forma dominante em Atlanta, chamando a atenção de um jovem chefe de equipe emergente: Rick Hendrick. Sem pestanejar, Hendrick contrata Gordon para 1993, mas ele o faz estrear na Winston Cup exatamente na última corrida de 1992, realizada também em Atlanta. Seria uma corrida emblemática. Além da disputa apertada pelo título, que acabaria nas mãos de Alan Kulwicki, aquela prova marcaria o fim da carreira de Richard Petty. Ou simplesmente The King. Correndo praticamente desde o início da Nascar, Petty era o arquétipo perfeito do piloto da Nascar daquela época, enquanto aos 21 anos de idade, Jeff Gordon parecia jovem demais para estar no meio daquelas feras. Gordon abandonou, mas aquela corrida em Atlanta ficou conhecido como uma passagem de bastão entre a antiga Nascar para a moderna Nascar, que seria liderada por Gordon.


Assim como ocorreu na Busch Series, Jeff Gordon foi o estreante do ano na Winston Cup em 1993, onde já corria com o mítico carro número 24, com patrocínio da Dupont, num carro colorido como um arco-íris. Ninguém duvidava da velocidade de Gordon, mas muitos o acusavam de ser duro demais com os carros e por isso ele se envolvia em muitos acidentes e quebras. Porém, em 1994 Gordon começaria a incomodar ainda mais o status-quo da Nascar. Ele venceria sua primeira corrida na Winston Cup num dos palcos sagrados da Nascar, em Charlotte, na famosa Coca Cola 600. E não ficaria por aí. Após anos de resistência, o santuário sagrado de Indianápolis finalmente receberia a Nascar em 1994, trazendo grande expectativa para todos os pilotos. Quem seria o primeiro piloto da Nascar a dominar Indianápolis? Morando muitos anos perto do circuito e tendo uma relação especial com ele, Gordon venceu a prova conhecida como Brickyard 400 e se tornava um piloto de ponta. Até aquele ponto da carreira, Gordon se mostrava um piloto muito inconstante, com vários abandonos, mas em 1995 seria diferente. Com apenas três abandonos e sete vitórias, Jeff Gordon conquistou seu primeiro título da Nascar, com 300 pontos de frente para Dale Earnhardt. O 'Intimidador' ficou claramente incomodado com a chegada de Jeff Gordon ao estrelato. Com exatos vinte anos de diferença, Earnhardt muitas vezes criticava a mídia em cima de Gordon, que o admirava em réplica. Havia mais ciúme por parte de Dale do que uma verdadeira rivalidade entre os dois, mas ambos se respeitavam bastante, até o triste fim do relacionamento em 2001. Mesmo vencendo dez corridas em 1996, Jeff Gordon acabou derrotado pelo seu companheiro de equipe Terry Labonte, mas Gordon ganhava cada vez mais fãs e se tornava uma referência na Nascar, além de ser a própria cara da categoria fora da região sul dos Estados Unidos. Ainda muito jovem, Jeff Gordon se mostrava como a nova cara da Nascar, principalmente em outros países.


Em 1997 Gordon venceria sua primeira Daytona 500, iniciando não apenas um, mas dois anos dominantes, culminando com o bicampeonato, com várias vitórias. Além do marketing em cima de sua imagem, Gordon se tornava claramente a maior estrela da Nascar. Em 1999 Jeff venceria novamente a Daytona 500 e receberia uma enorme proposta para se mudar para a Chip Ganassi, que passaria a investir na Nascar ao lado do dono da Dallas Cowboys, mas Gordon recusou a proposta e assinou um acordo vitalício com a Hendrick. Antes de completar 30 anos, Gordon já tinha mais de cinquenta vitórias e era uma estrela da Nascar, mas no começo de 2001 ele veria a morte de Dale Earnhardt em Daytona, algo que chocaria toda a comunidade automobilística. Com seis vitórias, Jeff venceria seu quarto título em 2001, se tornando o terceiro piloto da história da Nascar a alcançar essa marca. 


Além de correr na Indy, Jeff Gordon também tinha um sonho de correr na F1. Impressionado com a habilidade de Gordon, Jackie Stewart fez um convite ao americano para que ele corresse na F3 Inglesa no começo dos anos 1990, mas Jeff já estava comprometido com a Nascar. Em 1997, ele recebeu um proposta de se mudar para a Indy, mas sua passagem na equipe de Barry Green seria na verdade um trampolim para a F1, na equipe BAR, mas Gordon declinou. Ele realizaria o seu sonho de correr de F1 em 2003, quando a Williams e a Hendrick promoveram uma troca entre Gordon e Juan Pablo Montoya no circuito misto de Indianápolis. Essa seria a primeira experiência de Montoya na Nascar antes de sua mudança alguns anos depois. Porém, todos estavam curiosos de como Jeff se sairia num carro tão diferente e sofisticado. E o americano esteve longe de decepcionar. Gordon se saiu muito bem, fazendo tempos razoáveis e impressionando os engenheiros com que trabalhou. Falou-se que com mais treino, Jeff Gordon poderia se tornar um piloto de F1, mas já uma estrela consolidada da Nascar, Jeff nem pensou nessa possibilidade, mas ele não sabia que seu título em 2001 seria seu último na Nascar.


Com o sucesso de Gordon nos anos 1990, junto com a queda do interesse da Indy por causa de sua cisão, vários jovens pilotos americanos passaram a se concentrar na Nascar, causando um aumento exponencial de interesse pela categoria. Ao invés de sonharem com Indianápolis, mais e mais pilotos passaram a sonhar com Daytona. E foi assim que pilotos como Tony Stewart, Kurt Busch, Matt Kenseth e Kevin Harvick foram surgindo na Nascar no início do milênio. Porém, o mais talentoso deles era protegido por Gordon. Jimmie Johnson era um promissor piloto da Busch Series que chamou a atenção de Gordon. Quando assinou o contrato vitalício com a Hendrick, Jeff também teria uma parte na equipe e resolveu investir num carro para Johnson. Seria o 48, duas vezes mais do que o 24. Era o surgimento de mais uma lenda e, porque não, no sucessor de Jeff Gordon na Nascar. Ele continuaria uma estrela na Nascar e uma referência, mas Jeff teria fortes companhias. Em 2004 surgiria os Play-Offs e Johnson venceria cinco títulos seguidos entre 2006 e 2010, mas em 2007 se o campeonato fosse de 'pontos corridos', Jeff Gordon seria o campeão. Nesse ano Jeff Gordon venceria pela 77º vez, se igualando à Dale Senior. Porém, os fãs do Intimidador não gostaram muito da marca, mesmo Gordon tendo desfilado com uma bandeira de número 3 e o carro de Jeff chegou a ser vítima de latas de cerveja.


Contudo, as vitórias de Gordon iam rareando. Se ele venceu quatro corridas em 2007, ele só repetiria o feito em 2014 e nesse ano ele venceria pela quinta vez em Indianápolis, vinte anos depois de sua primeira vitória, e se igualando à Michael Schumacher como o piloto com mais vitórias em Indiana. No Texas, Gordon estava lutando pela vitória com Brad Keselowski e acabou tocado pelo rival, ocasionando uma grande briga no pit-lane depois da corrida. Outra briga famosa envolvendo Gordon ocorreu em Martinsville em 2012, quando bateu de propósito em Clint Bowyer e acabou atacado por membros da equipe de Bowyer ao chegar na garagem. Porém, no caso com Keselowski, Jeff admitiu que sua raiva era porque aquilo praticamente acabava com qualquer chance dele tentar seu quinto título naquela momento. Aquela havia sido a primeira ótima temporada de Jeff em muitos anos. O piloto já era um veterano com 43 anos e mesmo com a Nascar sendo conhecida pela longevidade dos seus pilotos, Jeff Gordon reclamava de dores nas costas por acidentes em outros anos. No começo de 2015 ele anunciou que aquela seria a sua última temporada completa na Nascar. Apenas em novembro ele ganharia pela 93º e última vez na Nascar, em Martinsville, o que lhe garantia um lugar na final da Nascar em Homestead, no intrincado sistema de definição de título da categoria. O tamanho de Gordon era provado com as visitas que recebeu em sua última corrida na Nascar. Simplesmente Mario Andretti e Lewis Hamilton. Um representante da Indy e outro da F1 para reverenciar uma lenda da Nascar. Jeff Gordon terminou a corrida em sexto e encerrou sua carreira.


Gordon ainda faria algumas corridas em 2016 no lugar de Dale Earnhardt Junior, mas desde então ele passou a se dedicar ao papel de comentarista da Fox Sports, até ser chamado por Rick Hendrick esse ano e se tornar vice presidente da Hendrick Motorsports, com o objetivo de suceder o chefe de equipe num futuro próximo. Os números de Jeff Gordon o colocam facilmente entre os gigantes da Nascar. São quatro títulos (1995, 1997, 1998 e 2001), 93 vitórias, sendo três triunfos na Daytona 500 (1997, 1999 e 2005),  81 poles em 797 corridas, sendo 789 corridas consecutivas. Mais um recorde. Foram vários recordes na carreira de Jeff Gordon, inclusive depois que saiu da Nascar, quando ele venceu as 24 Horas de Daytona de 2017 e se tornou o quarto piloto a vencer a corrida da Nascar e de Endurance. Assim foi Jeff Gordon em sua carreira de 23 anos na Nascar. Cheio de números impressionantes que o colocaram na Hall da Fama da Nascar 2019, um das lendas da Nascar e um gigante do automobilismo.

Parabéns!

Jeff Gordon

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