Quando somos crianças, sempre pensamos que quando crescermos nossos gostos irão mudar. Que não iremos mais ver desenhos, comer bolacha recheada e jogar videogame quando crescer. Que iremos gostar de outras coisas mais importantes e 'adultas', deixando o lado criança, literalmente, de lado. Porém, quando a idade vem, experimentamos várias coisas boas e até mesmo os cabelos brancos começam a brotar, percebemos que o nosso lado criança nunca acaba. Me lembro que quando trabalhei numa indústria alimentícia, tacava-lhe o pau no biscoito recheado. Dois anos atrás comprei um Playstation 3 e acompanho os novos lançamentos. E nunca deixei de assistir o Chaves.
Para quem não sabe, perdi meu avô e meu pai num espaço de um ano e meio e até agora sinto muito o baque. Pensei também que após tantas perdas em tão pouco tempo, nenhuma morte de algum famoso me sensibilizaria, mas veio a morte de Luciano do Valle para me trair. Senti demais o falecimento do narrador que tanto acompanhei quando criança. É isso. As lembranças que marcam a nossa infância calam mais fundo na gente e por isso, a morte de Roberto Bolaños, o famoso Chaves, está sendo muito dolorida não apenas por mim, mas pela comoção nas redes sociais, também para muita gente.
O cenário do Chaves era tão tosco, os episódios tão inocentes e os personagens tão simplórios (Seu Madruga, Chiquinha, Quico, Dona Florinda, Bruxa do 71, Professor Girafales, Sr Barriga), que parece que se criou uma espécie de charme para o seriado que mesmo infantil, atravessou gerações a ponto de estar há trinta anos na grade de programação do SBT com relativo sucesso. E pessoas com bem mais de trinta anos continuam a assistir um humor leve, onde sabemos todas as falas, mas conseguimos morrer de rir do mesmo jeito.
Bolaños criou uma série com personagens também cheio de simbologias, onde lições são aprendidas a cada episódio. Aprendemos, também com o Chapolin, várias frases e bordões que para sempre estarão em nossas cabeças. Conhecemos Tangamandapio. Suspeitamos desde o princípio. Ninguém teve paciência com a gente. Fizemos coisas sem querer querendo. E fizemos vários movimentos friamente calculados.
Tudo isso obra de Roberto Bolaños. Ele marcou minha infância e de muitos adultos como eu, assim como adolescentes e crianças de toda a América Latina. Por uma dessas coincidências da vida, o Plantão do SBT anunciando a morte de Bolaños foi durante o episódio do Chaves. Como homenagem, continuei assistindo o episódio onde o seu Madruga, considerado pelo próprio Bolaños como o melhor ator do seriado e que agora está o recebendo no céu (ou lá embaixo, como Ramón Valdés brincava), pensava que estava a ponto de morrer, quando na verdade era preparada sua festa de aniversário surpresa. E ria. Ri muito, como sempre ri enquanto assistia ao Chaves. Mesmo que com lágrimas nos olhos.
Muito obrigado, Roberto Bolaños, pelas risadas, pelas frases de efeito e as lições aprendidas!
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