domingo, 18 de outubro de 2020

Barros

 


Por duas décadas ele foi um piloto de ponta num tipo de corrida no qual a tradição no Brasil sempre foi mínima. Apesar da presença de pilotos como Adu Celso (com uma vitória na antiga 350cc), Luiz Celso Giannini, Edmar Ferreira, Antonio Jorge Neto, Marco Greco e Cláudio Girotto, o Brasil nunca foi uma potência no Mundial de Motovelocidade, mas Alex Barros superou essas dificuldades e fez seu nome na classe rainha no momento em que a categoria vivia bons momentos, sendo companheiro de equipe de pilotos como Eddie Lawson, Randy Mamola e Kevin Schwantz, além de te compartilhado a pista com monstros como Wayne Rainey, Mick Doohan e Valentino Rossi. Dono de uma pilotagem segura, Barros passou dezesseis anos na principal categoria do motociclismo mundial (500cc e MotoGP) e foi piloto de cinco marcas diferentes (Cagiva, Suzuki, Honda, Yamaha e Ducati). Completando 50 anos no dia de hoje, vamos conhecer um pouco a carreira desse piloto reconhecido mundialmente.


Alexandre Abrahão Coelho de Barros nasceu no dia 18 de outubro de 1970 em São Paulo e desde muito cedo sempre esteve envolvido com as duas rodas. Seu pai era ciclista e muitas vezes levava seus filhos com ele para pedalar na USP. Além de Alexandre, César Barros também se tornou piloto, mas longe do sucesso do mano mais velho. Aos três anos de idade Alex teve o primeiro contato com uma moto e se apaixonou pela máquina, pilotando a moto sempre que podia e vencendo sua primeira corrida aos sete anos de idade, conquistando o bicampeonato brasileiro de minibikes em 1979/80. Em 1981, com apenas dez anos, foi campeão brasileiro de 50cc em 1981 e em 1985 de 250cc, se tornando rapidamente um nome bastante promissor no motociclismo brasileiro. Apesar de algumas tentativas isoladas de pilotos brasileiros nos anos 1970, não havia um caminho conhecido para um brasileiro ingressar no Mundial de Motovelocidade. Com o apoio do seu pai, Alex foi para a Espanha em 1986 e tendo que mentir sua idade, começou a correr no país ibérico e já estreou no Mundial de Motovelocidade, correndo na categoria 80cc. Barros não chegou a fazer um campeonato inteiro na 80cc, mas ganhou bastante experiência na Espanha, além de chamar a atenção pela habilidade que tinha e com os contatos que tinha, conseguiu uma vaga na equipe Venemotos na categoria 250cc em 1989.


Foi um ano de aprendizado para Alexandre, onde foi companheiro de equipe de Carlos Lavado, bicampeão da categoria. Os resultados nas últimas corridas mostravam uma clara evolução de Barros, mas o próximo passo do brasileiro seria bastante surpreendente. Ao invés de ficar mais um ano nas 250cc, Barros foi contratado para correr na equipe oficial da Cagiva nas 500cc. Quando fez sua estreia em Suzuka, Alex Barros se tornava o piloto mais jovem a correr nas 500cc com apenas 19 anos, tendo como companheiros de equipe os experimentados Randy Mamola e Ron Haslan. Barros se envolveu em alguns acidentes, mas mostrou seu talento com um quinto lugar em Spa. Foram três temporadas com muitas dificuldades e aprendizado numa moto que não chegava aos pés das montadoras japonesas. Em 1992, tendo como companheiro de equipe o tetracampeão Eddie Lawson, Barros subiu ao pódio pela primeira vez em Assen, com um terceiro lugar. Mesmo jovem, Barros já tinha três temporadas de bagagem e vendo o potencial no brasileiro, a equipe oficial da Suzuki o contrata em 1993 para ser companheiro de equipe de Schwantz. Considerado um dos melhores pilotos de sua geração, Schwantz fez uma ótima temporada que lhe deu seu primeiro e único título em 1993, mesmo que ajudado pelo trágico acidente que colocou Wayne Rainey numa cadeira de rodas. Tentando andar no mesmo ritmo do seu companheiro de equipe, Barros sofreu algumas quedas no decorrer da temporada, mas no final do ano ele voltou ao pódio com um segundo lugar em Laguna Seca. Na última corrida da temporada, em Jarama, o título já estava decidido a favor de Schwantz e os pilotos ainda estavam assustados com as notícias de Rainey. Correndo numa pista que conhecia bastante, Barros inicialmente perseguiu os primeiros colocados Kevin Schwantz, John Kocinski, Shinichi Itoh e Luca Cadalora. Schwantz corria relaxado e foi perdendo rendimento, enquanto Kocinski, Itoh e Cadalora caíram. Barros assumiu a ponta e tinha a Honda de Daryl Beattie por perto, mas administrou a pressão para vencer pela primeira vez no mundial, exatamente vinte anos depois do triunfo de Adu Celso na mesma pista de Jarama!


Com uma ótima impressão deixada no ano anterior, Barros se tornava um piloto a ser observado para 1994. Mais consciente, Alexandre faz uma temporada bem consistente e regular, pontuando em treze das catorze provas daquele calendário, mas a Suzuki tinha sido superada amplamente pela Honda de Doohan e Barros só conseguiu um único pódio na temporada e perdendo duas posições em relação ao campeonato anterior. Pensando numa reconstrução, a Suzuki dispensa Barros para 1995, mas o brasileiro tinha um bom nome no paddock e rapidamente conseguiu um lugar nas 500cc, porém, pela primeira vez Barros não estaria numa equipe de fábrica. Algo que teria que se acostumar. Correndo com uma Honda do mítico engenheiro Erv Kanemoto, Barros não faz um grande ano em 1995, mas na temporada seguinte Alex consegue um excelente quarto lugar no Mundial das 500cc, demonstrando uma grande regularidade. Em meados dos anos 1990, a transmissão do Mundial de Motovelocidade ganhava uma casa com uma cobertura mais regular do SporTV, incluindo algumas corridas passadas na Globo. Em 1997 Barros vinha muito bem no GP Brasil, mas caiu, porém, numa corrida mostrada pela Globo, conseguiu um ótimo terceiro lugar em Donington Park. Depois de dois anos da equipe de Fausto Gresini, Barros se muda para a equipe de Sito Pons em 1999. Naquele tempo a equipe oficial da Honda dominava as 500cc, incluindo um ano perfeito em 1997. Era o reinado de Michael Doohan e seus cinco títulos consecutivos. Mesmo contando com uma Honda, Barros simplesmente não tinha chances contra as motos de fábrica e com isso desenvolveu uma característica que lhe marcou bastante: a freada. Ultrapassar Alexandre Barros numa freada era uma grande dificuldade para qualquer piloto dos anos 1990 nas 500cc.


Após um ano irregular em 1999, quando seu contrato com a Pons quase não foi renovado, Barros teria um ótimo ano em 2000. Correndo ao lado de Loris Capirossi, Alex conseguiria resultados de relevo, com sua primeira pole no mundial em Mugello e sua primeira vitória em sete anos, na Alemanha, algo que repetiria em Assen, pista no qual sempre andou muito bem. Para 2001 a FIM resolveu introduzir os motores quatro tempos de 990cc, substituindo os motores dois tempos de 500cc. Era o surgimento da MotoGP! Mesmo não correndo por uma equipe de fábrica, Barros tinha mais atenção da Honda e junto com seu engenheiro Ramon Forcada, fazia ótimas exibições. Barros igualou sua melhor posição no campeonato de 1996 em 2000, 2001 e 2002. No último ano, Barros ainda correu boa parte do ano com a moto antiga de 500cc, enquanto o campeão Valentino Rossi já pilotava a 990cc. Nas últimas corridas de 2002 Barros recebeu a mesma moto de Rossi e deu um show, conseguindo duas vitórias sobre o italiano e marcando mais pontos do que Rossi no último terço do campeonato. Barros era considerado um dos melhores pilotos do pelotão aos 32 anos e estava no seu auge. Por causa disso ele recebeu um convite que parecia irrecusável: se tornar o principal piloto da Yamaha em 2003. Depois de vários anos correndo numa moto inferior por estar numa equipe satélite, Barros teria tudo do melhor a sua disposição e liderando o desenvolvimento da moto, porém, a Yamaha vinha de um jejum de dez anos sem títulos e sendo massacrada pela Honda. O trabalho de Barros foi atrapalhado por um acidente nos treinos logo da primeira corrida do ano em Suzuka, que lhe prejudicou em toda a temporada. Sendo considerado o principal piloto da Yamaha, Alexandre Barros não conseguiu liderar a equipe, mas ainda havia esperança. Mesmo com três títulos consecutivos e intocáveis com a Honda, Valentino Rossi se sentia incomodado na montadora japonesa, que deixava a entender que qualquer piloto poderia vencer com sua poderosa Repsol Honda. Coisas banais, como a implicância da Honda com Rossi usar o número 46 também não ajudavam o relacionamento. Com tantas confusões, Rossi surpreendeu o mundo ao anunciar que estava indo para a Yamaha em 2004. 


Logicamente Barros deixaria de ser o centro das atenções da Yamaha, porém, a Honda sabia que poderia usar a experiência de Barros e o contrata como primeiro piloto em 2004. Alexandre Barros, após anos correndo com uma Honda satélite, estaria usando toda a potência da Honda para desenvolver e vencer corridas. Contudo, o que parecia um sonho acabou se tornando um pesadelo. A Honda cometeu um senhor erro estratégico em esnobar Rossi quando o gênio italiano estava no seu auge e Valentino simplesmente passou a ganhar tudo com a Yamaha, quando anteriormente não ganhava nada. Até mesmo nas mãos de Barros. Por sua vez, Barros via que mesmo estando na equipe de fábrica da Honda, a montadora não confiava plenamente dele, dando o mesmo material para Sete Gibernau e Max Biaggi, os grandes rivais de Rossi na época e que corriam, teoricamente, em equipe satélites. Cercado de expectativas, novamente Barros naufragou quando esteve numa equipe de fábrica. Foram apenas três pódios e o quarto lugar no campeonato. O mesmo que Alex havia conseguido quando corria em equipes satélites da própria Honda. Muito pouco para quem usava uma Honda de fábrica e Barros acabou dispensado depois de um ano, trocando de lugar com Biaggi. Voltando à equipe Pons, Barros se sentiu mais confortável e numa corrida em situações mistas de asfalto no Estoril, Alex conseguiria sua última vitória na MotoGP em 2005. Biaggi sempre dizia que poderia derrotar Rossi se tivesse com uma moto de fábrica da Honda, mas o italiano fracassou fragosamente na Repsol Honda, demonstrando que a performance discreta de Barros tinha raízes mais profundas do que apenas o piloto. Quando o seu contrato com a Honda acabou no final de 2005, mesmo com alguns bons resultados naquela temporada, Barros se viu sem moto para o ano seguinte. 


Aposentadoria? Ainda não. Barros conseguiu um lugar na equipe Klaffi Honda no Mundial de Superbike, um campeonato de nível inferior à MotoGP, mas com motos potentes e bons pilotos. Novamente Barros não teria uma moto de fábrica em mãos, mas o brasileiro não fez feio, conseguindo uma vitória em Ímola e o seu sexto lugar no campeonato o colocava como o melhor piloto independente de 2006. De forma surpreendente, Barros fez um retorno à MotoGP em 2007, onde pela primeira vez na história um piloto correria com uma quinta moto diferente: Barros estaria de Ducati. Alex fez uma boa temporada pelo equipamento que tinha, bateu o recorde de velocidade máxima no final da reta em Mugello e foi terceiro nessa pista, conseguindo seu último pódio. O sétimo lugar em Valencia com uma Ducati satélite foi sua última na MotoGP, se tornando o piloto com mais corridas na história do Mundial. Ao final de 2007, foram 276 largadas na MotoGP, sete vitórias, cinco poles, 32 pódios e cinco quarto lugares no campeonato como melhor posição.


Como esperado, infelizmente ninguém veio no vácuo de Alexandre Barros na MotoGP. Com exceção de Eric Granado, nenhum brasileiro competiu no Mundial de Motovelocidade nos últimos treze anos. Após sua aposentadoria, Alex viu seu filho Lucas tentar correr de kart e moto, mas sem continuidade. Em parceria com Gilson Scudeler, criou o Brasileiro de Superbike, que chegou a ter vários pilotos estrangeiros e o próprio Alex correndo, mas o campeonato começou a ter vários problemas, principalmente de segurança, com vários pilotos perdendo a vida nos últimos anos, além da competição com outra categoria similar no Brasil. Tentando encontrar algum jovem brasileiro para trilhar uma carreira rumo ao Mundial de Motovelocidade, Barros criou uma academia de jovens pilotos com apoio da Estrella Galicia e Emilio Alzamora. Respeitado por todos os seus anos no Mundial de Motovelocidade, Alexandre Barros foi o melhor brasileiro a correr em duas rodas.

Parabéns!

Alexandre Barros  

3 comentários:

  1. A corrida de 92 em Assen foi disputada com tempo ensolarado e seco.

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  2. E a passagem do Biaggi pela equipe de fábrica da Honda foi pra variar turbulenta em se tratando de Max Biaggi. O divórcio foi feio e rumoroso com direito a briga nos boxes do GP da Turquia e a promessa(efetivamente cumprida) por parte dos japoneses que o romano nunca mais guiaria uma moto da fábrica na vida. E aquela foi a despedida melancólica e humilhante de Max Biaggi da MotoGP.

    Vinicius Vergueiro

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