domingo, 4 de agosto de 2019

Demarcando território

Com as duas vitórias espetaculares de Max Verstappen nas últimas três corridas, levantou-se um questionamento na F1: o holandês já seria o melhor piloto do pelotão atual? Max teria superado o já histórico Lewis Hamilton? Mesmo que não admitam, os pilotos correm, sim, atrás de recordes e tem egos inflados. Mesmo prestes a conquistar seu sexto título, essas frases sobre Verstappen devem doer em Hamilton. Ele queria uma disputa direta com o holandês e hoje ele teve essa oportunidade. Numa corrida particular entre Hamilton e Verstappen, onde os demais dezoito pilotos se tornaram coadjuvantes instantâneos, os dois protagonizaram uma batalha técnica de altíssimo nível, que acabou com a vitória de Hamilton nos momentos finais, onde o inglês mostrou a todos: Verstappen é grande, mas ainda está atrás dele.

A corrida de hoje na Hungria foi mais uma da boa sequência de provas emocionantes da F1. Após a tenebrosa corrida na França, já tinha gente decretando a morte da F1, numa cartada, no mínimo, duvidosa. Que a F1 passa por um momento complicado fora das pistas, não há muitas dúvidas disso, e não serão essas últimas corridas monstruosas que vão negar esses fatos, mas dizer que a F1 está morrendo já vai oportunismo demais. Este domingo viu uma corrida um pouco diferente das outras etapas dessa sequência. Havia um algo a mais em disputa. Max Verstappen talvez seja um dos maiores talentos surgidos nos últimos tempos, desde a chegada do próprio Lewis Hamilton no já distante ano de 2007. As vitórias de Max na Áustria e na Alemanha, quando se aproveitou das circunstâncias com uma pilotagem cada vez mais madura levantou sérias questões se o piloto da Red Bull já estava um nível acima de Hamilton. Claro que Hamilton, pentacampeão a ponto de virar hexa, não deve pensar assim e no íntimo, estava louco para dar uma resposta no palco ideal: dentro da pista. Hungaroring era considerada a pista mais chata da F1 em meados dos anos 2000, mas com a entrada de tantas pistas ruins e o aumento da aderência dos carros, o traçado húngaro foi se tornando interessante e palco de corridas muito boas nos últimos tempos, mesmo que mantendo a dificuldade de ultrapassagem. Verstappen fez um esforço fora do comum para confirmar sua pole ao fazer uma largada diagonal em cima do segundo colocado Bottas, enquanto Hamilton mostrava seu instinto ao atacar o companheiro de equipe na segunda curva, nem que para isso desse um pequeno toque em Bottas. Para completar, o nórdico levaria um segundo toque de Leclerc e com a asa dianteira avariada, Bottas se tornou carta fora do baralho na briga pela vitória.

Assim se desenhou a corrida a partir de então. Verstappen abriu 2s para Hamilton, que disparou frente aos demais. A corrida só tinha dois personagens e nas arquibancadas, ingleses e holandeses roíam as unhas para torcer pelo seu piloto favorito. Verstappen vinha embalado com a sua primeira pole e duas vitórias sensacionais, mas sabia que seu Red Bull não era páreo para a Mercedes. Hamilton sabia também que um segundo lugar, com Bottas lá atrás, não seria nada mal para o campeonato, mas ele necessitava de uma vitória em cima de Verstappen para o bem do seu ego. Foi uma briga de titãs entre dois pilotos de altíssimo nível, que chegaram a colocar um minuto sobre o terceiro colocado Charles Leclerc. O primeiro round aconteceu no que seria a única parada de ambos. Hamilton vinha mais forte e esperava a parada para atacar Verstappen, mas o holandês parou primeiro e mesmo com pneus duros, onde teoricamente não pararia mais, Max voltou muito rápido para a pista. A Mercedes não agiu de imediato. Deixou Hamilton na pista, mesmo que bem mais lento. Quando o inglês finalmente parou, estava 6s atrás de Verstappen. Ponto para Max. Porém, a velocidade com que Hamilton engoliu essa diferença demonstrou bem o seu ímpeto. Não demorou mais do que duas voltas para Hamilton encostar e atacar o holandês, mas Verstappen segurou de todas as formas e manteve a ponta. Parecia que o ponto estava decidido a favor de Verstappen. Porém, um campeão da estirpe de Hamilton não ficaria calmamente atrás de Verstappen procurando um erro. A Mercedes também não. Porque não mudar? Com uma diferença brutal para o terceiro colocado, Hamilton entrou nos pits faltando vinte voltas para colocar os pneus médios e caçar Verstappen. Foi uma briga de gato e rato. Verstappen se desdobrava para manter um ritmo aceitável e tentar se defender de um ataque vindouro, mas quando Hamilton baixou a bota e passou a andar 1.2s mais rápido, não havia muito o que fazer. A questão eram com quantas voltas Hamilton encostaria. Ainda faltavam quatro. Lewis também sabia que não poderia demorar demais e que a demora poderia levara a afobação. E a um toque. Hamilton foi cirúrgico no terceiro setor para entrar na reta colado em Verstappen e com a ajuda do DRS, ultrapassar com sobras o holandês numa disputa direta pela vitória.

Foi uma vitória tática, técnica e emocional para Lewis Hamilton. O inglês soube usar todo o potencial técnico dele e da Mercedes para tirar o déficit que tinha rumo a uma vitória épica, derrotando Verstappen, que estava surfando numa onda de otimismo. O holandês pareceu desapontado ao sair do carro, porém Max não tem do que lamentar com a corrida que fez. Mesmo com um carro inferior, segurou por mais de 95% da corrida um piloto com muito mais experiência do que ele e que já tem o nome marcado na história do esporte. 

Com a disputa entre Hamilton e Verstappen, o restante do pelotão mal foi visto. O ritmo imposto pelos dois foi tão forte que apenas os quatro primeiros colocados terminaram na mesma volta e o recorde de Michael Schumacher de 2004 foi liquidado com sobras. Com o problema de Bottas na primeira volta a Ferrari ficou na posição de pódio o tempo inteiro, mas com uma estratégia diferenciada, Vettel ultrapassou Leclerc nas voltas finais para conseguir o terceiro lugar, mesmo que levando um baita binóculo dos líderes. Quando Bottas fez sua parada prematura, a Mercedes fez um cálculo e passou ao finlandês: dá para ser sexto. Ou os cálculos da Mercedes falharam, ou Bottas não fez sua parte e o nórdico terminou apenas em oitavo. Mesmo com o problema na primeira volta, mais uma vez Bottas ficou abaixo do esperado, mas o que dizer de Gasly? O pobre francês terminou ainda na sexta posição, não conseguindo ultrapassar a McLaren de Carlos Sainz. O ótimo resultado do espanhol, somado ao nono lugar de Lando Norris coloca a McLaren como a quarta força do campeonato, enquanto a equipe de fábrica da Renault passou outro vexame com seus carros longe dos pontos e Cyril Abiteboul aparecendo na TV de vez em quando. Como se fosse um sinal de que está 'prestigiado' dentro da Renault. Na Alfa Romeo e na Racing Point, a disparidade entre seus pilotos é tão grande quanto na Red Bull. Enquanto Raikkonen pontuou bem com um sétimo lugar, Giovinazzi só superou a Williams de Kubica, ficando logo atrás de Stroll, enquanto seu companheiro de equipe Pérez quase pontuou. Após seu pódio na Alemanha, Kvyat ficou atrás de Albon, que marcou o último pontinho do dia. A Williams mostrou evolução com Russell superando dois pilotos de duas equipes diferentes, mesmo eles sendo de qualidade questionável. No reino de Günther Steiner, já se tornou incompreensível a perca de rendimento dos treinos para a corrida dos carros da Haas. Grosjean foi ao Q3 e abandonou quando já estava na rabeira, enquanto Magnussen só apareceu na corrida fechando os outros pilotos. Muito pouco!

O que vimos nessa manhã foi mais uma disputa entre o velho e o novo leão. Com 34 anos de idade e com seu nome marcado no esporte, Lewis Hamilton usou tudo o que tinha direito para derrotar Verstappen e seus imberbes 21 anos de idade, que com uma nítida evolução, vai ficando mais maduro e melhorando sua pilotagem cada vez mais. Verstappen caminha para substituir Hamilton como a próxima estrela da F1, mas o inglês demonstrou hoje que esse dia ainda não chegou. Essa Era ainda é de Hamilton.

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