Vire e mexe se fala na saída do Grande Prêmio Brasil do calendário da F1 ou a substituição de Interlagos por uma pista nova. Se o Autódromo José Carlos Pace não tivesse uma magia toda especial, provavelmente isso já até teria acontecido, mas corridas como a de hoje faz com que os fãs praticamente implorem para que Interlagos permaneça na F1, mesmo que não tenhamos mais o protagonismo de antes na F1. Novamente o público no autódromo e os milhões em todo o mundo assistiram uma corrida de tirar o fôlego na icônica pista de Interlagos, com vitória de um inspirado Max Verstappen, com Pierre Gasly conseguindo um emocionante pódio batendo Lewis Hamilton na bandeirada, enquanto Carlos Sainz saiu de último para ser terceiro com a justa punição a Hamilton e mais uma vez a Ferrari terá uma reunião pós-corrida bastante tensa com seus pilotos.
Pela primeira vez no final de semana o sol apareceu forte em São Paulo e talvez por isso as equipes e pilotos preferiam a cautela na primeira metade da prova. Verstappen largou bem, enquanto Hamilton executava uma baita manobra por fora em cima de Vettel para ser segundo. Leclerc não demorou a escalar o pelotão vindo de 14º para ficar em sexto. Como foi falado mais cedo, o calor se fez presente em Interlagos apenas nesse domingo e ninguém tinha muito noção de como os pneus se comportariam com temperaturas mais altas. Ficou claro que parar apenas uma vez era arriscado demais e as primeiras paradas não tardaram a acontecer. Hamilton inaugurou a rodada de pits e quando Verstappen foi aos boxes na volta seguinte, tomou uma fechada sem noção de Kubica, que acabaria punido mais tarde. Perdendo a posição nos boxes, Verstappen contou com um antigo rival seu para retomar a ponta. Com pneus novos Hamilton encontrou Leclerc bem no miolo do circuito, só efetuando a ultrapassagem na saída da Junção, trazendo um embalado Verstappen junto. O holandês pegou o vácuo e ultrapassou lindamente Hamilton no Esse do Senna. Ferrari, Mercedes e Red Bull colocavam táticas diferentes na mesa, mas a corrida estava longe de estar emocionante. Foi então que uma rara quebra mudou tudo. Tendo parado pela segunda vez, Bottas partiu para cima de Leclerc com pneus novos, mas o monegasco usou a potência do motor Ferrari para segurar a Mercedes. Quando ambos já viam Albon nos retrovisores, o motor de Bottas disse adeus. Mesmo o nórdico estacionando seu Mercedes num lugar seguro, o Safety-car aparaceu numa decisão até mesmo discutível da direção de prova, mas que influenciaria decisivamente para um dos melhores finais de corrida dessa temporada. E não faltou corrida boa nesse segundo semestre!
A Mercedes chamou Hamilton para os boxes. Se isso influenciou ou não, o fato foi que Verstappen entrou nos boxes e Hamilton não. Mais um blefe da Mercedes, mas a situação de Hamilton não seria nada confortável nas últimas voltas. O inglês seria o único do pelotão dianteiro com pneus médios e ainda assim usados, enquanto os demais carros atacariam Lewis com pneus macios. E no caso de Verstappen, novos. Assim como aconteceu na Hungria, mesmo que de forma inversa, Verstappen sabia que não poderia esperar demais para atacar Hamilton e por isso o holandês freou por fora no Esse do Senna para efetuar a manobra da vitória logo na relargada. Mais atrás, Albon emulava a manobra do companheiro de equipe e subia para terceiro ao ultrapassar Vettel, que fazia uma corrida apagada. Mas logo ganharia luz. Vettel tentou um ataque em cima de Albon, mas acabou surpreendido por Leclerc, que ganhou a quarta posição no Esse do Senna. Vettel tentou dar o troco na reta oposta e o resultado foi um ligeiro toque dos dois carros da Ferrari que furou o pneus de ambos os bólidos e muitos palavrões no rádio com mais um zero da Ferrari. Acabou? Ainda não! Os destroços da Ferrari quebraram a suspensão de Stroll e por isso o safety-car retornou à pista com apenas quatro voltas para o fim. Hamilton viu uma oportunidade e colocou pneus macios, mesmo caindo para quarto. Na relargada faltando duas voltas, Hamilton logo ultrapassou a Toro Rosso de Gasly e com a fome de um multi-campeão, não quis esperar muito tempo para tomar o segundo lugar de Albon, fazendo o pobre tailandês rodar e cair para as últimas posições. Mesmo com a asa dianteira avariada, Hamilton foi com tudo para cima de Gasly, mas provando a força do motor Honda, o francês segurou Hamilton na bandeirada, com ambos cruzando lado a lado numa cena de cinema.
Quatro segundos à frente, Max Verstappen dava a volta por cima depois de perder a vitória ano passado de forma até infantil, quando bateu no retardatário Esteban Ocon. Hoje o holandês esteve perfeito, dando o troco em todas as investidas que Hamilton lhe dava. Foram duas ultrapassagens antológicas de Max em cima de Lewis, demonstrando que Hamilton terá ainda muito trabalho com a geração nova que vem por aí. Contudo, os ataques de Hamilton nas últimas voltas terminaram por estragar o que poderia ter sido um pódio inteiramente da Honda, com Albon em segundo e Gasly em terceiro. O toque em cima de Albon destruiu o sonho do primeiro pódio de um tailandês na F1. Porém, fez Gasly mostrar a todos que ele não era um caso perdido. Ao contrário do que aconteceu com seu companheiro de equipe quando este foi rebaixado da Red Bull para a Toro Rosso, Gasly ganhou uma motivação extra na Toro Rosso e hoje foi claramente o piloto melhor coloado do pelotão intermediário e ao se aproveitar dos infortúnios dos carros das equipes top-3, o jovem francês garantiu o seu primeiro pódio na F1 e o segundo da Toro Rosso nesse ano, sendo que desta vez com pista seca. Ah! Enquanto Gasly subia ao pódio numa corrida sensacional, Kvyat era um apagado décimo lugar...
Porém, colocar o título de melhor piloto do pelotão intermediário em Gasly seria simplificar muito as coisas. Outro piloto da canteira da Red Bull fez uma corrida monstruosa hoje e se todos queriam a punição de Hamilton, era para que a corrida de Carlos Sainz fosse coroada com um pódio. O espanhol teve problemas de motor ontem e largou em último. Sainz iniciou uma ótima corrida de recuperação até o terceiro lugar, com a punição de Hamilton confirmada, o que foi bastante merecido pelos esforços da McLaren e de Sainz. Sem falar que Fernando Alonso poderia ver dois motores Honda no pódio, junto com uma McLaren. É Fernando, paciência faz bem às pessoas. Continuando no pelotão intermediário, a Alfa Romeo saiu da má fase para colocar seus dois carros na zona de pontuação, com Raikkonen atacando Sainz nas últimas voltas e Giovinazzi segurando Lando Norris, na segunda McLaren. Daniel Ricciardo foi justamente punido por ter tentado uma ultrapassagem para lá de otimista em cima de Kevin Magnussen no começo da corrida, mas o australiano se recuperou para marcar pontos com sua cambaleante Renault, que agora não apenas vê a McLaren de longe no Mundial de Construtores, como tem agora a Toro Rosso apenas seis pontos atrás. Com um carro que não se entende bem com os pneus, o calor em Interlagos praticamente acabou com a corrida da Haas, enquanto a Williams só apareceu com a atabalhoada saída dos pits de Kubica, que fez Verstappen quase bater no pit-wall.
Dando um pequeno spoiler do filme 'Ford vs Ferrari', durante as 24 Horas de Le Mans de 1966, Carrol Shelby, personagem de Matt Damon, vez ou outra aprontava com os mecânicos e engenheiros da Ferrari, ora roubando equipamentos, ora jogando peças nos boxes da equipe de Maranello. Os italianos ficavam histéricos! Conta a lenda que a Ferrari só ganha quando um estrangeiro está na gestão da equipe, o que é uma má notícia para Mattia Binotto, que mais uma vez terá que se reunir com seus dois pilotos, que tocaram-se na reta oposta e deixaram a Ferrari com zero ponto. Vettel vinha fazendo uma corrida opaca e simplesmente não conseguia ultrapassar Albon, quando foi surpreendido por Leclerc, que fez a corrida de recuperação que era dele esperado. Aquilo pareceu mexer com os brios de Vettel, que partiu para cima do companheiro de equipe na reta oposta e quando tentava dar um chega pra lá em Leclerc, acabou tocando muito de leve no carro do rival, mas o suficiente para estourar ambos os pneus e estragar a corrida da Ferrari. Claro que os rádios dos dois foram cheios de piiiis, mas a reunião da Ferrari será, no mínimo, animada nesse final de tarde.
Foi mais uma corrida épica para a conta de Interlagos, que raramente nos decepciona no quesito corrida confusa. Dos seis carros que sempre lutam no pelotão intermediário, apenas dois chegaram na frente, numa atuação inspirada de Max Verstappen. Hamilton pode não ter tido a corrida dos seus sonhos, mas mostrou estar faminto mesmo já tendo o hexa nas mãos. A gestão da Ferrari? Aguardemos as cenas dos próximos capítulos. Se não foi a melhor corrida do ano, o Grande Prêmio do Brasil desse ano entrou para mais um corridão dessa temporada que começou decepcionante no quesito emoção, mas que nos últimos meses calou a boca de quem já estava matando a categoria. Não falta polêmica e pilotos excelentes na pista, mas foi a magia de Interlagos que ajudou a transformar a corrida de hoje numa prova inesquecível.
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