quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Gigante inglês

O automobilismo, particularmente o monoposto, sempre preferiu pilotos com biotipo bem parecido com os jóqueis: pequenos e leves. Com o carro sendo construído levando-se em conta o corpo do piloto, ser alto pode ocasionar sérios problemas até mesmo no acerto do carro, porém, Justin Wilson passou por cima desse obstáculo e com seu 1,92m de altura, o inglês conseguiu destaque no automobilismo internacional com o seu talento, além do seu jeito afável conquistar inúmeros fãs na Inglaterra e nos Estados Unidos, onde correu por mais tempo profissionalmente, além de ter encontrado seu destino três anos atrás. Se estivesse vivo, Justin iria completar 40 anos e por isso, vamos conhecer um pouco mais de sua história.

Justin Boyd Wilson nasceu no dia 31 de julho de 1978 em Sheffield, na Inglaterra. Amante dos esportes, mesmo que tendo dificuldades na escola por causa da dislexia, logo Justin se firma nas corridas, iniciando sua carreira no kart em 1987, se sagrando campeão inglês em 1989 e 1994. Mesmo mostrando muita velocidade, andando forte junto com seus contemporâneos Dan Wheldon e Jenson Button, Wilson tinha uma pequena (grande) dificuldade frente aos seus rivais: sua altura. Muito alto para os padrões do monoposto, Wilson sempre teve problemas por causa disso, chegando a adiar sua estreia na F1. Quando completou 17 anos Justin partiu para a F-Vauxhall Junior e já no seguinte ele subiu para a categoria principal, se tornando um dos pilotos de ponta da categoria de base. Seu caminho natural seria a tradicional F3 Inglesa, mas uma nova categoria nasceu em 1998 e Justin Wilson optou por ela: F-Palmer Audi. Correndo com motores turbo da Audi e chassis iguais, a categoria era uma alternativa mais barata do que a F3, que tinha chassi e potência similar. Wilson se torna o primeiro campeão com nove vitórias, dominando inteiramente o certame, mas houve uma pequena mácula. Justin era agenciado por Jonathan Palmer, que patrocinava a categoria e na época houve acusações de que Wilson teria sido privilegiado, algo nunca comprovado. Afinal, o talento de Justin Wilson era comprovado em outras categorias. 

O título na F-Palmer Audi proporcionou a estreia de Wilson na F3000 em 1999, ante-sala da F1. Era uma espécie de prêmio pelo título, mas Wilson vai para a pequena equipe Astromega e os resultados não vieram como esperado, mesmo o inglês tendo marcado um pontinho na sua estreia em Ímola com um sexto lugar. Wilson vai para a Nordic no ano seguinte e na segunda etapa do campeonato em Silverstone sobe pela primeira vez ao pódio, terminando o ano num bom quinto lugar no certame. O terceiro ano de Justin na F3000 seria decisivo no seu sonho de alcançar a F1 e o inglês não perde a oportunidade. Mais adaptado na Nordic, Wilson vence logo a primeira corrida do campeonato em Ímola, iniciando uma campanha sólida, com dez pódios e mais duas vitórias (Áustria e Hungria), se sagrando campeão da F3000, sendo o primeiro britânico a faze-lo. O próximo objetivo era a F1 e Wilson chegou a testar com a Jordan no final de 2001, com expectativas de se tornar piloto de testes em 2002, mas com a Jordan passando por um momento financeiro delicado e Wilson foi deixado de lado. Uma quarta temporada na F3000 seria infrutífera e então Wilson inovou novamente, partindo para a recém-lançada F-Nissan. A categoria, baseada na Espanha, utilizaria carros bem parecidos com os da F3000, mas com um motor mais potente, carros com efeito-solo e a obrigatoriedade de pit-stops. Seria um bom caminho para piloto como Justin Wilson, na esperança de alcançar a F1, mas já tendo feito sua história na F3000. Wilson faz uma boa temporada, com duas vitórias e o quarto lugar no campeonato. Porém, seu radar ainda estava na F1. Alex Yoong havia estreado na Minardi ainda em 2001 muito baseado em seus fortes patrocinadores, mas era límpido como água que o malaio não tinha a menor condição de estar na F1. Mesmo dependendo do dinheiro trazido por Yoong, Paul Stoddart, dono da Minardi na época, dispensa Yoong de duas etapas, dizendo que o malaio precisava 'de mais treino para se familiarizar com um F1'. Não havia treino que desse jeito em Yoong, mas Stoddart viu em Wilson uma possibilidade real para substituir o famigerado piloto-pagante, mas um velho problema veio à tona. Com 1,92 de altura, Wilson simplesmente não cabia dentro da Minardi de Yoong e por isso, Anthony Davidson foi o escolhido.

Porém, Stoddart prometeu um lugar para Justin Wilson em 2003 e cumpriu, contratando o inglês para a temporada, com a ajuda de um fundo de investimento para que Wilson garantisse um lugar na Minardi. Porém, novamente a altura do inglês o atrapalharia. O Hans Device havia se tornado obrigatório em 2003 e alguns pilotos tiveram dificuldades com o novo aparato. Sem muito espaço dentro do cockpit, Wilson sofreu ainda mais e teve que abandonar o Grande Prêmio da Malásia por não suportar mais as dores por causa do Hans. Como era de se esperar correndo pela Minardi, Wilson não saía da última fila, mas o inglês chamou a atenção ao chegar a ficar em oitavo numa corrida por algum tempo. O trabalho de Justin era muito bom frente ao experimentado Jos Verstappen e logo seria recompensado. A Jaguar havia contratado a nova promessa brasileira Antonio Pizzônia, mas o manauara decepcionava com corridas medíocres, principalmente comparadas à Mark Webber, uma das sensações daquele ano. Após muitas discussões, Pizzônia foi dispensado depois do Grande Prêmio da Inglaterra e cumprindo seu dever de ser uma equipe britânica, a Jaguar contratou para o seu lugar Justin Wilson. O carro da Jaguar não era de ponta, mas era bem melhor do que a Minardi que Justin pilotou naquela primeira metade de ano. Mesmo não estando acostumado com o novo carro, pelo menos Webber tinha 1,84m e o inglês não sofreria tanto. Bom amigo de Webber, Justin Wilson consegue fazer mais do que Pizzônia e marcaria o seu primeiro e único ponto no dramático Grande Prêmio dos Estados Unidos, numa corrida marcada pela instabilidade climática. Contudo, nem o bom trabalho de Wilson lhe garantiu um lugar na F1 em 2004. A Red Bull havia saído da Sauber e patrocinaria a Jaguar a partir de 2004. Uma das primeiras exigências da marca de energético foi colocar seu piloto-júnior Christian Klien na Jaguar e como Mark Webber havia se destacado muito, Wilson acabou sobrando. Foram apenas dezesseis corridas e um ponto marcado pelo inglês. No final de 2004, a Red Bull compraria a Jaguar.

Sem espaço na F1, Justin Wilson atravessou o Atlântico atrás de outras oportunidades na Indy, porém, não era mais a Indy de outros tempos. Ao contrário do seu compatriota Mansell onze anos antes, a Indy vivia seu momento mais baixo, com a categoria dividida em dois campeonatos de baixo nível técnico. Wilson escolheu a Champ Car, sucessora da CART e com um campeonato mais parecido dos áureos tempos, numa mistura de circuitos mistos, de rua e ovais. Wilson estreou pela pequena equipe Conquest, conseguindo poucos resultados de relevo, mas foram suficientes para chamar a atenção da equipe RuSport, uma das principais da categoria, junto das veteranas Newman-Haas e Forsythe. Wilson consegue sua primeira vitória na Indy em Toronto, acabando seu primeiro ano numa equipe realmente competitiva em terceiro lugar. Numa época em que a Champ Car era amplamente dominada pelo francês Sebastien Bourdais, algumas vezes Wilson era o maior rival do piloto da Newman-Hass, repetindo algumas disputas que tiveram na F3000 no começo da década. Justin Wilson era um piloto de ponta na Champ Car e conseguiu dois vice-campeonatos em 2006 e 2007, mesmo que vencendo apenas duas corridas nesse período. Em 2007 a Champ Car tentou dar um passo maior do que a perna com um chassi totalmente novo e algumas corridas na Europa. Essa expansão, na verdade, camuflava a falência da categoria, que seria anunciada no final do ano. Wilson havia assinado com a Newman-Hass, principal equipe da Champ Car, mas a categoria fora absorvida pela IRL, fazendo com que a Indy se reunificasse depois de doze anos. Para as equipes que vinham da Champ Car, o começo da reunificação seria difícil e de piloto de ponta, mesmo tendo a estrutura da tradicional equipe Newman-Haas, Justin Wilson se transformou num piloto de fundo de pelotão na Indy. 

Para 2009 Justin Wilson se muda para a equipe Dale Coyne, uma das mais antigas da Indy, mas também frequentadora assídua do pelotão de trás. Já experiente e com o nome formado no automobilismo americano, Justin faz uma bela temporada com a Dale Coyne, sendo o percursor de vários bons resultados para a pequena equipe. Logo em sua estreia, Wilson termina a corrida de St. Petersburg em segundo, no melhor resultado da Dale Coyne na Indy, mas seria melhorado com uma bela vitória em Watkins Glen. Graças a esses resultados, Wilson foi contratado pela Dreyer&Reinbold, uma equipe mais estruturada do que a Dale Coyne, mas ainda longe de uma equipe de ponta. Wilson consegue dois segundos lugares em sua primeira temporada, mas em 2011 o inglês sofreria um forte acidente em Mid-Ohio, que o deixaria de fora de algumas corridas. No começo de 2012, Justin Wilson vence as 24 Horas de Daytona ao lado de Oswaldo Negri, AJ Allmendiger e John Pew, mostrando a versatilidade do inglês em diferentes tipos de carros e corridas. Wilson retornaria à Dale Coyne e venceria sua primeira corrida num oval, no circuito do Texas. Em 2013 Wilson faria um campeonato extremamente regular, subindo quatro vezes ao pódio e garantindo um impressionante sexto lugar no campeonato, seu melhor na Indy unificada. Porém, esses resultados não garantiam bons lugares para Wilson na Indy. Sem patrocinadores pessoais, Wilson sentia dificuldades em conseguir bons cockpits, mesmo que todos reconhecessem o bom trabalho e a velocidade de Justin.

Em 2015 Wilson foi contratado pela equipe Andretti, mas só faria parte de algumas corridas, ajudando no desenvolvimento do carro. Após um ótimo segundo lugar em Mid-Ohio, Justin Wilson participaria da corrida no superoval de Pocono, penúltima etapa do campeonato. O líder Sage Karam perdeu o controle do seu carro e bateu no muro, lançando vários destroços na pista. Um desses destroços, de forma fortuita, atingiu em cheio o topo do capacete de Justin Wilson, que vinha no bolo logo atrás. Desacordado, Justin bateu no muro e parou seu carro alguns metros depois. Percebendo a gravidade do acidente, o inglês foi imediatamente levado de helicóptero para o hospital em estado crítico. Para comoção de todo o automobilismo, Justin Wilson faleceu no dia seguinte, aos 37 anos de idade. Vários amigos e entidades trataram de ajudar em seu velório e à sua esposa Julia, e as filhas Jane e Jessica. Seu irmão mais novo, Stefan, também piloto, anunciou que mesmo após sua morte, Justin salvou seis vidas com a doação dos seus órgãos. O carisma de Wilson foi demonstrado com homenagens prestadas na Indy, F1 e Nascar. Em 2016 a segunda curva de Snetertton passou a se chamar Wilson. Após a triste morte de Justin Wilson, as discussões para uma maior proteção à cabeça do piloto aumentaram em todo o mundo. O polêmico Halo surgiu muito em decorrência do acidente fatal de Justin Wilson, mas apesar da estética ruim, se o Halo salvar outras vidas, Justin com certeza ficará bastante satisfeito.

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