A esperada primeira vitória do talento emergente Charles Leclerc finalmente veio em Spa, mas o próprio monegasco pouco comemorou numa corrida marcada pela tristeza e pelo luto da trágica morte de Anthoine Hubert na tarde de ontem na F2. Piloto muito próximo de Hubert, Leclerc mostrou muita personalidade para superar toda a sua dor e vencer uma corrida nos detalhes, já que a Ferrari por muito pouco não entregou a rapadura novamente, com Hamilton chegando colado em Charles na última volta, mesmo que a vantagem da Ferrari nos treinos não indicasse isso.
Como não poderia deixar de ser, antes da corrida houve o protocolar um minuto de silêncio pela perda de Anthoine Hubert de todos os pilotos e equipes de F1, F2 e F3. Num momento muito bonito, na volta 19 (número que Hubert usava) todo o público em Spa se levantou e aplaudiu, num belíssimo momento de reverência, que chegou a abafar o ruído dos motores. De todos os vinte pilotos que largaram nessa manhã, o mais próximo de Hubert era justamente o pole Charles Leclerc. Dois anos mais jovem, Leclerc fez sua carreira inteira ao lado de Hubert. Como esperado o monegasco era o mais sentido pelo acontecimento de ontem, mas Charles Leclerc colocou sua dor de lado por uma hora e meia para vencer uma corrida que foi mais difícil do que o esperado pela Ferrari. Após dominar todos os treinos com uma velocidade estonteante nas retas, a Ferrari contava até mesmo com uma dobradinha, mas os italianos foram surpreendidos pela força da Mercedes, principalmente com os pneus médios. Leclerc garantiu a sua vitória por meros detalhes que fizeram toda a diferença. Primeiro foi o bom período de safety-car no começo da prova que ajudou os pilotos a esticarem ao máximo o stint com os pneus macios, mais propícios ao ritmo da Ferrari. Depois Leclerc contou com a ajuda de Vettel, quando o alemão segurou um claramente mais rápido Hamilton por duas voltas. Nesse momento, Lewis já tinha abaixado a sua desvantagem de sete para quatro segundos e quando Vettel fez um bom trabalho de equipe, a vantagem de Leclerc voltou aos 7s. Porém, os pneus médios de Charles foram se desgastando a ponto de Hamilton tirar mais de 1s no segundo setor (que favorecia a Mercedes) nas voltas finais. Mesmo se segurando nas partes rápidos da pista, era nítido que Leclerc não teria o que fazer se houvesse uma ou duas voltas a mais de corrida, mas felizmente para ele, a Ferrari e Mattia Binotto, a prova terminou a tempo de Charles Leclerc conseguir sua primeira vitória na carreira, além de ter sido a primeira vitória de Mônaco na F1 e a primeira da Ferrari em 2019, garantindo o emprego de Binotto.
Evidentemente Leclerc apontou para o céu dedicando sua vitória à Hubert, além de rapidamente quebrar seu tabu de vitórias na F1, após bater na trave duas vezes (Bahrein e Áustria) tão perto da bandeirada. A Ferrari perdeu a dobradinha no momento em que caiu no blefe da Mercedes e antecipou a parada de Vettel, quando ele já era pressionado pelo terceiro colocado Hamilton. Mais rápido na pista quando teve pneus novos, Vettel ficou totalmente vendido quando Leclerc e a dupla da Mercedes pararam e se aproximaram dele. A Ferrari mandou Vettel encostar para Leclerc passar, mas num momento decisivo, segurou o alemão na pista ao máximo para segurar Hamilton quando o inglês tirava muita diferença para Leclerc. Vettel fez bem seu trabalho, o que acabou sendo valioso para a Ferrari no resultado final, mas o alemão se viu numa posição incomum de boi de piranha para garantir a vitória de outro piloto da Ferrari. Uma situação incômoda para quem foi contratado a peso de ouro para ser campeão com a Ferrari. Hamilton demonstrou mais uma vez que é um gigante da história da F1. Com a Mercedes claramente em desvantagem para a Ferrari nas longas retas de Spa, o inglês ainda quase arrancou a vitória, chegando menos de 1s atrás de Leclerc, após superar Vettel na pista. Hamilton foi para cima de Leclerc com a gana de quem estaria atrás do campeonato, não com mais de sessenta pontos na frente do vice-líder do campeonato. Assim como ocorreu na Hungria, Hamilton queria demarcar território frente a um jovem piloto. Não conseguiu por pouco. Com contrato renovado, Bottas pouco apareceu numa corrida onde levou sua Mercedes ao pódio e se distanciou ainda mais do terceiro no campeonato.
Correndo praticamente em casa, Max Verstappen mais uma vez largou mal. Levando-se em conta o histórico desse ano, isso era até uma boa notícia, pois em todas as oportunidades que Max saiu mal na largada, ele venceu, porém o velho Max afobado apareceu novamente e numa manobra para lá de otimista, foi para cima de Raikkonen na Source e quase fez o finlandês capotar. Com a suspensão dianteira claramente quebrada, Verstappen continuou rápido e enfrentou a Eau Rouge (local do acidente fatal de Hubert) daquele jeito. O resultado não poderia ser outro do que um acidente na rápida curva, trazendo um crucial safety-car que acabou ajudando seu rival de longa data Leclerc a vencer. Apesar de cada dia melhor, Verstappen teve uma recaída hoje, talvez nervoso por ter largado mal numa pista que não favoreceu a Red Bull na frente de sua enorme torcida. Alexander Albon fez uma ótima estreia pela Red Bull, ao sair da última fila rumo a um belíssimo quinto lugar após muitas ultrapassagens, com destaque para uma em cima de Daniel Ricciardo por fora. Bastou uma corrida para o tailandês ter uma exibição melhor do que as doze de Pierre Gasly esse ano, que nem foi tão mal em sua reestreia pela Toro Rosso e pontuou. Lando Norris escapou da presepada de Verstappen e pulou de 11º para quinto logo na largada e ficou nessa posição a corrida inteira de forma sólida, mas acabou traído pela McLaren na abertura da última volta, saindo da zona de pontuação, enquanto Sainz abandonou na primeira volta, após ficar parado na largada, bem no dia do seu aniversário.
Numa pista que tradicionalmente favoreceu a Racing Point (leia-se Force India), Sérgio Pérez conseguiu um bom sexto lugar, mesmo tendo sido ultrapassado por Albon na última volta, enquanto Stroll aproveitou-se do infortúnio de Norris na penúltima volta para conseguir o último ponto. Numa meio de pelotão equilibrado, Kvyat foi sétimo e o demitido Hulkenberg foi oitavo com a Renault, todos muito próximos um dos outros, mesmo que mais de um minuto atrás dos líderes. Ricciardo bateu na primeira volta e precisou parar cedo, arriscando ficar a corrida inteira com o mesmo set de pneus. O tiro saiu pela culatra e o australiano foi escalado nas últimas voltas, mas o piloto mais ultrapassado do dia foi mesmo Kevin Magnussen, que largou bem, mas o terrível ritmo de corrida da Haas fez com que o danês fosse sendo ultrapassado de forma contínua de forma até constrangedora para a trupe de Günther Steiner, numa cena parecida com Grosjean. Giovinazzi vinha na zona de pontos quando bateu na última volta, enquanto Raikkonen teve o carro danificado pelo toque Verstappen na primeira volta a ponto de ficar entre os dois carros da Williams, o que hoje em dia é sinal de ficar nas últimas posições.
Muita gente esperava por chuva para termos uma corrida ainda mais animada em Spa, mas por tudo o que aconteceu ontem, era bem melhor que a pista estivesse seca mesmo e hoje a corrida tivesse menos riscos. Contudo, nem por isso tivemos uma corrida aborrecida e ainda houve a tensão pelo modo ataque de Hamilton nas últimas voltas em cima de Leclerc, que mostrou muita maturidade para não se intimidar com a chegada do pentacampeão e vencer com todos os méritos pela primeira vez na F1. Infelizmente, Charles Leclerc não pôde comemorar seu feito pessoal como merecia.
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