domingo, 29 de julho de 2018

Nos mínimos detalhes

Uma roda dianteira esquerda que não foi bem encaixada. Esse pequeno lapso foi o suficiente para que o pit-stop de Vettel fosse atrasado em 2s. E que Hamilton tivesse uma vitória límpida e fácil, dominando de ponta a ponta o Grande Prêmio da Hungria, aumentando a diferença para o segundo colocado Vettel na ponta do campeonato, além de triunfar num circuito onde a Mercedes não parecia nada bem, mas que brilhou numa estratégia bem traçada, utilizando muito bem o segundo piloto Valtteri Bottas e contando com o pequeno vacilo do mecânico da Ferrari.

Quinze anos atrás o Grande Prêmio da Hungria era sinônimo de corridas chatas e enfadonhas. Desde que a dependência aerodinâmica prevaleceu na construção dos carros de F1, o travado circuito húngaro se tornou um exemplo de corridas ruins. Para piorar, mesmo realizado em meio ao verão europeu, a chuva raramente aparecia em Budapeste para dar uma chacoalhada na corrida. Seja pelo aquecimento global, seja pelas mudanças de regulamento, as corridas em Budapeste foram melhorando ao longo dos últimos anos, chegando a transformar Hungaroring num dos circuitos 'old school' da F1 e também um dos mais esperados do ano. A chuva se fez mais presente e mesmo com muita dificuldade, as ultrapassagens apareceram. Porém, a prova de hoje foi longe do primor de algumas das últimas edições, mas não deixou de ser interessante pelas táticas que Ferrari e Mercedes impunham aos seus pilotos. A chuva já havia mexido definitivamente na dinâmica da corrida quando a Mercedes, bem atrás da Ferrari no seletivo circuito magiar, ficou com a primeira fila quando Hamilton e Bottas lidaram melhor com a pista molhada no sábado. Contudo, o sol apareceu forte no domingo e todos se perguntavam o que a Ferrari faria para descontar o prejuízo. A resposta da Mercedes veio não de Hamilton, mas de Bottas. O finlandês, que teve seu contrato renovado recentemente, fez um trabalho de equipe mais eficiente do que simplesmente deixar seu companheiro de equipe passar sem briga. Bottas começou a defesa de Hamilton na largada, segurando o ímpeto da dupla ferrarista, com Vettel passando Raikkonen já nas primeiras curvas. Com Hamilton tendo pista livre, o inglês disparou na ponta, enquanto Bottas segurava Vettel sem maiores problemas, mas ainda havia muita corrida pela frente, além da administração do desgaste dos pneus. Dos pilotos da frente, ninguém utilizou os pneus médios, os mais duros do final de semana. Hamilton, Vettel, Bottas e Raikkonen administraram muito bem seus pneus, entregando o que suas respectivas equipes lhe pediram.

A Mercedes sabia que se a Ferrari tivesse pista livre, a chance dos italianos aumentarem seu ritmo era imensa e com Vettel largando com os pneus macios, era certeza do alemão esticar seu stint ao máximo. A dupla finlandesa parou mais cedo, seguido voltas mais tarde por Hamilton. Vettel postergou sua parada ao máximo, mas Seb acabou atrapalhado por retardatários e a sua diferença para Hamilton diminuía quando ele entrou nos boxes. Poucas voltas antes, a tática da Ferrari era clara. Vettel sairia dos boxes com pneus hipermacios numa perseguição até o fim da prova à Hamilton, calçado com pneus macios. Com o tanque mais vazio, era esperado uma briga fratricida entre os dois tetracampeões, mas tudo foi para o ralo quando a roda dianteira esquerda de Vettel não foi bem encaixada. Os 2s perdidos foram cruciais para Vettel voltar à pista não atrás de Hamilton, mas atrás de Bottas. A briga pela vitória estava terminada. Hamilton mais uma vez contou com seu companheiro de equipe para vencer uma prova que não estava nos seus planos. De uma corrida para reduzir os danos, Hamilton saiu da Hungria com uma vantagem de 22 pontos em cima de Vettel. O alemão tinha muito mais desempenho do que Bottas, mas a notória dificuldade de se ultrapassar em Hungaroring atrapalhou os planos do alemão, que só atacou efetivamente já nas voltas finais, tendo a sorte de não ter o pneu traseiro esquerdo furado quando houve o toque com Bottas. Valtteri forçou muito quando Vettel já estava na frente e perdeu parte da asa dianteira, além de mais uma posição para Raikkonen. Sem ritmo, Bottas ainda se envolveu num toque polêmico com Ricciardo que danificou bastante ambos os carros, mas o australiano se sobressaiu. Bottas merecia uma punição, mas o finlandês saiu da Hungria de bem com a Mercedes e seus chefes, pois Valtteri fez um trabalho perfeito de equipe. Mesmo ganhando duas posições num circuito complicado de se ultrapassar, Vettel sabe que perdeu uma bela chance de diminuir o prejuízo da semana passada em Hockenheim, além de ver Hamilton abrir uma diferença não esperada.

Era esperado uma briga à três, com a Red Bull entrando na batalha pela vitória na Hungria graças ao bom cartel que a equipe austríaca tem em circuitos de baixa velocidade. Porém, a corrida de Ricciardo já foi afetada pela classificação na chuva, com Daniel largando apenas em 14º, enquanto Verstappen saía apenas em sétimo. O holandês largou muito bem ao pular para quinto, mas não parecia um fator quando abandonou com problemas no motor Renault, rendendo muitos xingamentos de Max pelo rádio. A relação conturbada nos últimos anos entre Renault e Red Bull estaria ainda mais estremecida com motores não tão bons? Ricciardo foi até o final e na bandeirada ganhou dez posições, mas o abismo entre as equipes grandes e médias é tão grande, que a maioria dos pilotos preferiu estender o tapete vermelho para Ricciardo, talvez com exceção de Kevin Magnussen. No fim da corrida, Ricciardo se aproveitou do carro danificado de Bottas para garantir mais uma posição, mas a sensação era de que Ricciardo fez mais do que a obrigação e a Red Bull saiu de Hungaroring devendo muita coisa.

Se fosse para escolher um piloto como o nome do dia, indicaria Pierre Gasly. Com um motor Honda ainda em desenvolvimento, Gasly largou muito bem e liderou o pelotão intermediário com uma bela vantagem de 10s sobre Magnussen, que tem uma Haas bem mais competitiva do que a Toro Rosso. Gasly vai se garantindo como um bom nome para o programa Red Bull, enquanto Hartley ficou na beira de marcar pontos, mesmo largando entre os dez primeiros. Pior foi Carlos Sainz, que saindo da terceira fila largou muito mal e por sorte conseguiu pontuar num dia em que a Renault não foi nada bem. No dia do seu aniversário Fernando Alonso garantiu mais alguns pontos para a McLaren, mas novamente teve o dissabor de se ver bem atrás de um carro com motor Honda, enquanto Vandoorne abandonou com problemas mecânicos quando estava na zona de pontuação. Namorado da filha de Gil de Ferran, será que o belga reclamará com o sogrão? Com problemas demais fora das pistas, não foi de se estranhar ver a Force India longe dos pontos, enquanto a Sauber se viu enfraquecida com o abandono precoce de Leclerc e a Williams continuar no seu calvário de pior equipe do campeonato, tomando duas voltas dos líderes.

A corrida de hoje não teve os emocionantes lances da semana passada em Hockenheim, mas a prova foi definida nos mínimos detalhes. Hamilton venceu sem ser incomodado com a ajuda decisiva do seu companheiro de equipe, abrindo ainda mais para Vettel. Porém, se o pit-stop de Vettel tivesse ocorrido de forma natural, a corrida poderia ter uma desenrolar bem diferente e uma briga interessante no final. Deixa pra próxima! 

2 comentários:

  1. A Mercedes tanto reclamou da Ferrari em Silverstone por causa daquele toque do Raikkonen no Hamilton que hoje em Hungaroring fez exatamente a mesma coisa que tanto reclamara da rival. Com a diferença que ao contrário de Silverstone, Bottas ferrou ele próprio e não Vettel.

    Será que Totó e Hamilton consideraram essa uma estratégia bem interessante?

    Falando sério agora: Não achei o toque proposital, mas fiquei com a clara impressão que Bottas ia mesmo dar no meio do Vettel até porque o finlandês insistiu em ir por dentro mesmo com Vettel fechando limpamente a porta e ainda mais pela clara intenção da Mercedes de se vingar do toque entre Hamilton e Raikkonen em Silverstone.

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  2. Montreal, Zeltweg e Silverstone eram pistas em que a Mercedes nadava de braçada e nesse ano ela foi claramente superada pela Ferrari em duas dessas pistas e em outra ficou pelo caminho por problemas mecânicos e falha na estratégia.

    E está claro também que a Ferrari descontou a distância pra Mercedes nesse ano e tem carro pra brigar com ela tanto em Spa como em Monza mesmo considerando o favoritismo de Hamilton mas em uma temporada tão cheia de imprevistos e surpresas tudo pode acontecer.

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